É muito comum, nos dias de hoje, sentir-se extenuado pela enorme quantidade de informações que consumimos, tanto consciente quanto inconscientemente. No mundo da arquitetura não é diferente, é preciso dedicar-se para acompanhar o feed diário do ArchDaily e por isso mesmo, entendemos que nem sempre é possível estar a par daquilo que é notícia no mundo. Mas isto que à primeira vista parece ser uma infinita linha de produção arquitetônica, não necessariamente vem ao encontro das mais recentes preocupações em nossa disciplina, aquelas voltadas à economia e compartilhamento de recursos.
Esta reflexão generosa, à respeito de como e para quem estamos construído nossos edifícios e cidades, encontrava-se oculta em meio a produção massiva que definiu a arquitetura durante o século XX, mas algo estava nascendo, mesmo que em estado embrionário - algo que está se tornando cada dia mais evidente nos dias de hoje. Cada vez mais, arquitetos estão incorporando processos e estratégias de sustentabilidade e/ ou reuso adaptativo. Os mais tradicionais prêmios e reconhecimentos do mundo da arquitetura estão operando uma efetiva mudança de direção em nossa disciplina, chamando à atenção não mais apenas aos mesmos grandes nomes, mas também para pequenos escritórios de arquitetura espalhados pelo mundo, aqueles que têm nos apresentado uma nova maneira de pensar e conceber a arquitetura.
O estereótipo do arquiteto foi por muito tempo o da obsessão pelo ego e pela novidade. Praticamente um sinônimo de egocentrismo e originalidade. Por outro lado, atualmente estamos testemunhando uma mudança de rumo à partir da prática de milhares e milhares de jovens profissionais. Os projetos que foram notícia nesta última semana nos ensinam a repensar a arquitetura à partir da redução e da reutilização, transformando a maneira como concebemos à arquitetura no século XXI.
Prêmio Internacional RIBA de 2018 - Aleph Zero e Rosenbaum
O Prêmio Internacional RIBA 2018 foi outorgado ao escritório Aleph Zero + Rosenbaum pelo projeto Moradias Infantis (atual vencedor do prêmio ArchDaily Obra do ano de 2018). O projeto foi desenvolvido para uma escola situada no interior do Tocantins. O projeto, construído inteiramente com materiais e recursos locais, abriga cerca de 600 estudantes, muitos dos quais percorrerem diariamente enormes distâncias para chegar até à escola.
Devido à natureza isolada do local, um dos grandes desafios dos arquitetos foi o desenvolvimento de soluções criativas para o projeto à medida que a construção avançava. Foi essa abertura à experimentação que, de acordo com os idealizadores do projeto, fez deste escritório relativamente desconhecido no cenário nacional, o parceiro ideal para conceber este edifício. “Escolhemos arquitetos um pouco fora do eixo, justamente porque eles estão abertos à experimentar coisas novas”, disse Denise Aguiar, diretora da Fundação Bradesco, em entrevista ao The Guardian. "... Parecia que os arquitetos estavam de fato incorporando tudo aquilo que os alunos desejavam e sugeriam, em vez de querer impor suas próprias idéias."
O projeto dos brasileiros superou concorrentes da altura de Nikken Sekkei, Stefano Boeri e O'Donnell & Tuomey (cujo projeto selecionado, a Central European University, tornou-se um entrave político após ser fechada pelo novo governo de estrema direita da Hungria).
O projeto desenvolvido em parceria entre Aleph Zero e Rosenbaum é apenas o segundo a receber tal honraria; O Grafton Architects foi o primeiro escritório premiado durante a primeira edição do RIBA International Prize em 2016. O projeto escolhido naquela ocasião foi o Campus da UTEC no Peru.
Reduzir, Reutilizar, Repensar
O Met de Nova York anunciou um grande projeto de reforma da sua famosa Rockefeller Wing. Liderado pela wHY Architecture em parceria com Kulapat Yantrasast, o novo projeto que redesenhará o já tradicional espaço expositivo do Met - que atualmente abriga as coleções de arte africana, da Oceania e das Américas - será inspirado na história do próprio museu. Conforme foi divulgado, acredita-se que as obras comecem em 2020 para que o museu seja reinaugurado já no ano de 2023.
Uma ampla reforma de uma unidade de um dos mais notáveis projetos de Moshe Safdie, o Habitat 67, foi concluída esta semana após quase dois anos de trabalho. O projeto, inicialmente programado para coincidir com o aniversário de 50 anos da criação desta obra seminal da arquitetura do século XX, foi totalmente revisitado pelo escritório de Safdie, adaptando-se aos padrões contemporâneos de eficiência energética e conforto. O novo espaço encontra-se imerso em luz natural - um retiro perfeito paro o inverno frio da cidade de Montreal.
Durante esta semana também foram premiados os melhores projetos de reforma realizados nos Estados Unidos durante o último ano, reconhecimento outorgado pela fundação Richard Driehaus. As obras podem até parecer moderadas demais, entretanto, esta aparência sóbria esconde uma enorme complexidade de projetos de reuso adaptativo - particularmente quando as obras são exímios exemplares da história da arquitetura americana.
A radical ação dos resíduos
O consumismo excessivo é algo que assombra a todos nós. Por isso mesmo, é admirável o esforço que vem sendo feito para reutilizar e readaptar estruturas que encontram-se esquecidas ou à beira do colapso. Somando-se a isso, de acordo com os curadores da Oslo Architecture Triennale de 2019 - essa é uma tendência mundial e extremamente bem vinda. Em uma entrevista realizada com os curadores Phineas Harper e Maria Smith (metade de uma equipe de curadoria de quatro pessoas, a qual também inclui Matthew Dalziel e Cecilie Sachs-Olsen), eles descreveram para o Archdaily o tema do evento, "decrescer".
O conceito é bastante amplo e pode ser até desconcertante para muitos arquitetos. Em uma profissão inerentemente ligada à produção e ao desenvolvimento, como podemos aceitar a idéia de decrescer e ainda assim manter-se em dia com a nossa profissão? Harper e Smith são idealistas, eles acreditam que o idealismo é parte fundamental do DNA da arquitetura.
“Em termos do que a arquitetura é capaz”, explica Smith, “nos perguntamos por que a maioria dos arquitetos são candidatos simpáticos… porque estamos vivendo essa dicotomia esquisita, mas ainda são eles que moldam o mundo em que vivemos através do seu trabalho. Então, se formos parar para pensar e analisar a realidade do mundo construído, podemos dizer que os arquitetos são pessoas determinantes nisso tudo. Quando os políticos começarem a falar sobre isso, eles vão querer citar exemplos. E é aí que nós aparecemos."