Este artigo foi originalmente publicado na CommonEdge como "African Architecture: Ornament, Crime & Prejudice."
Sempre fui fascinado pela teoria da arquitetura. Ao longo dos anos, li uma variedade de obras, mas nenhuma delas me deixou mais intrigado, perplexo e incomodado quanto Ornamento e Crime, o polêmico escrito de Adolf Loos publicado alguns anos antes do início da Primeira Guerra Mundial.
Deparei-me pela primeira vez com o ensaio de Loos quando, vindo da África, estudava design e vivia na Europa. O ensaio me deixou nervoso por duas razões: eu estava estudando para me tornar um designer "moderno", fundamentado pelos cânones da literatura especializada, mas eu vinha de uma cultura profundamente enraizada na ornamentação, portanto, o texto veio como uma afronta direta contra um aspecto central da minha identidade cultural.
Era uma realidade difícil de processar, mas situar o ensaio em seu contexto histórico oferecia uma perspectiva melhor. À época, Loos escrevera o ensaio essencialmente como um ataque ao historicismo (em grande medida, apontado contra seus antigos colegas da Secessão Vienense, movimento ao qual por um breve momento pertencera). A obra foi uma espécie de "textão de internet", um século antes da internet - Loos se voltava violentamente contra o status quo. Ainda assim, na minha opinião, o caso levantado por Loos e as analogias citadas (especialmente uma em que relaciona o uso ornamentação à tradição do povo da Papua Nova Guiné de pintar seus corpos como uma "suposta" marca de beleza) beiram a ofensa. Ornamentação, para o homem moderno, diz ele, era uma aberração. "Ornamento não é meramente produzido por criminosos", afirma mais adiante, "mas é, ele próprio, um crime..."
Ainda assim, como um designer em formação nos meus vinte e poucos anos, eu pensava diferente. Nas sociedades africanas tradicionais, o uso de ornamentação na arte e arquitetura vernaculares é essencial. Ela conecta a maioria das tribos locais com suas civilizações antepassadas e cosmologias tribais. Sem ornamentação, a história da maioria destas tribos estaria incompleta, pois estes símbolos não são meras decorações ou fontes de prazer (embora permaneçam agradáveis ao olhar), são repositórios vívidos e profundos de história.
Para boa parte das tribos africanas, edifícios tradicionais ornamentados narram histórias através de padrões, cores e detalhes, seja com esculturas autônomas ou através de relevos incorporados nas paredes, portas e outros elementos arquitetônicos. Na arquitetura Yoruba tradicional, por exemplo, os pilares que sustentam os telhados das casas são como totens que mostram diversos elementos escultóricos empilhados, representando um panteão de divindades ou, então, uma sequência de batalhas e conquistas tribais.
Para estas tribos, ornamentação arquitetônica também serve como meio de comunicação compartilhado. A complexidade de cada uma das línguas faladas pelas tribos africanas e suas limitações linguísticas não raro dificultavam a transmissão de suas histórias na forma escrita, portanto, estas tribos tipicamente recorriam a iconografias - que eram gravadas sobre as superfícies de seus edifícios, utensílios, vestuário e mobiliário. Algumas palavras de idiomas tribais africanos são difíceis de traduzir para o inglês; muitas vezes não há significado literal para certos vocábulos, apenas inferências. E por haver diversos grupos e sub-grupos étnicos que falam diferentes línguas e dialetos, era difícil apresentar estas histórias em uma língua unificada, compreendida por todos.
Diferentes tribos também apresentavam diferentes níveis de alfabetização. Como resultado, algumas delas dividiam seus próprios sistemas indígenas de alfabetização usando pictogramas únicos. O símbolo Adinkra do antigo Império Ashanti é ainda usado como motivo em tecidos criados pelos Akans em Gana. Em seu memorável livro Religion and Art in Ashanti, Robert Sutherland Rattray identificou, isolou e interpretou pelo menos cinquenta destes símbolos. Por exemplo, o símbolo da palmeira (Abe Dua) conotava riqueza, autossuficiência, tenacidade e vitalidade, ao passo que o pé de galinha (Akoko nan) significava paternidade, cuidado, ternura e proteção. O povo Igbo, do sudeste da Nigéria, tinha uma escrita ideográfica similar chamada Nsibidi, usada também por outras minorias étnicas do Delta do Níger.
O povo Ndebele, do sul da África, transmitia uma ampla gama de emoções através dos padrões coloridos pintados em suas casas: tudo, de símbolos de resistência política, exibidos à vista fácil para contrariar seus opressores, a motivos usados para expressar tristeza, alegria, orações, e até mesmo o status social do proprietário. Hoje, estes padrões estão ainda em uso, pois representam uma parcela da história registrada que nenhuma cultura pode se dar ao luxo de descartar completamente.
Se Loos estivesse vivo hoje, certamente ficaria horrorizado com algumas tendências estéticas atuais, que, segundo sua visão, beiram a criminalidade. Em vez de concretizar sua infame profecia de construir "...uma cidade totalmente branca - onde todas as paredes dos edifícios fossem pintadas de branco reluzente - assim como Zion", os modernistas de hoje estão cada vez mais abraçando as cores, padrões e ornamentos, e estão fazendo uso de formas complexas onde, no passado recente, simples caixas brancas teriam bastado.
A ornamentação africana está encontrando hoje seu caminho em outras esferas do design contemporâneo. Os padrões artísticos inspirados na mitologia Yoruba, produzidos pelo designer nigeriano Laolu Senbanjo, que vive em Nova Iorque, se tornaram populares não apenas entre a diáspora Africana, mas em todo o mundo. Alguns de seus padrões figuram hoje em garrafas de conhaque, perfumes e mesmo em vestuário esportivo da Nike. Debater se isso é ou não uma coisa boa talvez seja assunto para um outro ensaio, mas está claro que a beleza da ornamentação africana exerce uma poderosa atração.
Hoje podemos ver que Loos errou - e não foi por pouco, mas por um verdadeiro abismo. Contrariamente às suas previsões, as sociedades africanas não avançarão descartando seus ornamentos. (Talvez nenhuma sociedade avançará assim.) Hoje, apagar a história, negar nossas identidades coletivas e rejeitar os prazeres profundos de reconhecer e admitir o passado são os verdadeiros crimes. Hoje, podemos agradecer Adolf Loos por nos lembrar disso.