O recente corte de verba do orçamento das Universidades Federais reacendeu um debate que merece permanecer sempre ativo, o da qualidade da educação no Brasil. A primeira edição dos Encontros de Arquitetura, promovido pelo IABsp, propôs abordar o tema a partir do espectro da arquitetura, trazendo à roda quatro profissionais com ampla experiência em projetos de escolas: Catherine Otondo, Marina Grinover (Base Urbana), Keila Costa (+K) e Pablo Hereñú (Hereñú & Ferroni Arquitetos).
Mediados por Avany Ferreira, gerente de projetos da Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE) do Governo do Estado de São Paulo, e Julianne Bellot, arquiteta, professora e pesquisadora especializada em arquitetura educacional, os arquitetos apresentaram projetos de escolas públicas e privadas, construídos ou em andamento, que serviram de base para o debate posteriormente aberto à participação do público.
Superando a dicotomia estabelecida entre ensino público e privado, os projetos apresentados lidam com o mesmo tema – o espaço pedagógico – a partir de contextos sócio geográficos diversos e estratégias nem tão diversas quanto se poderia imaginar. A escola enquanto elemento mediador de escalas, estabelecendo a ponte entre a cidade e o edifício, foi aspecto recorrente nas obras apresentadas.
Seja na Escola Estadual Nova Cumbica III em Guarulhos, de Hereñú & Ferroni Arquitetos, onde, através do deslocamento da entrada de alunos, os arquitetos lograram ativar uma faixa de terreno de frente para um córrego que outrora apresentava caráter residual, ou na Escola Vera Cruz EF em São Paulo, da Base Urbana, composta por uma variedade de estruturas pré-existentes em um meio de quadra que foram cuidadosamente reorganizadas, o tema da cidade aparece como uma constante. O esmero no desenho da transição da escala urbana para a escala da edificação é percebido em todos os projetos apresentados, notadamente os públicos, e dele surgem interessantes elementos – bancos, muretas, pracinhas – que, embora singelos, revelam-se potentes catalisadores de interações sociais.
Notável também é o emprego de soluções estruturais similares nos projetos de escolas públicas e privadas. No caso das primeiras, a incontestável força de condicionantes econômicas conduz naturalmente a soluções estruturais menos custosas, mais rápidas e mais eficientes. O desafio dos profissionais de arquitetura é justamente seguir as restrições orçamentárias sem abrir mão das qualidades funcionais, estéticas e pedagógicas do projeto. A opção por estruturas compostas por elementos pré-fabricados de concreto pode parecer óbvia, inclusive pela possibilidade de verticalização em áreas periféricas adensadas, mas o resultado em termos espaciais e lúdicos não é – como mostrou a arquiteta Keila Costa em seu projeto para a Escola Estadual Jardim Maria Helena III, em Baruerí, na qual o emprego de elementos vazados feitos de blocos de concreto e uma enorme empena vermelha aponta para um distanciamento da estética comumente associada aos pré-fabricados e faz da escola um importante elemento de identidade na comunidade onde está inserida.
Não obstante, soluções estruturais eficientes e econômicas não são exclusividade dos projetos públicos. Correndo contra um cronograma apertado, a Base Urbana fez uso de estrutura pré-fabricada mista de aço e madeira no projeto da Escola em Alto de Pinheiros 2, em São Paulo, possibilitando a construção simultânea dos elementos metálicos e de madeira. Se bem que motivada por questões de ordem diferente daquelas que restringem as obras públicas, a estratégia projetual segue caminho semelhante na esfera privada – eficiência, rapidez, racionalidade – distinguindo-se apenas pelo nível de pormenorização, isto é, os detalhes relativos ao acabamento das estruturas e revestimentos.
A subsequente discussão aberta ao público levantou, entre outros tópicos, a urgência de se rever o papel da educação pública na sociedade. O que se constata é que em função da mercantilização do ensino, a escola pública ficou restrita às classes mais pobres, quando deveria ser para todos os cidadãos - como o é em inúmeros países onde a educação atinge os mais altos níveis de qualidade. Educação para todos é o caminho para o convívio, desde a infância, com todos e não apenas com iguais, sendo este um ingrediente indispensável para uma sociedade mais justa e solidária.
Nesta discussão, a arquitetura pode desempenhar um papel fundamental e transformador, sendo o meio através do qual se constroem espaços não apenas educativos, mas também pedagógicos.