Caminhar é mais do que um movimento mecânico: é apropriar-se cotidianamente do espaço da cidade. Estar no ambiente urbano de forma ativa, percebendo a cidade e os detalhes que dela fazem parte. Essa escolha, no entanto, nem sempre depende apenas da vontade das pessoas; está atrelada também a fatores externos, como as condições físicas e sociais dos indivíduos e a existência ou não de infraestruturas que permitam essa opção.
Estamos falando de caminhabilidade, um conceito que leva em conta, principalmente, a acessibilidade no ambiente urbano e mensura a facilidade que as pessoas têm de se deslocar na cidade. Os índices de caminhabilidade vão influenciar diretamente a predisposição que os cidadãos têm ou teriam para caminhar em determinados locais.
O primeiro ponto a ser observado é a possibilidade de acessar, caminhando, áreas de lazer, comércio e entretenimento, como parques, lojas, restaurantes, museus, entre outras atividades sociais e culturais que as cidades oferecem. Em um segundo momento, analisam-se as condições do caminho que precisa ser percorrido até o destino. Nesse sentido, a percepção que temos do ato de caminhar – nossa predisposição para optar por essa forma de deslocamento em detrimento de outras – também está intimamente ligada à qualidade das calçadas. Passeios públicos que atendam os princípios pelos quais deve ser norteada a construção de uma calçada estimulam os deslocamentos a pé e, como consequência, melhoram a qualidade de vida nas cidades.
Repensar a forma como nos deslocamos, mais do que uma tendência, tem se tornado uma diretriz de planejamento urbano em grandes cidades do mundo. Amsterdã, Copenhague, Helsinque, Zurique e Hamburgo são exemplos de cidades que trabalham nessa direção. Entenda a seguir o que essas cinco cidades fizeram para incentivar os deslocamentos a pé e melhorar o dia a dia das pessoas nas áreas urbanas.
Helsinque, Finlândia
Quanto mais pessoas na cidade, menos carros serão permitidos nas ruas. Essa é a lógica da capital finlandesa que, em seu um planejamento para 2050, pretende criar uma rede de bairros mais densos, caminháveis e conectados entre si, com prioridade para o transporte ativo e coletivo. A ideia é que oportunidades de trabalho, áreas de moradia e lazer, comércio, escolas e demais serviços urbanos sejam elementos próximos o suficiente para tornar os deslocamentos cotidianos viáveis a pé ou de bicicleta, tornando os veículos individuais motorizados cada vez menos necessários no dia a dia. Esses são princípios de planejamento contemplados na publicação DOTS nos Planos Diretores, desenvolvida pelo WRI Brasil para auxiliar cidades a adotarem uma estratégia de planejamento mais eficiente e sustentável.
Copenhague, Dinamarca
Uma das cidades mais reconhecidas pelo uso da bicicleta como meio de transporte implementou suas primeiras zonas exclusivas para pedestres já na década de 1960. Hoje, as áreas de pedestres estão espalhadas pela cidade, e os diferentes meios de transporte convivem no espaço urbano. A transformação na capital dinamarquesa, pautada pelo trabalho de Jan Gehl, começou pelo entendimento de que a priorização do pedestre, dos trajetos a pé e da mobilidade ativa é um dos primeiros passos para melhorar a mobilidade, equilibrar a distribuição do espaço e construir uma cidade mais justa para as pessoas.
Zurique, Suíça
Em Zurique, 31% dos deslocamentos são feitos a pé ou de bicicleta – 27% deles a pé. Essa é uma das marcas da cidade, que conseguiu o que cidades no mundo inteiro lutam para alcançar: uma mobilidade eficiente, integrada e multimodal que permite que as pessoas consigam realizar seus deslocamentos cotidianos sem precisar de um carro (o transporte coletivo responde por 39% na divisão modal, e os carros, apenas 30%). O caminho para esses índices começou em 1996, quando a cidade assumiu o compromisso de não permitir a construção de novos estacionamentos, exceto em substituição de um já existente. Desde então, grande parte dos estacionamentos construídos foi colocada abaixo do nível do solo, e o espaço desocupado na superfície foi destinado à criação de praças, espaços públicos e zonas exclusivas para os pedestres.
Amsterdã, Holanda
Em Amsterdã, as bicicletas ditam o ritmo. Em grande parte da cidade, os limites de velocidade não passam dos 20 km/h, garantindo segurança para os modos ativos. Na divisão modal da capital Holandesa, a mobilidade ativa se destaca: 32% para bicicleta e 29% para a caminhada. Embora as bicicletas sejam maioria, a preocupação com a caminhabilidade se reflete nos investimentos feitos pela cidade em infraestrutura para pedestres. Além de trabalhar para que a área urbana seja conectada e acessível, facilitando os deslocamentos a pé e de bicicleta, Amsterdã tem a meta de se tornar a primeira cidade da Europa livre de emissões até 2025.
Hamburgo, Alemanha
Segunda maior cidade da Alemanha, Hamburgo já foi eleita Capital Verde Europeia por suas estratégias de planejamento e metas ambientais ambiciosas. No caso da cidade alemã, a principal meta é tornar o espaço urbano totalmente acessível a pé ou de bicicleta, conectando as principais áreas verdes e de lazer da cidade em 40% do território. O projeto chamado de Rede Verde incorpora uma visão de planejamento já presente na cidade há pelo menos um século. O conceito de eixos, desenvolvido pelo planejador urbano Fritz Schumacher, tem o acesso à natureza como base. Assim, Hamburgo trabalha constantemente para eliminar a necessidade de uso dos carros, mostrando na prática que grandes cidades podem ser ambientes caminháveis e planejados para as pessoas.
Via WRI Brasil.