Os Maggie's Centres são uma rede de centros de cuidados intensivos para o tratamento de pessoas afetadas pelo câncer. Desde a inauguração de sua primeira sede, a instituição tem incumbido aos mais importantes e reconhecidos nomes da arquitetura contemporânea, a difícil tarefa de projetar espaços capazes de renovar as esperanças destas pessoas, ajudando-as a encontrar forças e manterem-se positivas na luta contra o câncer.
Desde a inauguração do primeiro Maggie's Center na cidade de Edimburgo, em 1996, importantes arquitetos se uniram a esta iniciativa, desenvolvendo projetos de arquitetura inovadores e que têm provocado uma mudança de atitude nas pessoas em tratamento contra o câncer e seus respectivos cuidadores, amigos e familiares.
Atualmente, vinte e um centros estão em operação no Reino Unido, todos vinculados à hospitais da Rede Pública de Saúde. Somando-se a estes, existem outros três Maggie's Centres espalhados pelo mundo: um em Hong Kong, um em Tóquio e outro em Barcelona.
Destes vinte e quatro centros abertos, outros três encontram-se atualmente em construção e com inauguração prevista para os próximos seis meses. Arquitetos de renome mundial estão entre os autores destes projetos, incluindo Steven Holl, Zaha Hadid e Frank Gehry. Com projetos ousados e inovadores, os Maggie's Centres tem se firmado não apenas como uma referência no combate ao câncer, mas também no cenário da arquitetura contemporânea. Ainda que muitos de nós já tenhamos visto um Centro Maggie, ao menos pela internet, são poucos aqueles que sabem exatamente a que estes edifícios se destinam. Estes edifícios, ao invés de ser pensado como uma estrutura clínica, são concebidos como uma casa, um lugar onde as pessoas podem passar bons momentos próximos de seus entes queridos. Os efeitos terapêuticos destes espaços estão sendo comprovados na prática à medida que mais e mais pacientes fazem uso destas estruturas.
O programa de necessidades dos Centros Maggie, se é que existe um, é que o edifício seja o oposto de uma clínica de tratamento para pacientes com câncer. Pelo menos é isso que desejava Maggie Keswick Jencks, co-fundadora do Maggie's Centre. Escritora, artista e paisagista - esposa do crítico de arquitetura Charles Jencks - Maggie morreu em 1995, após anos de luta contra o câncer. No processo de seu tratamento, ela tornou-se uma ardente defensora de que a luta contra o câncer, não deve ser travada somente dentro de um hospital. Fundamentalmente, ela sabia exatamente como estes espaços não deveriam ser. No manual que ela escreveu, Maggie revela como as salas de espera de hospitais são tristes e mal iluminadas, espaços que pouco tem a contribuir com a vitalidade e a esperança dos pacientes.
Ela queria conscientizar as pessoas de que espaços aconchegantes e agradáveis eram fundamentais para estes pacientes; que luz natural assim como jardins, pássaros e o azul céu poderiam ajudar tanto quanto o próprio tratamento; ela sonhava com poltronas onde eles poderiam descansar ou rir na companhia de um amigo; "banheiros" como o que temos em casa, onde nos refugiamos para chorar quando estamos desesperados. Estes espaços deveriam ser planejados ao redor de uma cozinha, sem corredores escuros e espaços hierarquizados. A equipe técnica no local contribuiria para o tratamento apenas em um sentido holístico da coisa, oferecendo suporte psicológico e ajudando os pacientes a relaxar.
Nestes mais de vinte anos que nos separam da fundação do instituto, o câncer mudou de figura assim como os tratamentos evoluíram, mas os Maggie's Centres permanecem fiéis à visão de sua fundadora. “Quanto mais conscientes as pessoas são da gravidade de sua doença, mais elas querem se sentir no controle da coisa e encontrar forças dentro de si mesmas para lutar contra o câncer. Os espaços dos Centros Maggie proporcionam este apoio que não pode ser encontrado em nenhum hospital ou clínica de tratamento”, diz Laura Lee, diretora executiva dos Centros Maggie. “Estes espaços incentivam a autodeterminação e a autonomia dos pacientes”. Estudos realizados ao longo das últimas décadas nos mostram que a atitude positiva é importante quando se trata de sobreviver ao câncer: aqueles que aprendem como lidar com todos os desafios da doença vivem mais.
O câncer é hoje uma das principais causas de morte em todo o mundo e, de acordo com levantamentos realizados pelos Institutos Nacionais de Saúde, o número de novos casos tende a alcançar 23,6 milhões de pessoas em todo o mundo até 2030. Por outro lado, as taxas gerais de mortalidade por câncer diminuíram bastante ao longo dos anos; as pessoas estão vivendo mais mesmo com todas as incertezas por trás da doença. Além disso, há um custo enorme que não entra nesta conta - normalmente os familiares dedicam horas de trabalho não remunerado para prestar assistência e apoio aos doentes. “Viver mais tempo diante de uma doença tão letal, significa que os espaços dos Centros Maggie desempenham um papel fundamental na maneira como nos sentimos com nós mesmos durante o tratamento,” diz Lee, enfermeira de Maggie de 1991 a 1995 e chefe de desenvolvimento dos Maggie's Center desde 1998.
“A dificuldade que os pacientes encontram em um hospital é a mesma de vinte anos atrás”, concorda Lily Jencks, filha de Maggie e Charles, arquiteta e paisagista. Como seu pai, Charles Jencks, ela faz parte da comissão administrativa do Maggie's Centre. “Os hospitais são construídos para cumprir com uma série de requisitos solicitados por cirurgiões e médicos muito ocupados com suas especialidades e pouco preocupados com as características espaciais destes edifícios.” A maioria dos Centros Maggie segue um plano aberto, com espaços contemplativos fluindo desde uma cozinha ou área de convívio central. “Minha mãe acreditava que o espaço deveria ser facilmente apreendido assim que passássemos pela porta de entrada, que instantaneamente nos sentíssemos em casa”, diz Lily. As vistas e a acessibilidade ao jardim são elementos fundamentais em cada Centro Maggie, e na maioria deles, enormes aberturas permitem que os pacientes sempre estejam em contato com o mundo exterior. Lily, que agora gerencia seu próprio escritório em Londres, foi responsável pelo projeto paisagístico do Maggie's Glasgow Gartnavel (2011) enquanto ainda trabalhava para o OMA. Com aquele projeto, ela ressalta, Rem Koolhaas rompeu com a típica tipologia do Maggie's, projetando um edifício de paredes de vidro aberto para todos os lados. Localizado em meio a um bosque, o edifício projetado por Koolhaas se parece mais com um pavilhão modernista na floresta que com um centro de tratamento de pacientes com câncer.
Por outro lado, o Maggie's Center Barts de 2017, projetado por Steven Holl Architects, é um edifício que mais se parece com um percurso, um espaço que flui ao redor de um grande átrio central. Apesar de sua estrutura vertical, “você ainda é capaz de ver tudo aquilo que está acontecendo ao seu redor e fora do edifício também”, diz Lee. “O resultado disso é uma sobreposição de camadas de espaços públicos e privados.”
Embora o engajamento de tais arquitetos nos projetos do Maggie's Centre se deva certamente graças ao prestígio de Jencks, Lee diz que a escolha destes arquitetos é pessoal e intencional. Qualquer bom arquiteto seria capaz de desenvolver um bom projeto segundo as nossas necessidades, mas o que buscamos são pessoas com uma inteligência emocional, capazes de atender às necessidades existenciais além daquelas espaciais: como um espaço pode contribuir com a nossa sensação de tranquilidade, paz de espírito, esperança e nos inspira a lutar pela nossa própria vida? Lee diz que os projetos dos Centros Maggie procuram evitar a imagem de um edifício institucional para se concentrar mais em um espaço doméstico, flexível o suficiente para acomodar pessoas de todas as idades e origens.
Os Centros Maggie continuam a prosperar, atualmente eles recebem mais de 281.000 pacientes com câncer e familiares todos os anos - o que mudou ao longo deste tempo é que agora as pessoas estão conscientes da importância de espaços como estes na luta contra o câncer. “Todos nós sofremos de alguma maneira com tudo aquilo que acontece ao nosso redor, seja na vida privada ou pública,” diz Lily. “Em espaços para o tratamento de pessoas doentes, isso é ainda mais evidente.”