No ano passado, a agremiação Unidos da Tijuca divulgou a temática do enredo que a escola irá apresentar na Marquês de Sapucaí em 2020: "Arquitetura e Urbanismo". A escolha foi influenciada pelo título inédito que o Rio de Janeiro recebeu da UNESCO como Capital Mundial da Arquitetura, além da cidade também ser selecionada como a sede do Congresso Mundial de Arquitetos, evento da União Internacional de Arquitetos - UIA - que deve atrair cerca de 15 mil profissionais e ocorrerá em julho deste ano. Além de homenagear os arquitetos e urbanistas, a escola discutirá na passarela questões importantes que permeiam o campo de atuação destes como o direito à cidade, o papel da construção civil perante a crise climática, preservação de patrimônios e até mesmo os conhecimentos ancestrais da profissão.
Segundo texto divulgado pela agremiação, "ao realizar o seu trabalho, os arquitetos deixam registros que nos ajudam a compreender a nossa história. Templos, castelos, monumentos, casas, prédios, conjuntos habitacionais, parques, praças, ruas e avenidas revelam a contribuição de uma das mais antigas profissões. Das edificações da Antiguidade às cidades modernas, cada espaço ensina a cultura de seu tempo. Mas muitos são os desafios. É preciso conservar o patrimônio cultural da humanidade, além de resolver os problemas gerados pelo crescimento injusto e desigual, que se agrava nos centros urbanos e afeta a existência de todo o planeta. Arquitetar a vida é assegurar o testemunho do passado, intervir no presente e traçar para o futuro uma cidade e um mundo sustentáveis, a que todos tenham direito".
Após cinco anos, o carnavalesco Paulo Barros retorna à Unidos da Tijuca para desenvolver o desfile junto de Isabel Azevedo, Ana Paula Trindade e Simone Martins. O enredo intitulado "Onde moram os sonhos", teve seu samba assinado por Dudu Nobre, Totonho, André Diniz, Fadico, Jorge Aragão.
O sonho nasce em minha alma
Vai tomando o peito e ganhando jeito
Se eternizando, traduzido em forma
O mais imperfeito, perfeição se torna
Lá no me quintal, eu vou fazer um bangalô
Já foi tapera feita em palha e sapê
E uma capela que a candeia alumiou
A lua cheia...
Vem, é lindo o anoitecer
Vai, eu morro de saudade
Todo mundo um dia sonha ter
Seu cantinho na cidade
Como é linda a vista lá do meu borel
Luzes na colina, meu arranha-céu
Linhas do arquiteto, a vida é construção
Curva-se o concreto, brilha a inspiração
Lágrima desce o morro
Serra que corta a mata
Mata, a pureza no olhar
O rio pede socorro
É terra que o homem maltrata
E meu clamor, abraça o redentor
Pra construir um amanhã melhor
O povo é o alicerce da esperança
O verde beija o mar, a brisa vai soprar
O medo de amar a vida
Paz e alegria vão renascer
Tijuca, faz esse meu sonho acontecer
A minha felicidade, mora nesse lugar
Eu sou favela!!!
O samba no compasso é mutirão de amor
Dignidade não é luxo, nem favor
O desfile será dividido em abertura e outros quatro setores que irão discutir a profissão e o campo de atuação dos arquitetos e urbanistas, privilegiando não apenas a arquitetura moderna que culmina na imaginação da produção brasileira no cenário internacional, como também a arquitetura indígena e a importância do pensamento sobre a cidade. Confira o roteiro abaixo:
Abertura
O que move homens e mulheres que se dedicam a pensar na arte de viver, projetar, organizar e produzir o lugar da moradia, do trabalho, da diversão, do lazer e da religião?
A sensibilidade do artista procura e encontra soluções, ao erguer palácios, igrejas, casas, vilas, cidadelas e metrópoles que desafiem o tempo e o espaço. Esse é um processo que acontece há milênios, todos os dias.
A Tijuca percorre a Avenida da Capital Mundial da Arquitetura apresentando algumas de suas grandes realizações do passado até chegar às modernas metrópoles da atualidade. E convida a todos para participar do projeto de um futuro em que haja qualidade de vida e justiça social para todos. Que venham os arquitetos e urbanistas do mundo! Vamos planejar o amanhã… Porque os sonhos vivem dentro de nós e é possível torná-los realidade, se trabalharmos juntos.
Setor 1 – Em busca da eternidade…
Na Antiguidade, os que governaram as primeiras civilizações construíram edifícios monumentais para cultuar suas divindades, abrigar seus sarcófagos, proteger suas cidades, divertir seus povos. Maravilhas arquitetônicas do Mundo Antigo resistiram há milhares de anos, para que suas ruínas nos revelassem histórias perdidas no tempo, onde faraós e imperadores homenageavam os deuses e construíam templos que são testemunhos da avançada cultura das sociedades daquele período. O refinado conhecimento dos povos antigos, com suas construções simétricas e harmoniosas, foi resgatado de suas ruínas e inspira, até hoje, a arquitetura mundial.
Setor 2 – Arquitetando o Brasil
Muitos povos indígenas residem em construções que guardam um conhecimento ancestral. As ocas e malocas de madeira, folhas e fibras, habilidosamente encaixadas e trançadas com cipó, se integram à natureza e ao modo de vida das populações tradicionais. A chegada dos portugueses, no século XVI, dá início a uma nova forma de arquitetura e de construção, que, além do conhecimento indígena e dos colonizadores, recebe a influência dos negros africanos escravizados. Cada edifício da história guarda os registros do trabalho de seus arquitetos e da mão de obra que os construiu. Caminhar por algumas cidades históricas de Minas Gerais é conhecer a riqueza das igrejas barrocas do período colonial, que floresceu no ciclo do ouro, no século XVII, e, também, a genialidade do artesão Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. A vinda da família real, em 1808, e, tempos depois, da Missão Artística Francesa favoreceu o uso de materiais mais refinados, que chegavam das fábricas portuguesas para revestir as edificações do neoclássico carioca. A criação da Academia Imperial de Belas Artes e do primeiro curso de arquitetura civil aguça o gosto pelos traços europeus. Alguns artistas da era moderna avançam em novas formas, inspirados pelas curvas da natureza, ainda sob a influência francesa. No modernismo, a leveza do traço do genial arquiteto brasileiro projeta o Brasil para o mundo inteiro. A capital pousa no centro do país e se torna um exemplo de cidade planejada, que, no entanto, não consegue resolver as contradições da desigualdade social.
Setor 3 – O sonho que se perde todos os dias
No entanto, com o passar do tempo, crescem as grandes cidades, de forma desigual, e, com isso, surgem os problemas que afetam a maioria da população das metrópoles. O desmatamento avança, sem nenhum controle, provocando o esgotamento dos solos, o desaparecimento das águas e o desequilíbrio climático, com graves consequências para todo o planeta. No lugar das florestas, surgem as cidades onde a violência se espalha e a desigualdade social expulsa e ameaça a vida de quem não tem sequer o direito à moradia. Os vazamentos de petróleo matam pássaros e peixes, destruindo ecossistemas sensíveis. O combustível poluente abastece um trânsito caótico, imobilizando as pessoas em seus milhares de automóveis, que poluem o ar e contribuem para o aquecimento global. A enorme quantidade de lixo, originado pelo consumo desenfreado, afeta os rios, os mares e a terra. São toneladas diárias de detritos contaminando tudo ao redor. Nas cidades de hoje, esquecemos o futuro todos os dias. E o mal, que produzimos para o ambiente em que vivemos, pode atingir o equilíbrio da natureza em lugares que não podemos imaginar.
Setor 4 – A cidade que pode ser maravilhosa
Pense em uma cidade onde é possível abrir as janelas para contemplar o verde, passear nos parques, circular nas ruas, sentir a brisa quente que vem das praias e traz o cheiro da maresia… Respire o ar puro da floresta. Imagine um lugar onde os rios correm livremente para o mar e é possível mergulhar na baía e nadar na lagoa. Em que casas seguras e confortáveis, construídas em suas colinas, contemplam a paisagem e repousam tranquilas. Aqui, se pode acordar mais tarde e chegar do trabalho mais cedo, porque o trânsito flui e o transporte é acessível. O ar é puro, a vida é boa. Tem escola, universidade, teatro, cinema, hospital e moradia para todos. Essa cidade existe e está nos sonhos de milhares de pessoas. Ela também vem sendo construída no trabalho cotidiano de quem dedica sua existência a buscar soluções para criar uma cidade sustentável. Mas é preciso conquistá-la, alimentar os sonhos todos os dias. A Tijuca quer arquitetar o futuro na Avenida do Samba, provocando o encontro com aqueles que sabem que ele é possível. Conhecer o passado, reagir ao presente e tramar o futuro nos traz a certeza de que não devemos retroceder. Porque o sonho que se sonha junto é realidade e a cidade maravilhosa ainda precisa ser conquistada!