Desde os mais renomados institutos de tecnologia da América do Norte a projetos residenciais no Oriente Médio, a ideologia da Bauhaus se espalhou pelo mundo junto com seus principais pensadores, exilados após o fechamento da instituição com a ascensão do nazismo no final dos anos trinta na Alemanha. Sua influência na arquitetura e no design podem ser vistos pelos quatro cantos do mundo, projetos e edifícios construídos são testemunhas do prestígio da escola de Dessau e Weimar. Enquanto a maioria dos projetos em “estilo Bauhaus” apenas reproduz a linguagem universal proposta pela escola, alguns poucos exemplos em particular, combinaram a teoria da Bauhaus com princípios de design local, resultando em uma arquitetura universal entretanto, profundamente enraizada na cultural e no clima específico do lugar onde está inserida.
Este artigo foi desenvolvido através de uma colaboração entre o ArchDaily e a Arieh Sharon Organization. Todas as imagens históricas que ilustram a matéria foram gentilmente cedidas pela Arieh Sharon Org.
Talvez desconhecida pelo grande público e, surpreendentemente, pela maioria dos arquitetos e arquitetas, a Universidade Obafemi Awolowo na Nigéria é um destes fascinantes projetos de arquitetura que nasceram de uma estreita sinergia entre a ideologia Bauhaus e as especificidades da arquitetura local. Como resultado disso, a arquitetura do campus da Universidade Obafemi Awolowo é uma fusão de edifícios modernos, estruturas de concreto e elementos arquitetônicos da cultura nigeriana, padrões, escadas e pátios, uma arquitetura onde a luz natural assume papel fundamental na composição e organização dos espaços.
Fundada nos anos sessenta na cidade nigeriana de Ile-Ife, logo após ser declarada a independência da Nigéria do Reino Unido, a então Universidade de Ife passou recentemente a ser chamada de Universidade Obafemi Awolowo, em homenagem a um dos mais importantes heróis da luta por independencia na Nigéria. Desenvolvido em parceira entre o arquiteto israelense e ex-aluno da Bauhaus Arieh Sharon e escritório nigeriano de arquitetura A.A. Egbor, o projeto do Campus da Universidade de Ife é hoje conhecido como “o mais fascinante campus universitário da África”, um projeto que se estendeu por um período de 25 anos e foi construído com a colaboração da AMY Company.
A equipe de arquitetos, liderados por Sharon, escolheu este terreno à dedo, muito devido às suas características topográficas bastante singulares. Eles projetaram uma série de edifícios que se espalham pela paisagem, “subindo e descendo as pequenas colinas” da planície do sudoeste da Nigéria. Desta maneira, os arquitetos procuraram preservar ao máximo a topografia natural do terreno, implantando as enormes estruturas de concreto de forma a causar o menor impacto possível na paisagem e no seu contexto específico. Como resultado desta abordagem, o Campus da Universidade Obafemi Awolowo se materializa como uma tipologia “híbrida rural-urbana” – afastada do contexto urbano, mas profundamente integrada à vida cotidiana da comunidade local.
Mas nem tudo foi assim tão fácil. Os arquitetos enfrentaram primeiramente dois grandes desafios: adaptar novos e inovadores conceitos de construção às técnicas construtivas locais além de lidar com o rigoroso clima quente e úmido do país. Muitas fontes afirmam que Arieh Sharon decidiu suspender o desenvolvimento do projeto meses após o início dos trabalhos. Ele visitou outras importantes obras modernas construídas na Nigéria, como o campus de Ibadan (1948), além de estudar cuidadosamente os principais elementos da arquitetura vernacular nigeriana.
Como o desenvolvimento e a implantação do projeto do Campus da Universidade de Ife-Ile se deu em um conturbado período de transição política, muitos se referem a este peculiar estilo de arquitetura como “pós-colonial” ou “quasi-colonial”. O novo governo soberano da Nigéria não mediu esforços para reconstruir o país, não apenas fisicamente, mas para apresentá-lo como uma nova nação moderna e independente. Em sintonia com as autoridades locais, Sharon apresentou uma proposta que fundia princípios do estilo Bauhaus com elementos da arquitetura vernacular nigeriana, defendendo um projeto de características universais porém, intimamente enraizado na cultura local. Ao longo dos anos que sucederam o início desta frutífera colaboração, Sharon estudou a fundo a arquitetura vernacular nigeriana, apropriando-se de importantes elementos e incorporando-os no desenvolvimento do projeto do Campus.
Formalmente, a arquitetura do campus também pode ser compreendida como uma mistura de princípios modernistas e elementos vernaculares, a qual integra uma série de pátios de diferentes escalas dentro dos próprios edifícios. Embora as estruturas construídas do campus possam parecer grande demais, elas foram concebidas como estruturas de proteção capazes de criar um microclima interior, favorecendo a iluminação e ventilação do espaços interiores através destes pátios. Além disso, o campus é uma ode à liberdade, uma arquitetura desprovida de portas e portões, espaços que dissolvem limites e demarcações, uma deliberada e fecunda combinação entre interior e exterior. Talvez o edifício mais significativo do campus seja o Odudwa Hall, uma grande estrutura de concreto que pode ser vista como uma escultura habitada, um edifício monumental e convidativo concebido para acolher os mais importantes eventos e atividades públicas do campus.
O clima quente e úmido da Nigéria foi um dos maiores desafios que a equipe liderada por Sharon teve que enfrentar ao longo do desenvolvimento do projeto. Os arquitetos britânicos Maxwell Fry e Jane Drew, com o projeto do Campus da Universidade de Ibadan, foram os primeiros estrangeiros à propor uma solução arquitetônica moderna adaptada ao clima específico da África Ocidental. No entanto, as soluções propostas, detalhadas em um livro publicado pouco tempo depois, foram desenvolvidas a partir de uma perspectiva alóctone, completamente alheia e deslocada dos costumes e práticas locais. Por sua vez, as autoridades locais assim como o próprio Sharon, procuraram desenvolver uma nova abordagem, profundamente vinculada com a cultura local.
Uma das soluções mais inovadoras em relação ao projeto de Fry e Drew, foi a maneira com que os arquitetos propuseram a orientação e a implantação dos edifícios no campus. A maioria dos volumes foram implantados com orientação norte-sul como uma resposta direta às condições climáticas específicas do local, procurando promover a ventilação natural, tirando proveito dos ventos dominantes e ao mesmo tempo, minimizando as faces com mais tempo de exposição à incidencia direta dos raios de sol. Além disso, a “fluidez” entre os espaços interiores e o exteriores favorece a ventilação natural e o efeito chaminé através dos edifícios do campus.
Ao longo dos anos, os edifícios do Campus da Universidade Obafemi Awolowo passaram por inúmeras reformas devido as novas normas e necessidades que foram surgindo com o tempo. Devido ao considerável aumento do número de alunos, os administradores decidiram transformar o anfiteatro e também o centro esportivo em salas aula. A cobertura plana do projeto original de Sharon também não resistiu, principalmente por não responder bem aos altos índices pluviométricos do país.
Esta fantástica e desconhecida obra de arquitetura permanece operante e em uso até hoje. Veja à seguir algumas imagens atuais do Campus pelas lentes de Iwan Baan.
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