Ainda pouco visada pela mídia internacional, a produção arquitetônica contemporânea da Angola enfrenta, à semelhança de boa parte de seus vizinhos africanos, realidades sociais e econômicas que não contribuem com sua difusão. Quando às dificuldades habituais da arquitetura são somadas ainda outras, derivadas de intenso processo de neocolialismo, fica realmente difícil tirar as boas ideias do papel, construí-las de fato. Tensionando a relação entre o concreto e o digital, o grupo angolano Banga recorre ao espaço virtual para dar vida a projetos que mesclam arquitetura, experiências sensoriais e arte.
Intitulada Cabana de Arte, a iniciativa tem como objetivo dar visibilidade à jovens arquitetas, arquitetos e escritórios angolanos que vêm buscando encontrar uma (ou várias) identidades para a arquitetura nacional. Além disso, a partir do trabalho colaborativo desses profissionais, pretende consolidar uma rede de contatos que contribua para o fomento e reconhecimento internacional da arquitetura contemporânea do país.
De acordo com o grupo, a "Cabana de Arte é uma iniciativa que visa trazer ao palco não apenas projetos e produções próprias, mas principalmente, dar espaço (mesmo que virtual, simulado ou utópico) aos artistas e arquitetos em Angola." Recorrendo ao universo virtual, onde algumas das barreiras do mundo concreto são suspensas, o grupo Banga atribui a si a tarefa de "levar o público numa viagem que pretende ser o mais sensorial e interativa possível."
O projeto consiste em uma série de exposições realizadas em meio virtual, onde, em cada mostra, é convidado um artista e um arquiteto – ou grupo –, que devem trabalhar conjuntamente na realização de um projeto que "reflita a simbiose" entre as obras de arte e o espaço expositivo. Restrito a artistas angolanos ou que desenvolvem trabalhos em Angola, o projeto abre espaço tanto àqueles com obras já consolidadas como àqueles em início de carreira. "Esta dinâmica, entre artistas renomados e amadores, é uma questão importante, pois acreditamos que esta interação e partilha de ideias é fundamental para fomentar a vida artística do país, consolidando esta comunidade", explica o grupo.
Da parte dos arquitetos, cabe a responsabilidade de "captar a essência do artista com o qual irá trabalhar" e, ao mesmo tempo, "levar ao extremo a arquitetura angolana". Incumbidos de projetar um espaço que receba as obras de arte e ofereça uma experiência virtual consistente ao visitante, os arquitetos convidados têm, na realidade, a oportunidade de concretizar virtualmente suas visões e desejos – e devem fazê-lo com pensamento crítico e postura profissional, afirma o grupo.
Arquitetura virtual: uma alternativa
A exposição inaugural Cokwe: A Terra como Tela tem como convidados os artistas do próprio grupo Banga, que tem com um de seus objetos de investigação as pinturas desenvolvidas pelo povo cokwe. A mostra virtual contou com vídeos, fotografias e desenhos em azulejo inspirados na herança cultural dos cokwe.
Para receber a mostra, a arquiteta Yolana Lemos foi convidada a projetar um pavilhão que dialogasse com as obras expostas e, também, fosse uma atração em si. Inspirada na vernacular cabana rural angolana, caracterizada pelas paredes de adobe e cobertura de palha, a resposta de Lemos tem a complicada tarefa de oferecer em meio virtual uma experiência sensorial real, essencialmente atrelada às obras de arte expostas.
Pixels e bits informam paredes de adobe, troncos de madeira e telhado de palha. É assim que se concretiza uma instigante e novíssima faceta da arquitetura contemporânea angolana. Como afirma o grupo Banga, este projeto "é uma porta aberta para mostrar que a classe arquitetônica no país está mais viva do que nunca, e pronta para assumir as responsabilidades que esperam".
Para visitar a exposição Cokwe: A Terra como Tela é preciso retirar o ingresso online gratuitamente. Acesse a página da Cabana de Arte e acompanhe as próximas exposições.