A escola de arquitetura é, acima de tudo, um território de experimentação e descobertas, um lugar onde futuros profissionais começam a desenvolver suas principais ideias e a pavimentar o seu próprio caminho. Ao longo de seus anos de estudo, os futuros arquitetos e arquitetas aprendem a lidar com problemas e assuntos complexos, a confrontar-se com os principais desafios da vida profissional. Isso significa que é neste momento que os alunos começam a construir sua própria identidade como arquitetos, a cristalizar seus próprios valores e a desenhar o rumo que a sua carreira irá tomar. Neste artigo nos perguntamos como o aprendizado e as experiências vividas dentro da universidade se refletem na carreira de um arquiteto? Fazendo uma viagem no tempo, visitamos o passado de alguns importantes nomes da arquitetura contemporânea para melhor entender como se deu a sua transição da escola para a prática, verificando as reverberações de sua formação em seus primeiros projetos profissionais e no futuro desenvolvimento de suas carreiras.
Com o passar dos anos e as inevitáveis mudanças no contexto sócio-econômico de um país ou continente, as oportunidades profissionais disponíveis para jovens arquitetos também mudam de figura. Foi Natalie de Vries quem disse que “este é um momento muito complicado para arquitetos recém formados, um contexto econômico pouco favorável para iniciar uma carreira profissional como arquiteto. Agora, antes mesmo de sair da universidade, é preciso pensar muito sobre qual caminho tomar—antigamente a gente simplesmente mergulhava naquilo que estava afim de fazer.” Alguns dos mais importantes nomes da arquitetura do século XX saíram da escola em uma situação bastante privilegiada, assinando contratos importantes e recebendo enormes comissões antes mesmo de estabelecer uma carreira, como é o caso de Alison e Peter Smithson. Por outro lado, Zaha Hadid levou mais de dez anos para emplacar seu primeiro projeto. Hoje, é difícil dizer se as novas tecnologias e ferramentas de comunicação disponíveis estão ajudando ou atrapalhando os jovens arquitetos a encontrarem seus caminhos. Ainda assim, basta uma rápida visita à uma escola de arquitetura para descobrirmos quais são as principais preocupações que definirão o futuro daqueles profissionais. É no ambiente acadêmico que eles começam a desenvolver suas aproprias bordagens e métodos e portanto, vale a pena darmos uma olhada com carinho no percurso de alguns importantes nomes da arquitetura e como suas preocupações iniciais se desdobraram ao longo de sua carreira profissional.
O trabalho de conclusão de curso desenvolvido pelo arquiteto Charles Correa em 1955, é um ótimo exemplo de uma carreira inteiramente dedicada à pesquisa de um mesmo tema. Foi na escola de arquitetura, mais especificamente no MIT, que Charles Correa começou a se debruçar sobre os processos participativos que constroem uma cidade. Em seu trabalho final de curso ele utilizou uma série de animações para apresentar uma estrutura urbana capaz de melhorar as condições de vida nas cidades através de uma abordagem de baixo para cima. Posteriormente, quase uma década depois, Correa desenvolveu o projeto de um plano alternativo de desenvolvimento urbano para a cidade de Mumbai. A proposta que viria a ser conhecida como Navi Mumbai, foi então aprovada pelo governo local poucos anos depois e Correa foi contratado como arquiteto-chefe para o desenvolvimento e realização do projeto. Ao longo de sua carreira, Charles Correa ficou conhecido como um ativista fervoroso, um arquiteto que sempre esteve engajado com movimentos sociais e de luta por moradia digna e direito à cidade. Além disso, ele criou uma fundação homônima—a Charles Correa Foundation— com o principal objetivo de promover e financiar projetos humanitários na Índia.
Os anos por volta de 1968 marcaram um dos períodos mais turbulentos na história do mundo ocidental. Este momento também ficou conhecido por uma transformação no campo profissional da arquitetura. Em 1972, ao concluir seus estudos na Arquitecture Association de Londres, Rem Koolhaas publicou Exodus, or The Voluntary Prisoners of Architecture, o primeiro projeto desenvolvido pelo grupo que viria a fundar o OMA, ou seja, Elia Zenghelis, Madelon Vriesendorp e Zoe Zenghelis. A publicação de Exodus é um indicativo da dimensão que o OMA viria a tomar no futuro, algo que estava destinado a ser muito mais do que um simples escritório de arquitetura. Foi ainda em seu período como aluno da AA que Koolhaas entrou em contato por primeira vez com a obra de Mathias Ungers e do arquiteto construtivista russo Ivan Leonidov, personagens que mais tarde teriam uma influência significativa em sua carreira profissional como arquiteto. O OMA foi fundado formalmente em 1975 e, em 1978, apenas cinco anos depois de se formar, Rem Koolhaas publicou seu famoso livro Nova Iorque Delirante, que muitos críticos consideram uma das principais obras de arquitetura da segunda metade do século XX. Foi também em 1978 que o OMA apresentou sua proposta para o projeto de expansão do Parlamento holandês, e embora não tenha sido construída, ela marca o início de uma monumental carreira de sucesso.
Olhando para as figuras que emergiram no cenário da arquitetura a partir dos anos 2000, Ma Yansong é um dos primeiros nomes que nos vem à mente. Como um dos grandes personagens da arquitetura chinesa contemporânea, ele começou sua formação como arquiteto no Instituto de Engenharia Civil e Arquitetura de Pequim e posteriormente recebeu o título de Mestre em Arquitetura pela Universidade de Yale, tendo como orientadora ninguém menos que Zaha Hadid, com quem ele trabalhou até 2004 quando decidiu fundar seu próprio escritório: o MAD Architects. Dois anos depois, em 2006, Ma Yansong recebeu o Prêmio da Architectural League para Jovens Arquitetos da Cidade de Nova Iorque. Naquele mesmo ano, o MAD completou o projeto das famosas Absolute Towers, em Mississauga, Canadá.
Ao longo dos últimos anos, alguns jovens arquitetos e arquitetas assumiram a responsabilidade de promover uma mudança de paradigma no que diz respeito ao papel da tecnologia nos processos de projeto. O escritório de arquitetura Space Popular, fundado em 2013 por Fredrik Hellberg e Lara Lesmes, é uma prática experimental que explora os limites entre os âmbitos físicos e digitais na arquitetura. A jovem dupla, assim como Koolhaas o fez nos anos 60 e 70, frequentou a Architectural Association de Londres, onde entraram em contato com a obra do arquiteto alemão Gottfried Semper, uma importante figura da arquitetura do século XIX que viria a influenciar fortemente a obra do Space Popular. A estética que caracteriza as obras do escritório já se fazia muito evidente no projeto de conclusão de curso desenvolvido por Fredrik Hellberg. Desde então, o estúdio de Hellberg e Lesmes se dedica a desenvolver projetos entre a realidade e o ficcional—entre o físico e o digital.
Por outro lado, o jovem arquiteto Stanislas Chaillou se dedica à uma arquitetura que nasce de uma fusão entre tecnologia e Inteligência Artificial. Em um de seus projetos desenvolvidos ainda como estudante de arquitetura em Harvard, Metabolism(S): Flexibility in the Century, Chaillou fez uma avaliação de como a tecnologia pode promover a flexibilidade espacial a partir de um estudo dos padrões de comportamento das pessoas. O trabalho de pesquisa desenvolvido por Chaillou em Harvard investiga o potencial da IA na organização do espaço, criando um sistema capaz de gerar inúmeras variações de uma mesma planta, uma ferramentas que poderá ser muito útil para os arquitetos no futuro. Sem dúvida, será interessante acompanhar os desdobramentos da prática profissional de Chaillou como arquiteto ao longo dos próximos anos.
Esses diversos exemplos mostram a transição complicada, porém emocionante, da vida de um estudante de arquitetura para o campo profissional e como esses primeiros anos podem ser fundamentais para definir os futuros desdobramentos de sua carreira como arquiteto, à medida que os temas vão sendo elaborados e aprofundados com o passar dos anos.
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