Ao longo do século XX, Miami Beach passou por inúmeras e profundas transformações, desde seu importante papel durante os anos dourados na virada do século, passando a ser conhecida como a capital americana do Art Déco até se transformar em um dos principais destinos de luxo da metade do século—para logo depois cair no esquecimento durante os anos 1970. Depois de quase uma década de abandono e decadência, pouco a pouco esta pequena cidade-distrito de Miami começou a despertar o interesse da comunidade de preservacionistas em meados dos anos 1980. Na década de 1990, Miami Beach ressurge como uma fênix para então se tornar novamente um dos destinos mais procurados dos Estados Unidos, atraindo novos ilustres residentes e personagens famosos como Gianni Versace entre outros.
Entretanto, apesar de suas várias metamorfoses, há algo que Miami Beach nunca perdeu e tampouco perderia mesmo que quisesse: o fato de ser uma ilha-barreira. “Uma ilha-barreira é formada por uma faixa arenosa, a qual é responsável por proteger a baía. Acontece que este tipo de formação, como um mecanismo de defesa, não pode ser protegida—não há dique ou parede que possa conter a sua natural derrocada”, disse Allan Shulman, FAIA, diretor fundador da Shulman + Associates e professor diretor do programa de pós-graduação em Arquitetura da Universidade de Miami.
“Ilhas-barreira são elementos dinâmicos da paisagem natural”, disse Susannah C. Drake, membro da Sociedade Americana de Arquitetos Paisagistas (ASLA) e do Instituto de Arquitetos dos Estados Unidos (AIA), professora associada do programa de design ambiental da Universidade de Colorado e diretora fundadora do dlandstudio. “Está na natureza destas ilhas se moverem e se transformarem ao longo do tempo, isso porque elas encontram-se enraizadas sobre uma espécie de fundação esponjosa à base de calcário. Uma situação como esta faz da salvaguarda de uma ilha-barreira algo extremamente desafiador.”
Tentando minimizar o impacto do inevitável aumento dos níveis das marés, Shulman apresentou um estudo de soluções possíveis para preservar alguns dos mais importantes edifícios em uma possível situação de inundação, incluindo a elevação das estruturas dos edifícios assim como a construção de “edifícios dentro de edifícios”, o que permitiria proteger o conteúdo dentro de uma espécie de concha. “Acontece que, esta camada de resiliência que estamos propondo para Miami Beach, na maioria dos casos, se choca de frente com os interesses do instituto de preservação histórica do município”, continuou Shulman. “Nós, por outro lado, reconhecemos que deveremos fazer algumas concessões, deveremos desafiar as nossas antigas convenções.”
Infelizmente, estas convenções são ferrenhamente defendidas pela arquiteta chefe do instituto de preservação histórica de Miami Beach, Deborah Tackett, que ainda assim concorda que a preservação da ilha vai muito além da mera salvaguarda de seus edifícios históricos apenas.
“Miami Beach sempre foi uma cidade aberta às mudanças e ideias inovadoras”, disse ela. “A urgente condição de nossa cidade deverá pressionar os empresários e residentes a assumir a responsabilidade por suas próprias propriedades, nós já dedicamos muito de nosso tempo buscando encontrar soluções que vão muito além da preservação das infraestruturas públicas.”
E ela continua: “Nossa cidade é mundialmente famosa por sua beleza—pela beleza de sua paisagem natural, o encanto de sua arquitetura e a alegria de seu povo. Devemos encarar o desafio de construir uma cidade mais resiliente como uma oportunidade para atrair ainda mais pessoas.”
Susannah C. Drake resumiu: “Precisamos encontra novas formas de conviver com os ciclos das águas, afinal, moramos numa ilha. Devemos entender melhor como funcionam os fluxos naturais das marés e como podemos encontrar uma solução que nos permita flutuar com eles. De forma geral, é urgente que sejamos mais conscientes sobre nossa relação com o ambiente natural.”
Tackett concordou: “E não fazer nada não está entre as nossas opções.”
A série de debates Think Tank foi realizada entre os dias 1, 8 e 15 de outubro de 2020. O evento foi desenvolvido em parceria entre a Material Bank, o GROHE e a Durkan.
Este artigo foi publicado originalmente em Metropolismag.com