A ventilação natural não é a solução mais eficiente em todos os casos

A ventilação serve a duas finalidades principais em um espaço: em primeiro lugar, retirar os poluentes presentes e fornecer ar limpo. A segunda é atender às necessidades metabólicas dos ocupantes, proporcionando temperaturas agradáveis aos espaços, se o clima permitir. É sabido que ambientes com ventilação inadequada podem trazer sérios malefícios à saúde dos ocupantes e, principalmente em climas quentes, desconforto térmico. Um estudo da Universidade de Harvard mostrou que em edifícios com boa ventilação e melhor qualidade do ar (com menores taxas de dióxido de carbono), os ocupantes apresentam melhores desempenhos das funções cognitivas, respostas mais rápidas a situações extremas e melhor raciocínio em atividades estratégicas.

Não é difícil perceber que a ventilação desempenha papel vital na garantia de uma boa adequada do ar e no conforto térmico em edifícios. Todos já sentimos isso. Mas quando falamos de ventilação, sempre nos vêm à mente uma brisa leve da janela, balançando o nosso cabelo, com um aroma agradável e uma temperatura que nos traz conforto. Em climas amenos, isso pode até ser uma realidade na maioria dos dias do ano. Em climas severos ou locais poluídos isso é bem diferente.

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Gimnasio de la Escuela secundaria Blaise Pascal / Koffi & Diabaté Architectes. Image © François-Xavier Gbré

O ar deve entrar e sair por aberturas como janelas, portas, chaminés solares ou torres eólicas. A eficiência da ventilação dependerá do clima local, da geometria do edifício e até mesmo do comportamento humano (o ato de abrir ou fechar uma janela afetará a ventilação do ambiente). A ventilação natural é uma estratégia passiva que se utiliza dos ventos (ventilação cruzada) e das diferenças de densidade e temperatura do ar (efeito chaminé) para fazer circular o ar nos interiores. Quando bem projetadas e em climas mais amenos, pode ser uma solução excelente. João Filgueiras Lima, o Lelé, através de um conhecimento técnico apurado, desenvolveu soluções de ventilação passiva para os hospitais da Rede SARAH pelo Brasil (em geral, as cidades apresentam climas quentes) reduzindo significativamente os custos de manutenção e, inclusive, as taxas de infecção de bactérias de seus pacientes.

Mas projetar uma boa ventilação não é tarefa tão simples, principalmente quando o edifício ainda não foi ocupado e suas particularidades não são bem conhecidas. Há fontes de calor e de poluição internas e externas, além de barreiras físicas, ventos predominantes no local e outros elementos inesperados que podem surgir com a ocupação do mesmo. Soluções passivas devem ser sempre privilegiadas quando possível, por reduzirem o consumo de energia na edificação, os custos de construção, manutenção e, principalmente, por funcionarem praticamente sozinhas.

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Hospital Sarah Kubitschek Salvador / João Filgueiras Lima (Lelé). Image © Nelson Kon

Em projetos pequenos, a preocupação por falta de controle e possíveis dias  com desconforto pode até ser reduzida, já que pequenas modificações podem ser feitas para melhorar o conforto térmico e a ventilação dos ambientes. Em projetos de grande escala, como aeroportos, hospitais, edifícios de escritório, entre outros, depender somente da ventilação natural é, quase sempre, inviável. Quando dependemos integralmente das condicionantes naturais, é muito complicado ter o controle total sobre a taxa de ventilação na edificação, podendo levar a problemas de qualidade do ar interno, perda ou ganhos excessivos de calor e consequentes desperdícios de energia. Há diversos outros fatores que podem pesar na decisão de incluir dispositivos de ventilação mecânica no projeto:

  • O clima é muito severo;
  • O ar externo não possui boa qualidade;
  • Há muito ruído no exterior;
  • A geometria da edificação ou mesmo a influência dos edifícios vizinhos não possibilitam que todos os ambientes recebam ventilação;
  • As atividades realizadas no interior não permitem que as janelas e portas permaneçam abertas, ou que haja trocas de ar entre os ambientes.

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Passenger Terminal Complex Suvarnabhumi Airport / Jahn. Image © Rainer Viertlboeck

Muitas das deficiências da ventilação natural podem ser superadas pela ventilação mecânica. Seu uso pode proporcionar maior controle do sistema e pode, inclusive, complementar ou regular o fluxo naturalmente conduzido. Ou seja, é possível que a ventilação mecânica potencialize e torne mais eficiente a ventilação passiva. Tais sistemas são capazes de fornecer uma taxa controlada de troca de ar e responder às diferentes necessidades dos ocupantes e das cargas poluentes existentes no espaço, independentemente das variações climáticas. Tal qual os sistemas passivos, o tipo de ventilação mecânica dependerá do clima e das atividades realizadas no interior da edificação. Climas quentes e secos receberão soluções muito distintas de locais de clima frio, por exemplo, para que o sistema tenha uma boa eficiência energética. Tratando-se de um assunto extremamente complexo, os sistemas de ventilação mecânica devem sempre ser conduzidos por profissionais especializados, para conseguir avaliar e dimensionar o sistema de ventilação de forma mais eficiente.

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Casa en Himeji / FujiwaraMuro Architects. Image © Katsuya. Taira
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Oficina para Communique Marketing Solutions / groupDCA. Image © Andre J. Fanthome

Segundo Martin W Liddament, no livro A Guide to Energy Efficient Ventilation [1], “Muitos sistemas operam no modo de 'mistura' para diluir os poluentes, enquanto outros operam no modo de 'deslocamento' para remover os poluentes sem misturar. Alguns sistemas incorporam técnicas de recuperação de calor do ar de exaustão para reduzir a perda de calor da ventilação. Sistemas bem projetados instalados em edifícios de boa qualidade não podem ser afetados pelas forças motrizes climáticas. Os benefícios devem ser equilibrados em relação aos custos operacionais e de capital, às necessidades de manutenção contínua e eventual substituição. Frequentemente, é esse equilíbrio entre custo e benefício de desempenho que dita a abordagem da ventilação. Os sistemas mecânicos precisam ser projetados para atender às necessidades específicas do edifício em que vai operar. Uma filosofia de design integrada garante um desempenho ideal combinado com a máxima eficiência energética.”

Ainda que sejam sistemas que necessitarão algum aporte de energia elétrica, é sempre possível melhorar a sua eficiência e reduzir o impacto ambiental dos materiais utilizados. De maneira geral, o ar é conduzido por dutos, tradicionalmente tubos de seção retangular metálicos com isolamentos térmicos. CLIMAVER®, por exemplo, é um duto autoportante para sistemas de ar condicionado, ventilação e aquecimento. Ele foi concebido para oferecer bom desempenho térmico, acústica, segurança contra incêndios e elevado nível de estanqueidade, tornando o sistema energeticamente eficiente, reduzindo os níveis de ruído gerados por ventiladores e unidades de ar condicionado. O principal diferencial é que o sistema chega à obra em chapas leves, que são devidamente dobrados nas seções desejadas para cada duto e presas ao teto através de instalações muito simples. Isso torna o transporte mais simples e o sistema mais barato. Fabricado com até 80% de lã de vidro reciclada, também reduz a necessidade de areia extraída das pedreiras e ajuda a proteger a biodiversidade. Para se ter uma base de cálculo, o uso de 1000 m2 do produto, no lugar dos tradicionais dutos metálicos isolados economizam o equivalente a mais de 3 toneladas de aço para instalar, isolar e desmontar.

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Pabellón polideportivo de Villacelama / QUIRÓS PRESA. Image © Imagen Subliminal

Uma vez que passamos cerca de 90% do nosso tempo em ambientes fechados, pensar na qualidade do ar é, também, vital. Os poluentes mais encontrados nos ambientes de trabalho e moradia são os chamados VOCs (da sigla em inglês para "compostos orgânicos voláteis"). Eles são naturalmente emitidos por pessoas, animais de estimação, produtos de limpeza, bem como móveis, tapetes, tintas e vernizes. Após longos períodos em ambientes fechados as pessoas costumam reclamar de sintomas como dores de cabeça, náuseas, falta de concentração, irritação nos olhos, fadiga e mesmo problemas respiratórios.

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Instituto Biodesign C de la Universidad Estatal de Arizona / ZGF Architects. Image © Nick Merrick © Hall+Merrick
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Holland Boulevard y Rijksmuseum Schiphol / NEXT architects. Image © Thijs Wolzak

Há produtos que podem contribuir, junto à ventilação natural ou mecânica, para melhorar a qualidade interna do ar. Activ'Air ® foi projetada especificamente para decompor as emissões de formaldeído em compostos inertes não prejudiciais, eliminando assim o risco de reemissão. A tecnologia é incorporada de placas de gesso a forros acústicos, e diversos testes em escolas e hospitais mostraram que ela reduz significativamente a concentração de formaldeído, melhorando a qualidade do ar interno e reduzindo as chances de mal estar por parte dos ocupantes.

O conforto interno é complexo e em conjunto com a ventilação natural ou mecânica, é possível incorporar outros sistemas e produtos que podem contribuir para a melhoria da qualidade do ar interno. Ao mesmo tempo que o ar condicionado proporcionou diversas inovações e novas possibilidades à arquitetura, também tornou os projetistas mal acostumados em muitos casos. A ideia de que qualquer edifício poderia ter uma climatização adequada, mesmo que em quaisquer soluções de materiais, formas e exposições solares, contribuiu muito para a crise energética que o mundo tem passado. De fato, sabe-se que uma parcela significativa dos custos de manutenção de um edifício são gastos nisso. Mas, em si, os sistemas de ar condicionado não são os vilões. O grande problema é quando eles são utilizados indiscriminadamente, sem ao menos considerar soluções passivas complementares ou estratégias projetuais que poderiam mitigar muitos dos problemas. Em contextos desafiadores, ou ambientes que exigem controle rígido das condições climáticas, depender exclusivamente da ventilação natural é praticamente inviável. Neste sentido, desenvolver um projeto em que as equipes de projeto e os especialistas em instalação em HVAC estejam bem entrosados é imprescindível para atingir resultados sustentáveis, boa qualidade do ar interno e conforto térmico aos ocupantes das edificações.

Nota
[1] Liddament, Martin W. A Guide to Energy Efficient Ventilation. 1996. Disponível neste link.

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Sobre este autor
Cita: Eduardo Souza. "A ventilação natural não é a solução mais eficiente em todos os casos" 04 Mai 2021. ArchDaily Brasil. Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/958359/a-ventilacao-natural-nao-e-a-solucao-mais-eficiente-em-todos-os-casos> ISSN 0719-8906

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