Encontradas pelos quatro cantos do mundo e construídas pelos mais diferentes motivos, da extração de recursos naturais à fabricação de um determinado produto, as monotowns são cidades criadas ao redor de uma única indústria a qual é responsável por empregar a maioria de seus habitantes. No antigo Bloco de Leste, onde uma série de cidades mono-industriais foram construídas durante o domínio soviético, a súbita transição para um novo sistema econômico centrado no capitalismo abalou profundamente a estrutura destas cidades, dando início a um rápido processos de despovoamento e migração para outras regiões do país e do mundo. A seguir descubra mais sobre a arquitetura das monotowns da era soviética, seus exemplos mais famosos, as histórias de fracassos e o atual estado destes ambientes urbanos extremamente peculiares.
A economia do Bloco de Leste operava de forma centralizada e era regulamentada pelos chamados planos quinquenais, os quais determinavam quais atividades produtivas deveriam ser realizadas em uma região ou cidade além de estabelecer as cotas de produção anuais a serem batidas. Além disso, o regime tinha total controle sobre os postos de emprego disponíveis assim como da possibilidade de relocação de profissionais em todo território ocupado; portanto, a construção de novas cidades para cumprir um determinado fim não era de fato um problema, era a solução. As restrições econômicas e políticas, assim como aquelas impostas à livre circulação de bens e pessoas em todo território soviético, obrigavam os países da antiga União Soviética a produzir a grande maioria dos bens localmente. Após a queda da Cortina de Ferro, por consequência, a transição para um modelo econômico de caráter mais liberal assim como o aumento considerável das importações tiveram efeitos catastróficos para a maioria das cidades mono-industriais. Muitas delas foram rapidamente privatizadas, algumas atividades tornaram-se obsoletas e outras não podiam mais competir em uma zona de livre comércio. Ao longo das primeiras décadas do século 21, estas paisagens monotonamente industriais entraram em um vertiginoso processo de declínio, forçando milhões de pessoas a migrarem para outras cidades, países e regiões do planeta.
Em sua última publicação, intitulada Monotowns: Paisagens Soviéticas da Rússia Pós-Industrial, a Zupagraphika nos apresenta um amplo panorama ricamente ilustrado das cidades mono-industriais da antiga União Soviética, lançando uma nova luz sobre essa tipologia de cidade ainda pouco explorada e até certo ponto desconhecida pela maioria dos arquitetos e arquitetas do chamado mundo ocidental. De assentamentos urbanos prósperos, estas cidades que pontuam o território russo da Sibéria aos confins com a Europa, tornaram-se paisagens em completo estado de ruína e abandono. Pensando nisso, a mais nova publicação lançada pela Zupagraphika nos apresenta um quadro bastante abrangente da arquitetura e do atual estado destas cidades mono-industriais. A publicação é uma continuação dos fotolivros Concrete Siberia e Eastern Blocks lançados anteriormente pelo estúdio de design polonês. Neste novo volume, você poderá descobrir a arquitetura da paisagem pós-industrial soviética das cidades de Vorkuta, Mirny, Norilsk, Kirovsk, Tolyatti, Cherepovets, Magnitogorsk, Monchegorsk e Nikel—mais uma vez através das lentes do fotógrafo russo Alexander Veryovkin.
A maioria das cidades mono-industriais soviéticas estão concentradas na Sibéria e na região dos Montes Urais, com um modelo de planejamento urbano composto por uma justaposição de áreas industriais e residenciais. Os condomínios habitacionais que povoam as monotowns soviéticas estavam compostos majoritariamente por blocos de apartamentos pré-fabricados dispostos de forma a criar pequenas super-quadras onde também se encontravam outros usos e serviços, como escolas, creches e instalações esportivas. Nestas cidades mono-industriais também era imperativo expressar o ethos da ideologia soviética através da arquitetura e da monumentalidade de seus edifícios públicos. Com o passar do tempo, a falta de diversidade de usos, de infraestrutura pública e outros serviços acentuaram ainda mais o rápido declínio dessas cidades. Neste sentido, muitas das monotowns estão pouco a pouco desaparecendo do mapa, outras conseguiram se manter vivas a duras penas e algumas poucas, tem procurado se reinventar.
Apesar de localizada em uma das regiões mais frias do planeta, a cidade mineradora de Vorkuta chegou a abrigar mais de 250.000 pessoas na década de 1980, marcando a presença e o poderio da União Soviética junto ao Polo Ártico. Quarenta anos depois, talvez a cidade de Vorkuta seja aquela que mais encolheu em toda a Rússia, contando atualmente com pouco menos de 60.000 habitantes. Após a queda da União Soviética, muitas das minas de carvão foram fechadas, forçando os trabalhadores a buscarem novas formas de ganhar a vida. Neste processo, aquelas cidades com condições climáticas mais hostis foram as que mais perderam moradores. As treze cidades satélite que formavam o antigo "Anel de Vorkuta" agora estão completamente abandonadas. Em uma região que facilmente chega a registrar -35 graus durante o inverno, estas estruturas abandonadas e cobertas de neve—ainda decoradas com propagandas comunistas e monumentos soviéticos—, marcam um forte contraste entre a antiga visão de prosperidade e a dura realidade dos dias de hoje.
Por outro lado, a monotown de Mirny, que abriga a segunda maior mina de diamantes do planeta, continuou operando normalmente após a queda da União Soviética, com a empresa responsável pela mineração na região investindo alto em infraestrutura pública, educação, serviços e amenidades. Nos últimos anos, no entanto, as reservas de diamantes começaram a minguar, e acredita-se que a atividade mineradora na região cesse daqui algumas poucas décadas. Neste sentido, com tempo para se planejar, a cidade de Mirny poderia seguir o exemplo de Cherepovets, uma antiga monotown de fabricação de aço que foi transformada em um novo centro de negócios ao longo dos últimos cinco anos, abrindo caminho para o re-desenvolvimento econômico de toda a região.
Não apenas na Rússia, mas em tantos outros lugares do mundo, as cidades mono-industriais estão lutando para sobreviver, algumas empregando várias estratégias para mitigar a migração e o processo de despovoamento. Em 2014, o governo russo pôs em ação um plano nacional para o re-desenvolvimento das monotowns através da diversificação econômica. Com as muitas incertezas que ainda giram em torno do futuro dessas monótonas cidades pós-industriais, elas representam o idealismo concreto de um passado em ruínas.
Zupagrafika é uma editora independente e estúdio de design fundado por David Navarro e Martyna Sobecka na cidade polonesa de Poznań. Apaixonados pela arquitetura modernista do pós-guerra, principalmente a arquitetura brutalista do leste europeu, a dupla se dedica ao estudo e documentação de um passado muitas vezes esquecido e até certo ponto, negligenciado. Sua extensa obra documental inclui Brutal Britain, Eastern Blocks, Concrete Siberia e Panelki.
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