Preparando as cidades para o pior cenário: os desafios urgentes das mudanças climáticas

O recente agravamento das mudanças climáticas e os decorrentes desastres naturais que cada dia mais frequentemente assolam o nosso planeta, juntamente com a contínua exploração predatória dos recursos naturais e os poucos esforços que têm sido feitos para diminuir a emissão de gases do efeito estufa, levantam uma preocupação crescente sobre o futuro da vida nas cidades. Para além de todos os esforços necessários para minimizarmos o agravamento das mudanças climáticas em curso, se faz iminente que comecemos a pensar e desenvolver estratégias que nos permitam preparar nossas cidades para os inevitáveis desafios que estão chegando, como aumento dos níveis das marés e das inundações por um lado, e a seca e o calor extremo de outro. Pensando nisso, o artigo a seguir nos convida a pensar e refletir como poderíamos construir cidades mais resilientes, permitindo que as mesmas se adaptem e se transformem em resposta aos desafios do futuro.

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A crise climática demanda uma ação imediata

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Linear park regenerates Mexico City's historic Grand Canal. Imagem © Onnis Luqu

Parece finalmente impossível negar que as mudanças climáticas estão de fato acontecendo, um situação que tem jogado cidades e governos contra as cordas em uma luta ainda muito desequilibrada. A alarmante notícia do recente agravamento das mudanças climáticas intensificou os debates sobre os impactos da crise climática no planejamento urbano e no futuro da vida nas cidades. De acordo com uma pesquisa de opinião recém publicada pelo Eurobarometro, 9 em cada 10 cidadãos europeus consideram as mudanças climáticas o problema mais grave que o mundo enfrenta atualmente. Os principais líderes mundiais também reconhecem a urgência desta ameaça. Em recente encontro, a cúpula dos sete países mais industrializados do planeta criou um fundo emergencial para ser utilizado em caso de desastres relacionados ao clima. Desde o fatídico acordo de Paris de 2015, mitigar as mudanças climáticas tem sido, pelo menos declarativamente, um objetivo comum em todo o mundo. Várias iniciativas, como a recém-adotada lei climática da UE que impõe uma meta de redução das emissões de CO2 para todos os seus países membros e o audacioso projeto norueguês que pretende enterrar o CO2 em jazidas de petróleo inutilizadas no fundo do Mar do Norte ou o recente investimento da cidade de Nova Iorque para o desenvolvimento de novas tecnologias de fixação de carbono, todas elas se concentram em desacelerar as mudanças climáticas e limitar o aquecimento global em 1,5 graus Celsius acima dos níveis pré-industriais.

Apesar disso, é preciso lembrar que as mudanças climáticas em curso estão se agravando a um ritmo cada vez mais acelerado. De acordo com um relatório da Organização Meteorológica Mundial, acredita-se que até o ano de 2025, já teremos excedido o limite de 1,5 grau no aumento da temperatura média global. Na semana passada, a Groenlândia registrou o terceiro maior evento de derretimento de gelo da última década. À medida que a superfície congelada do oceano continua a diminuir exponencialmente, as cidades costeiras se tornam cada dia mais vulneráveis ao aumento do nível dos mares. Paralelamente, países da Europa, da América do Norte e do Oriente Médio estão registrando temperaturas recordes ano após ano. Em 2020, os termômetros na Sibéria registraram temperaturas acima dos 38 graus Celsius pela primeira vez em séculos.

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Photo by Alejandro Luengo on Unsplash. Imagem Miami shoreline

Analisando este fenômeno, a conclusão que podemos tirar por hora é que as cidades já devem ir se preparando para o pior cenário possível. Em resposta a isso, o último relatório da McKinsey, desenvolvido em parceria com o Grupo C40 de Grandes Cidades para a Liderança Climática, delineia uma série de ações emergenciais e caminhos possíveis a se tomar. Este tipo de pesquisa destaca a importância de uma ação imediata, evidenciando de que forma nossas cidades podem assumir um papel ativo no combate à crise climática.

Preparando-se para o aumento dos níveis dos mares

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Qunli Stormwater Wetland Park in Chinaby Turenscape. Imagem Cortesia de Turenscape

O oceanógrafo John Englander, autor do livro Moving to Higher Ground: Rising Sea Level and the Path Forward, diz que ainda que seja possível frear o aquecimento global, os níveis dos mares vão continuar a subir, o que significa que impreterivelmente as nossas cidades precisarão lidar com isso. Existem várias maneiras de responder a esse inevitável desafio, com diversos recursos os quais arquitetos e planejadores podem utilizar quando projetando edifícios e cidades em áreas inundáveis, desde a construção de edifícios sobre estruturas elevadas ou a utilização de materiais resistentes à água. No que se refere ao planejamento urbano, várias cidades estão implementando obras de infraestrutura em grande escala, como barreiras de proteção e eclusas móveis. Existem ainda as estratégias mais focadas na preservação da natureza e do meio ambiente, envolvendo o reflorestamento de matas ciliares e a promoção da biodiversidade além da criação de áreas de preservação junto aos manguezais e pântanos, o que mitigaria o impacto das enchentes nas cidades.

O estado americano da Flórida já está tendo que lidar com as consequências das mudanças climáticas. A cidade de Miami revelou recentemente seu plano para combater o aumento do nível do mar, uma iniciativa que pretende promover a resiliência de suas áreas costeiras contra as recorrentes tempestades tropicais que passam pela região. Entre as medidas delineadas no plano da cidade para os próximos 40 anos estão a instalação de novas barreiras de contenção e eclusas, a criação e ampliação de ecossistemas de zonas úmidas, assim como a elevação de algumas regiões e construções existentes da cidade. A Holanda, como um país com mais de 25% de seu território abaixo do nível do mar, acumula uma vasta experiência em projetos de contenção e mitigação das consequências relativas ao aumento do nível dos mares e suas consequentes inundações, acumulando atualmente uma rede de 3.700 km de barragens e sistemas de contenção. Além disso, a cidade de Rotterdam adotou recentemente uma Estratégia de Adaptação às Mudanças Climáticas, a qual procura integrar sistemas de controle de enchentes nos processo de planejamento urbano—incluindo a criação de diversas praças públicas como elementos de retenção da água da chuva entre outras medidas. Na China, onde a maioria das grandes cidades sofre com fenômenos similares, as autoridades estão implementando diversas estratégias para a contenção de águas pluviais e fluviais. A intenção do governo chinês é ampliar a permeabilidade do solo das cidades em até um 80% para absorver ou reutilizar um 70% a mais das águas pluviais.

Combatendo as ondas de calor e a seca

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Bryggervangen and Sankt Kjeld’s Square in Copenhagen. Imagem © SLA

Ondas de calor prolongadas têm batido recordes nos últimos anos. Em resposta a isso, muitas cidades vêm desenvolvendo estratégias para combater o efeito das ilhas de calor. Em 2017, a cidade de Nova Iorque lançou um plano chamado de Cool Neighbourhoods, o qual propõe a plantação extensiva de novas árvores nas ruas, a substituição de superfícies impermeáveis por coberturas verdes permeáveis e a utilização de cores claras e reflexivas em coberturas e telhados existentes. Da forma similar, a cidade de Abu Dhabi lançou recentemente um concurso de arquitetura para o desenvolvimento de novas soluções para combater os efeitos das ilhas de calor urbanas através da criação de uma série de estações de resfriamento espalhadas pela cidade. No que se refere ao nosso próprio continente, em 2016 a cidade colombiana de Medellín lançou uma iniciativa chamada de Corredores Verdes—algo que finalmente resultou na redução da temperatura média da cidade em até 2 graus Celsius.

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The Oasys by Mask Architects. Imagem Cortesia de Genc Design Studio

A vulnerabilidade das cidades às altas temperaturas e períodos prolongados de seca está aumentando ao redor do mundo. Em resposta a isso governos têm utilizado desde ações imediatas até medidas a longo prazo, como restrições na distribuição de água potável assim como o investimento em novas tecnologias para a dessalinização da água do mar. Após a severa seca de 2018, a Cidade do Cabo conseguiu reduzir seu consumo global de água em 38% através da implementação de programas de conscientização da população. Outras medidas para combater as secas e a escassez de água são as tecnologias de monitoramento que regulam o consumo de água nas cidades e a mudança de cultivos hidropônicos para culturas mais resistentes à seca em áreas rurais. Além disso, as cidades também podem implementar estratégias mais abrangentes em quanto se refere a gestão dos ciclos das águas, que levem em consideração não apenas a água potável, mas principalmente as águas pluviais e residuais.

Dito isso, arquitetos e planejadores devem ser conscientes da importância de seu papel no combate às mudanças climáticas; entretanto, na prática, não parece que a nossa profissão esteja 100% comprometida ou engajada nesta luta. Talvez o maior desafio da história da humanidade, a crise climática demanda um esforço coletivo no qual arquitetos e urbanistas devem assumir com urgência uma posição crítica e de liderança, encabeçando os esforços em busca de um futuro melhor para todos nós.

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Sobre este autor
Cita: Cutieru, Andreea. "Preparando as cidades para o pior cenário: os desafios urgentes das mudanças climáticas" [Future-Proofing Cities Against Climate Change] 28 Ago 2021. ArchDaily Brasil. (Trad. Libardoni, Vinicius) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/966273/preparando-as-cidades-para-o-pior-cenario-os-desafios-urgentes-das-mudancas-climaticas> ISSN 0719-8906

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