Em exibição no Center for Architecture na cidade de Nova Iorque, a exposição intitulada Cairo Modern apresenta uma lista de 20 projetos de arquitetura moderna realizados, nunca construídos e também demolidos no Cairo, lançando um alerta sobre o futuro incerto do legado modernista no Egito.
Cairo Modern, a mais nova exposição organizada pelo Center for Architecture de Nova Iorque, apresenta 20 importantes projetos de arquitetura moderna realizados no Cairo entre 1930 e 1970, entre os quais projetos nunca construídos e também outros que já não existem mais—destacando a crescente ameaça ao patrimônio moderno construído no Egito e em outros países.
A exposição Cairo Modern foi concebida pelo curador egípcio independente radicado em Alexandria e atualmente residente na Cidade do México, Mohamed Elshahed, autor do celebrado livro Cairo Since 1900: An Architectural Guide, um extensivo inventário sobre a arquitetura moderna em Cairo, o qual apresenta mais de 200 obras construídas na cidade desde o início do século passado. Publicado pela editora da American University de Cairo na primavera de 2020, o livro serviu como base para o projeto curatorial da exposição inaugurada recentemente no Center for Architecture de Nova Iorque, a qual estava planejada para março de 2020 mas teve que ser adiada por causa da pandemia. Finalmente aberta ao público no mês passado, a exposição poderá ser visitada até próximo dia 22 de janeiro.
“[É] como se a candura destes edifícios estivesse de alguma forma buscando corresponder à brancura da cor da pele dos próprios arquitetos que os construíam, como algo completamente alheio a tudo o que estava acontecendo no país fora deste restrito circulo de amigos arquitetos.” -- Mohamed Elshahed, curador.
Embora seja mais conhecida por suas pirâmides e minaretes, Cairo é também uma cidade de muitos edifícios modernos e de variados estilos arquitetônicos, do expressionismo ao revivalismo da virada do século XX—reflexo da aspiração burguesa que tomou conta do país após a Revolução de 1919. Os 20 projetos apresentados na exposição Cairo Modern vão desde edifícios residenciais a administrativos concebidos por alguns dos mais renomados arquitetos egípcios, incluindo Sayed Karim, Charles Ayrout e Mahmoud Riad. A exposição também apresenta o projeto não realizado para o pavilhão egípcio na Feira Mundial de Nova Iorque de 1939; e uma linha do tempo com os mais importantes eventos políticos, culturais e arquitetônicos que tiveram lugar no Egito e no mundo—ilustrados pelas mais icônicas capas da Revista Al Emara publicadas entre 1939 e 1959. Considerada a primeira revista de arquitetura contemporânea publicada em árabe, a Al Emara é considerada ainda hoje uma das principais fontes de informação sobre a produção arquitetônica moderna no Egito.
Em entrevista pra a Metropolis Magazine, Elshahed disse que a herança moderna no Egito tem sido ameaçada em muitas frentes ao longo das últimas décadas, principalmente por ter se tornado um símbolo da “racialização do modernismo como uma arquitetura branca, como se a candura destes edifícios estivesse de alguma forma buscando corresponder à brancura da cor da pele dos próprios arquitetos que os construíam, como algo completamente alheio a tudo o que estava acontecendo no país fora deste restrito circulo de amigos arquitetos.”
De acordo com Elshahed, edifícios modernistas começaram a ser demolidos no Cairo ao longo da década de 1970, “um fenômeno que agravou-se consideravelmente na década de 1990 e monstruosamente após a virada do século. Os arquitetos que se opunham à esse movimento acabaram sendo excluídos da vida profissional ... como um efeito colateral da ditadura. Neste sentido, a derrocada do patrimônio moderno no país têm se agravado continuamente desde os tempos de Sadat.”
Mohamed Elshahed também está engajado com alguns de seus colegas na tentativa de incluir o Egito na lista da Docomomo Internacional, uma inciativa até agora sem sucesso.
Após graduar-se pela Faculdade de Arquitetura e Design do Instituto de Tecnologia de Nova Jersey, Elshahed obteve seu diploma de mestrado pelo Programa Aga Khan para Arquitetura Islâmica do MIT e seu Ph.D. pelo Departamento de Estudos do Oriente Médio da NYU. Além disso ele foi curador do Projeto Modern Egypt do British Museum e do pavilhão do Egito, Modernist Indignation, construído na ocasião da Bienal de Design de Londres de 2018. Em 2019, a Apollo Magazine nomeou-o entre os 40 pensadores e artistas mais influentes com menos de 40 anos no Oriente Médio.
O projeto expositivo de Cairo Modern foi concebido pelo arquiteto da Skidmore, Owings and Merrill de Nova Iorque, Rami Abu-Khalil, em parceira com o designer gráfico de Cairo, Ahmed Hammoud, também responsável pela diagramação do livro anteriormente mencionado de Mohamed Elshahed.
Este artigo foi publicado originalmente pela Metropolis Magazine.