Para um designer ou arquiteto, o feio não tem sido historicamente algo pelo qual se esforçar. No entanto, culturalmente, estamos cada vez mais cansados da perfeição.
Depois de anos de projetos se comportando de maneiras igualmente simples e ordeiras, especialmente no século XX com o racionalismo e a pureza do modernismo, ansiamos por expressões que sejam menos higiênicas e, ao mesmo tempo, mais humanas.
Quando os profissionais criativos tem a possibilidade de eliminar os princípios antiquados que alinham “bom” com “belo”, eles têm a liberdade de fazer um trabalho infinitamente mais criativo. E ao fazer isso, é mais interessante – e mais inclusivo.
O design que desestabiliza “regras” herdadas em torno do feio e do belo, reescreve o que é visto como aceitável. Ele progride a cultura visual ao celebrar a diversão e forjar a intimidade ao enfatizar as limitações da perfeição. Isso ajuda sutilmente a todos, de marcas a designers e consumidores, a se comunicarem com mais honestidade.
Nesse artigo já falamos sobre como o processo de colonização “limpou” a expressão estética de povos e culturas, impondo referenciais europeus para edifícios e elementos gráficos de povos originários.
A ideia de feio
A ideia de feio como uma forma de quebra de regras pode ser rastreada mais para trás no tempo até a linguagem do design do punk em meados de 1970, que ecoou de forma semelhante movimentos artísticos como o Dadaísmo em seu uso de formas de letras e imagens reapropriadas e imagens.
Evitar a tipografia formal em favor de um aceno liderado por colagem, o design punk – como a música punk – foi uma rebelião visceral contra o sistema. Foram-se as restrições formais do design de bom gosto, como o modernismo ou o estilo internacional suíço. As vozes dos jovens desprivilegiados estavam sendo elevadas por meio de tais formatos de letras, e suas críticas ao establishment politicamente se espelhavam em suas críticas à estética elegante e educada.
O fato de a linguagem visual do punk ainda ser vista como um símbolo de desafio e de uma criatividade nascida da frustração com o sistema- mais de 40 anos depois – é uma prova do poder do “feio” na formação da cultura.
Quando um pequeno grupo de pessoas que se considera acima decide o que é mais importante ou belo e não leva em conta o resto da história, tudo que foge dessa visão tende a ser tachado como exótico ou artesanal.
Belo é ser vulnerável
Hoje, as marcas e projetos que rejeitam os padrões de beleza e abraçam uma certa quantidade de estética espalhafatosa ou “não filtrada” são elogiadas por sua autenticidade e ousadia. Cada vez mais, as pessoas rejeitam o minimalismo que definiu a última década, buscando um sentimento mais íntimo que valoriza o realismo e celebra as falhas.
Vejam o exemplo do Centro Cívico Britânico criado pelo arquiteto Adam Nathaniel Furman: Os edifícios cívicos são, via de regra, austeros e intimidantes. Freqüentemente, são projetados para representar a autoridade acima de tudo, seguindo dicas da linguagem arquitetônica clássica para construir uma imagem de poder, dominação e unidade cívica.
Adam Nathaniel Furman, um arquiteto e pensador que vive em Londres, evitou e reengajou essa tipologia para propor um tipo inteiramente novo de centro cívico.
Por meio de reformas e agendas políticas vigorosas, essas unidades políticas precisarão revigorar a agência das autoridades cívicas, enquanto, ao mesmo tempo, há uma oportunidade de ancorar nossas áreas urbanas em expansão com fulcros sociais simbólicos que incorporam um senso comum de progresso, de produção cultural, da história e da projeção democrática. — Adam Nathaniel Furman
O projeto causou grande confusão. Parte do público se identificou com o design e parte afirmou que era feio e espalhafatoso para um centro cívico. O que é certo então?
Quando as marcas e projetos se apresentam de maneiras que estão enraizadas na diferença, peculiaridades, imperfeições e vulnerabilidade, elas criam um senso de intimidade e inclusão onde aqueles que seguem o caminho “aspiracional” nunca podem. A estética elegante e “de bom gosto” está diminuindo: a verdade é que nunca poderemos atingir esse nível de perfeição imaculada, porque as mensagens de beleza podem ser diferentes para diferentes povos e culturas.
No instagram, existe até uma conta só para compartilhar exemplos de “designs feios” de produtos, revistas, projetos, roupas e brinquedos. Mas se há pessoas usando-os, seriam feios para elas?
Feio como democratização
O feio pode ser libertador: para designers, significa que as regras nem sempre precisam ser seguidas e que há um potencial ilimitado para experimentação; para o público, é libertador porque mostra às pessoas que nem sempre elas precisam ser perfeitas.
Graças às redes sociais como Instagram e Tiktok, o público está mais alfabetizado em design do que nunca. As pessoas nem sempre precisam ser molestadas por paletas de cores seguras e de bom gosto e fontes simples e legíveis.
O design feio não é aspiracional ou hierárquico: ele valoriza o ambiente confuso, estranho e imprevisível do que é ser uma pessoa que vive em um mundo confuso, estranho e imprevisível.
Via Tabulla.