Albor Arquitectos é um escritório de arquitetura cubano fundado em 2016 por Carlos Manuel González Baute, Alain Rodríguez Sosa, Camilo José Cabrera Pérez e Merlyn González García. Eles afirmam que a construção em Cuba é uma tarefa complexa, um desafio crescente devido à falta de materiais, altos custos e restrições ao exercício independente da profissão.
Mesmo neste contexto, suas obras, como Casa Soporte, Casa Casita e El Apartamento, se destacam pela continuidade da cidade herdada, pela redescoberta das técnicas de construção e por uma arquitetura baseada na proximidade com as pessoas e a realidade social predominante.
Convidamos o escritório, selecionado pelo ArchDaily como um dos Novos Escritórios de 2021 e recentemente vencedor do segundo lugar no Prêmio Obra do Ano 2022 por seu projeto Casa Torre, a nos contar mais detalhadamente sobre todas as suas inspirações, motivações e forma de trabalho de Cuba.
Fabian Dejtiar (FD): Uma das primeiras declarações no site de vocês é "Construir em Cuba é um exercício complexo". Vocês podem nos dizer um pouco mais sobre isto, o que o inspirou a fazer arquitetura neste contexto?
Albor Arquitectos (AA): Parafraseando o texto da publicação Casa Soporte, construir em Cuba é um desafio, seja pela falta de materiais, os altos custos, a perda ao longo dos anos da capacidade técnica da mão-de-obra, as restrições ao exercício independente da profissão ou as limitações nas estruturas das empresas estatais de construção civil. Um arquiteto cubano é uma figura utópica, seu trabalho não é uma necessidade, nem esteticamente nem conceitualmente. No Albor acreditamos que dentro deste contexto hostil a arquitetura que nos interessa pode ser produzida, uma arquitetura baseada na proximidade com o povo e a realidade social dominante, a continuidade da cidade herdada, a redescoberta de técnicas de construção do passado baseadas na relação construtor-arquiteto, a resolução de problemas com certa dignidade: a aspiração a uma espécie de beleza nobre emanando da realidade.
FD: Neste sentido, em uma conversa que tive com o arquiteto cubano Fernando Martirena, ele afirmou que "a arquitetura cubana contemporânea é quase inexistente" e que "a arquitetura cubana contemporânea não é um tema de conversa". Qual a opinião de vocês a respeito disso?
AA: Para entender um processo complexo como a realidade da arquitetura cubana de hoje, é preciso assumir toda uma série de fatores condicionantes profundamente ligados à história recente de Cuba. É inexato falar de ausência de arquitetura contemporânea no discurso público, quando a arquitetura está intimamente ligada às estruturas simbólicas mais importantes do Estado, organizada em uma grande rede de empresas dedicadas à construção, projeto e controle de sua execução, que são reguladas por um ministério dedicado exclusivamente a isso. Talvez seja mais claro falar da ausência de arquitetura independente - entre a qual nossa prática está incluída - dentro deste discurso. De fato, enquanto há alguns anos a arquitetura independente desfrutava de um certo status de indefinição legal, hoje podemos afirmar que sua prática tem sido tacitamente proibida. O como e o porquê desta situação é uma questão profundamente complexa com uma multiplicidade de arestas e nuances que vão além dos limites da profissão.
FD: Entendo que Albor é um grupo de arquitetos que desenvolve seu trabalho como um ato de interpretação e resposta à realidade cubana prevalecente. Qual é o processo de trabalho que vocês realizam para isso?
AA: Ultimamente temos tendido a uma arquitetura da realidade, se é que isso significa alguma coisa em Cuba. A ideia de trazer uma dimensão épica à arquitetura não parece viável em nossa situação. O trabalho que fazemos, como já dissemos, responde a essa condição na qual mal podemos discernir entre decisões tomadas e decisões induzidas. O processo de trabalho que realizamos é realizado com quase todas as supostas estruturas legitimadoras da profissão desmanteladas: nunca tivemos um estúdio físico, os quatro membros sempre trabalharam em paralelo, dependemos de terceiros para obter licenças de construção e nunca tivemos acesso a um mercado, nem regulamentado nem estável, para materiais de construção e equipamentos.
Isso determina uma concepção singular de projetos arquitetônicos: eles são concebidos de uma forma que quase invariavelmente força a concentração nas condições elementares, que são a resposta à questão do projeto, afetadas pelas constantes limitações que terão que ser resolvidas na hora, o que determina um processo no qual a linha entre a construção vernacular - em termos de maneira - e a profissionalização da arquitetura é diluida.
FD: Recentemente, vocês foram selecionados pelo ArchDaily entre os Novos Escritórios de 2021. Que tipo de valor vocês vêem nesta grande difusão? Que projeção futura vocês têm?
AA: Para nós é um grande reconhecimento porque a Plataforma Arquitectura / ArchDaily sempre foi uma forma importante de encontrar e estudar a arquitetura contemporânea. Somos encorajados a pensar que nossos projetos fazem parte desta comunidade, junto a arquitetos que admiramos profundamente. Com relação à indicação, estamos entusiasmados com a ideia de confronto, pois assim nossos projetos podem ser conhecidos e gerar um intercâmbio com arquitetos de outras latitudes, e colocar outras pessoas em contato com nosso contexto, o que pode ser algo único.
Diante de uma realidade complexa, gostamos de pensar em nosso grupo como uma estrutura mínima capaz de assumir as mudanças do contexto em que nos movemos. Como dissemos anteriormente, nossa prática está intimamente ligada a uma realidade mutável e muito instável. O panorama da deslegitimação da profissão independente projeta uma prática que tentaremos levar para o campo da documentação, da pesquisa processual e de pequenas ações construtivas. No momento, achamos esta perspectiva interessante e insondável, e vamos tentar assumi-la de uma forma enriquecedora.
FD: Por fim, em que novos projetos vocês estão trabalhando atualmente e o que gostariam de desenvolver ainda mais?
AA: Atualmente estamos trabalhando em projetos relacionados ao habitat e à habitação em pequena escala, e continuamos com as pesquisas e documentação que temos realizado nos últimos anos sobre a evolução tipológica da habitação nos centros urbanos do país, e particularmente na cidade de Cienfuegos - suas condições ambientais, evolução histórica e processos de adensamento - que gostaríamos de publicar.
Por outro lado, nos últimos dois anos, Albor teve dois de seus membros em Cuba e dois na Espanha. Entendemos essa condição, como outras com as quais o grupo trabalha, com uma certa exterioridade que nos permite analisar a partir da profissão questões relacionadas à forma como a sociedade e a arquitetura cubanas se desenvolveram nas últimas décadas. De uma perspectiva muito elementar reivindicamos ideias que poderiam ser interessantes: ter uma dupla perspectiva sobre a condição periférica de nosso trabalho, o discernimento do que poderia ser valioso e, além disso, qual destas conclusões poderia ser extrapolada para um contexto mais global e para respostas mais essenciais da arquitetura - a relação entre o vernacular e o profissional, o artesanal e o industrializado, o escopo na configuração das cidades do institucional e do autogerido, e os significados sociais da arquitetura. No futuro, gostaríamos de continuar investigando estas questões e relações, mas neste momento, dada a situação descrita, a felicidade de continuar com nosso trabalho, a sobrevivência do escritório seria nosso objetivo fundamental. Isto não é pouca coisa.