O conceito de estética remonta à civilização grega e se refere à percepção através dos sentidos. Apesar de ser um conceito filosófico, na arquitetura a estética é usada para traduzir ideologias e conceitos arquitetônicos a partir do conjunto de elementos construtivos, formas e materiais, estando intrinsecamente atrelada à forma física de uma construção e, portanto, vinculada a um contexto social, econômico e político. Para além de uma discussão de gostos, a estética arquitetônica é uma fonte de leitura e análise histórica.
Uma visita a um grande templo religioso gótico não deixa dúvidas sobre como a estética se projeta sobre a sociedade: a construção em pedra que vence alturas nunca antes executadas junto dos grandes vitrôs e de todos os adornos em suas paredes passam a mensagem de que aquele é um espaço de poder. Aquele espaço conduz nosso olhar aos céus fazendo-nos lembrar quem está acima de todos. A partir da estética, a arquitetura gótica reflete a imponente ideologia do cristianismo do século XVI, transmitindo aquilo que as igrejas julgavam importante: seu poder político. De modo similar, podemos pensar em palácios reais, edifícios governamentais e arranha-céus: grandes arquiteturas que representam poder, seja social, político ou econômico, e se destacam no tecido urbano.
Na menor escala essa mesma lógica também segue presente. Nas habitações, por exemplo, a estética reflete não só na escala e forma dos edifícios — mansões da classe mais rica em contraste com o pequeno barraco da favela —, mas também a partir de detalhes que vão sendo reproduzidos nas casas em geral, como é o caso dos acabamentos. Os revestimentos têm funções técnicas importantes para a integridade da arquitetura, como por exemplo a proteção e durabilidade da construção, a facilidade de manutenção e até características técnicas e acústicas. Mas, para além disso, as pessoas utilizam os revestimentos como elemento de singularidade, como a camada que simboliza a identidade daquela casa e que representa aqueles que ali vivem. É a partir dos revestimentos que as casas contemporâneas se comunicam, e portanto, seu uso carrega tanto significado quanto sua ausência.
Até o movimento moderno, o uso de revestimentos e adornos dizia respeito ao poder econômico de tal construção: bancos, teatros, bibliotecas e prédios luxuosos eram revestidos de mármore, ouro e madeiras nobres que percorriam o mundo até chegarem ao seu destino final. O movimento moderno questionou os adornos e o excesso de revestimentos utilizados até a década de 1940 e 1950, dizendo que estes destoavam da forma pura e da técnica da arquitetura. Portanto, arquitetos modernos projetaram suas arquiteturas despidas de todo tipo de excesso para transmitir sua ideologia. Décadas mais tarde, parte da corrente brutalista buscou ir ainda mais fundo nessa questão, afastando-se totalmente dos revestimentos e mostrando a estrutura e a marca do trabalho envolvido na construção da obra — revelando, assim, aquilo que, por muito tempo, a arquitetura procurou esconder.
Enquanto os brutalistas e os modernistas despiam os edifícios para comunicar e evidenciar suas ideologias, eles os faziam, majoritariamente, em casas burguesas ou edifícios públicos e coletivos, o que automaticamente faz com que essa estética fosse associada, principalmente, às classes mais abastadas. Há, porém, um outro lado da ausência dos revestimentos: na autoconstrução das periferias, onde a falta de acabamentos não é ideológica, mas necessária, busca-se a economia de recursos. Nessas casas as obras são, majoritariamente, feitas em etapas a longo prazo, de acordo com a obtenção de recursos, e portanto, por necessidade, reside-se em espaços inacabados, convivendo com paredes sem argamassa, reboco ou pintura e pisos cimentados. Essas casas, privadas dos revestimentos, sofrem consequências técnicas com problemas de infiltração e conforto térmico e acústico.
Nesse sentido, o significado que os revestimentos, e sua ausência, têm na arquitetura se transforma em cada um dos contextos. Se dentro do movimento moderno ou brutalista a ausência era uma escolha que refletia uma ideologia, nas periferias é uma necessidade, e sua obtenção, uma conquista.
Hoje em dia, ainda, vemos a afirmação de uma outra estética: observando construções de classe média alta, vemos superfícies que aparentam cimento queimado, tijolos, concreto aparente, blocos estruturais crus e até taipa. Essa estética, porém, nem sempre reflete sistema construtivo, ou uma alternativa de economia da construção. Cada vez mais, usa-se revestimentos que imitam outros materiais, remetendo à ausência de revestimentos, sem de fato retirá-los.
Essa estética contemporânea, que reveste uma parede de tijolos com uma massa que imita o concreto aparente, ou reveste uma parede de blocos de concreto com lascas de tijolos à vista, não preza por nenhuma ideologia, mas força um desprendimento entre forma, função e significado, valorizando a estética pela estética.
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