Cidades e comunidades no mundo todo estão avançando para reduzir as emissões de gases do efeito estufa (GEE) e prevenir os impactos mais perigosos das mudanças climáticas. Em geral, as estratégias focam na redução de emissões em setores como transportes, energia, habitação e resíduos. Mas existe outro setor que muitas comunidades têm subestimado em seus planos climáticos: árvores e florestas.
Essa é uma grande oportunidade, uma vez que as árvores não apenas liberam carbono na atmosfera quando são derrubadas como o removem enquanto crescem. Além disso, também fornecem uma série de outros benefícios para as pessoas vivendo em cidades e comunidades.
Por que as comunidades deixam as árvores de fora da ação climática?
Os inventários de GEE são um primeiro passo importante para elaborar uma estratégia de ação climática, uma vez que apontam de onde vêm as emissões e quais áreas apresentam as maiores oportunidades de redução. Até agora, no entanto, cidades e comunidades não contavam com uma orientação detalhada de como fazer um inventário das emissões de GEE das árvores e florestas localizadas dentro de seus perímetros territoriais.
Novas orientações desenvolvidas pelo WRI, pelo ICLEI - Governos Locais pela Sustentabilidade e pelo C40 buscam mudar esse cenário. As novas diretrizes focadas em árvores e florestas são complementares ao Protocolo Global para Inventários de GEE em Escala Comunitária (GPC, na sigla em inglês) – testado em Jacarta, Cidade do México, Mumbai, Salvador e diversas comunidades nos Estados Unidos. As orientações guiam as cidades e comunidades no processo de estimar as emissões e remoções anuais de carbono pelas árvores e florestas dentro de seus territórios, incluindo as árvores urbanas e as que fazem parte de terras agrícolas.
Embora o potencial de mitigação das árvores e florestas urbanas seja pequeno se comparado ao de outros setores, comunidades menos urbanizadas ao redor do mundo podem ter uma cobertura florestal significativa e oportunidades para fazer mais. Assim, são muitas as razões pelas quais as árvores e florestas devem integrar os esforços de redução de emissões. A seguir, cinco motivos para as comunidades incluírem árvores e florestas tanto em seus inventários de GEE quanto em seus planos de adaptação e mitigação climática:
1. Árvores e florestas tanto emitem quanto removem carbono
Quando árvores e florestas são derrubadas ou sofrem um processo de degradação – como os desencadeados pelo desenvolvimento urbano, pela agricultura ou por incêndios –, elas se tornam uma fonte de carbono na atmosfera. Em todo o mundo, cerca de 10% das emissões de dióxido de carbono que chegam à atmosfera a cada ano vêm de mudanças no uso do solo e das florestas. As árvores liberam carbono quando são derrubadas, e a capacidade do solo de remover carbono fica prejudicada sem a presença dessas árvores.
Por outro lado, se as árvores e florestas permanecem de pé, quando são protegidas, restauradas e plantadas, elas sequestram carbono enquanto crescem – e, assim, removem CO2 da atmosfera e ajudam a mitigar as mudanças do clima.
Devido à falta de orientação mais detalhada, até hoje a maioria das cidades e comunidades não tentou estimar o quanto a perda e a degradação de árvores e florestas representam em suas emissões de carbono – ou como as árvores existentes contribuem sequestrando carbono. Elas precisam reconhecer esse duplo papel das árvores e empreender esforços para preservar e fortalecer seus “sumidouros de carbono”.
Considere o exemplo do Condado de Montgomery, em Maryland, uma região de florestas densas na costa leste dos Estados Unidos. A área tem muitos parques com florestas maduras, áreas florestais que protegem bacias hidrográficas importantes e diversas paisagens suburbanas e agrícolas que incluem árvores. Como resultado, as florestas do condado de Montgomery atuam como um sumidouro líquido de carbono, sequestrando mais carbono do que emitem. O condado usa dados de seu inventário de GEE sobre árvores e florestas para definir melhor suas práticas de manejo da terra, como diminuir a remoção de árvores em obras, contabilizar o potencial de sequestro de carbono perdido quando as árvores são removidas e planejar programas de plantio.
2. Proteger as florestas urbanas é fácil, mesmo que o potencial de mitigação seja pequeno
Em ambientes urbanos, as árvores e florestas podem parecer uma peça relativamente pequena do quebra-cabeça climático como um todo – muitas vezes porque acabam ofuscadas pelas altas emissões de outros setores, como transportes e energia. Essa afirmação é verdadeira especialmente em relação a cidades grandes, como é o caso de muitas onde as novas orientações foram testadas.
No entanto, as árvores e florestas ainda são relevantes para os planos de ação climática municipais porque representam um esforço relativamente fácil para reduzir emissões e manter as remoções de carbono enquanto são instituídas mudanças em setores mais poluentes. Conservar as florestas e evitar a degradação florestal é reconhecidamente uma das estratégias de melhor custo-benefício para reduzir emissões. Em todo o mundo, muitas comunidades têm assumido o compromisso de atingir a neutralidade em carbono até a metade do século, e as árvores e florestas podem ajudar a atingir essas metas. Em escala global, acabar com a conversão das florestas, preservar os sumidouros florestais de carbono e restaurar as áreas degradadas têm o potencial de evitar mais de um terço das emissões.
3. Árvores e florestas urbanas são fundamentais para a adaptação climática
As árvores podem oferecer importantes benefícios em termos de adaptação climática ao atuarem como “amortecedores” para alguns riscos, além de tornar os espaços urbanos mais habitáveis.
Por exemplo, em uma cidade altamente urbanizada como Jacarta – onde há pouca cobertura florestal e a comunidade sofre com os impactos das mudanças climáticas –, a perda de árvores urbanas é apenas uma pequena fonte de carbono, e proteger as árvores existentes na cidade representaria um sumidouro pequeno em comparação às emissões de outros setores. Mesmo assim, as árvores presentes na cidade oferecem benefícios substanciais em termos de resiliência. Ajudam a proteger as pessoas e suas propriedades dos impactos das chuvas, promovendo a infiltração no solo e reduzindo o volume e a velocidade do escoamento superficial da água. Também reduzem a frequência e a intensidade das inundações, uma vez que armazenam água no solo em seu entorno – especialmente a montante – e evitam a erosão. E podem até mesmo purificar o arrespirado pelos 11 milhões de habitantes da cidade, coletando material particulado em suas folhas e removendo alguns gases nocivos.
Em outras cidades, as árvores podem contribuir para amenizar a temperatura ao fornecer sombra e por meio da evapotranspiração, reduzindo o efeito das ilhas de calor e resfriando as cidades durante as ondas de calor cada vez mais frequentes e perigosas. Além disso, podem fortalecer a segurança alimentar e nutricional local fornecendo alimentos como frutas, oleaginosas e folhas tanto para consumo humano quanto de animais.
4. Ampliar a cobertura vegetal pode combater desigualdades
Uma vez que souberem com precisão o quanto de carbono suas árvores e florestas emitem e removem da atmosfera, as cidades podem ter mais interesse em ampliar a cobertura vegetal para poder contar com essa poderosa solução climática natural. Trata-se de uma oportunidade para tratar também o acesso desigual da população a árvores e espaços verdes, um fenômeno comum em cidades em todo o mundo. Os bairros mais ricos em geral têm mais árvores do que as áreas mais pobres, deixando os moradores de baixa renda mais expostos ao calor, a níveis mais altos de poluição do ar e a inundações.
A cidade de Mumbai, por exemplo, tem 27 bairros. Há uma grande diferença na cobertura vegetal entre os bairros mais ricos, como Borivali, com 35% de cobertura de árvores, e os menos ricos, como Dadar, onde a cobertura vegetal é estimada em apenas 8%. Esse novo entendimento de como as árvores contribuem para os esforços de mitigação permite que a cidade planeje uma ampliação equilibrada da cobertura vegetal em todos os bairros, conforme estabelecido eu seu plano de ação climática, publicado recentemente.
5. Os benefícios das árvores e florestas vão muito além do clima
As árvores podem trazer muito mais benefícios para as cidades além da mitigação e adaptação climática. Entre eles, melhorar a saúde e o bem-estar das pessoas ao contribuir para diminuir a pressão alta, reduzir os níveis de estresse e melhorar o humor, estimular o sistema imunológico, reduzir o risco de alguns distúrbios psicológicos e apoiar o desenvolvimento mental das crianças. O contato com áreas verdes por meio de “banhos de floresta” ou “caminhadas na natureza” é cada vez mais associado a ganhos de saúde física e mental. Alguns médicos inclusive já prescrevem essas atividades no tratamento de problemas como ansiedade e depressão.
As árvores e florestas urbanas também são habitat para a biodiversidade local e oferecem meios de subsistência ao criar empregos na manutenção e manejo das áreas verdes.
Ajudando cidades e comunidades a usarem as árvores e florestas para assumir mais responsabilidade na ação climática
É claro que mesmo cidades e comunidades com muitas florestas não devem contar apenas com as árvores para reduzir suas emissões. Como ambientes que devem abrigar 80% da população mundial até 2050, as cidades serão o campo de batalha da luta contra as mudanças climáticas. Elas devem, portanto, restringir as emissões em todos os setores – transportes, energia, indústria e tantos outros. As árvores e florestas devem ser parte dessa estratégia.
Via WRI Brasil.