A relação da arquitetura com a natureza é complexa. Se, por um lado, buscamos paisagens naturais para emoldurar, por outro, tentamos a todo custo evitar patologias causadas pela presença de raízes e folhas em nossas paredes e estruturas. Ao mesmo tempo que lançamos mão de tetos verdes, jardins verticais e floreiras para aproximar as cidades da vegetação e melhorar o conforto das pessoas, nos conformamos em construir edifícios com materiais completamente dissociados da fauna e flora. Ainda que a revolução com os biomateriais e novas tecnologias esteja mudando isso aos poucos, devemos nos perguntar se as estruturas e edifícios precisam necessariamente estar separados da natureza em que se apoiam. Foi essa dúvida que motivou os pesquisadores da Universidade da Virginia (UVA) a desenvolverem estruturas geometricamente complexas impressas em 3D feitas de solo, onde as plantas pudessem crescer livremente.
A principal inovação foi utilizar a impressão 3D em conjunto com materiais de bases biológicas, incorporando a circularidade ao processo. No lugar dos tradicionais concreto ou materiais plásticos, a matéria-prima seria o próprio solo e as plantas locais misturados com água, inseridos na impressora para formar paredes e estruturas. Ao combinar a velocidade, eficiência de custos da fabricação aditiva e baixas demandas de energia com materiais de base biológica de recursos locais leva-se a manufatura aditiva a um passo a frente e as estruturas impressas seriam completamente biodegradáveis e retornariam ao meio ambiente no fim de suas vidas úteis.
A equipe foi composta por Ji Ma, professor assistente de ciência e engenharia de materiais na Escola de Engenharia e Ciência Aplicada da UVA; David Carr, professor de pesquisa do Departamento de Ciências Ambientais da UVA; e Ehsan Baharlou, professor assistente da Escola de Arquitetura da UVA, além do estudante Spencer Barnes. Foi ele que conduziu experimentos em relação às misturas mais propícias para a impressão, através de duas abordagens: imprimindo solo e sementes em camadas sequenciais ou misturando sementes no solo antes da impressão. Ambas as abordagens funcionaram bem.
Como Ji Ma aponta neste artigo publicado pela Universidade, "O solo impresso em 3D tende a perder a água mais rapidamente e mantém uma aderência mais forte à água presente. Como a impressão 3D torna o ambiente ao redor da planta mais seco, temos que incorporar plantas de climas áridos. A razão pela qual pensamos que esse é o caso é porque o solo é compactado. Quando ele é espremido pelo bico, as bolhas de ar são empurradas. Quando perde bolhas de ar, ele se mantém na água com mais força.”
David Carr, por sua vez, foi o responsável por encontrar a composição ideal do solo a ser impresso e as espécies vegetais mais propícias, para que as mesmas prosperassem na estrutura e o solo pudesse acumular matéria orgânica e coletar nutrientes necessários. Ele propôs plantas que ocorrem naturalmente em áreas onde a vida está em seus limites - plantas nativas que crescem praticamente na rocha nua. A espécie escolhida foi a Sedum (stonecrop), comumente utilizada em configurações de telhado verde. A fisiologia desta espécie é semelhante ao cacto e ela pode sobreviver com muito pouca água, e até ser dessecada até certo ponto para depois se recuperar.
A equipe publicou seus primeiros resultados no artigo 3D Printing of Ecologically Active Soil Structures, no início deste ano. As pesquisas em torno da tecnologia seguem e as próximas etapas incluem formulações de “tintas” de solo para estruturas maiores, com até um pavimento, buscando antecipar problemas como a quebra do solo em tensões maiores. Além disso, os pesquisadores também têm experimentado vários materiais em camadas dentro de um painel de parede para isolar a parede interna e manter a umidade da parede externa. Ainda que seja apenas um início, pode ser um passo para não dissociar tanto a natureza do que os humanos produzem.