A Região Metropolitana de Campinas é um dos maiores centros urbanos do país. Com mais de três milhões de habitantes e um PIB superior a R$ 150 bilhões por ano, é uma das regiões econômicas mais dinâmicas do Brasil.
Porém, ao mesmo tempo, trata-se de uma área vulnerável à mudança climática. O aumento da mancha urbana e a crescente demanda por água na região colocam Campinas no mapa das áreas com alto risco de déficit hídrico, segundo a ferramenta Aqueduct, do WRI.
Isso significa que com o passar dos anos, manter o volume de água dos mananciais de abastecimento da região será uma tarefa cada vez mais desafiadora. Além disso, o clima em Campinas vem sofrendo alterações a partir do aumento das médias de temperatura e redução da disponibilidade de água no solo. Nos últimos 35 anos houve aumento consistente das temperaturas médias diárias, e redução de 0,5% ao ano na disponibilidade de água no solo, segundo dados da estação meteorológica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Se adaptar às mudanças climáticas vai demandar soluções inteligentes. Um novo estudo produzido pelo projeto INTERACT-Bio, do ICLEI América do Sul, mostra que apostar nas soluções baseadas na natureza – a restauração e o manejo de áreas naturais – é uma estratégia-chave para enfrentar esses dilemas. O estudo, chamado de Infraestrutura Natural para Água em Campinas (SP) e região, mostra que a conservação e restauração da vegetação nativa traz benefícios para a qualidade da água, além de um impacto financeiro positivo, com economia em custos do tratamento da água que chega nas torneiras da população de Campinas.
Economizando com conservação e restauração
O estudo partiu do conceito de “infraestrutura natural”. Trata-se de um tipo de solução baseada na natureza que investe em intervenções para conservação, manejo e restauração da vegetação nativa e de florestas.
Quando falamos em obras e medidas para melhoria da qualidade e quantidade da água, é comum gestores públicos pensarem em investimentos em obras de concreto e aço – uma infraestrutura cinza e tradicional, como represas, reservatórios, barragens e estações de tratamento. Essas obras são fundamentais. Mas elas podem vir acompanhadas de ações e investimentos em infraestrutura natural ou verde.
A vegetação nativa protegida ou restaurada, principalmente nos entornos dos corpos hídricos, ajuda no controle da erosão do solo, evitando que essa sujeira, chamada de poluição de sedimentos, entre nos rios e reservatórios. Isso faz com que as empresas de saneamento usem menor quantidade de produtos químicos e operações de dragagem, reduzindo os custos na operação de tratamento de água.
No caso específico de Campinas e região, o estudo analisou ações de infraestrutura natural nas bacias dos rios Atibaia e Capivari, responsáveis pelo abastecimento da população da região. Os resultados mostram que as florestas podem reduzir em 14% a turbidez nos cursos de água. Os benefícios financeiros para conservação e restauração de florestas também são animadores:
- Conservação: o trabalho identificou que já há 78 mil hectares de vegetação nativa em áreas prioritárias para a água. Se essas florestas forem desmatadas, as empresas de saneamento da região passarão a gastar mais em produtos químicos, dragagens e operações de tratamento de água. Em outras palavras, a conservação florestal produz uma economia de R$ 6,6 milhões por ano.
- Restauração: entre as áreas prioritárias, também há as que estão degradadas. O estudo identificou que recuperar 14 mil hectares degradados resultaria em uma economia adicional de R$ 1,7 milhão por ano.
Em outras palavras, a conservação e restauração das florestas pode resultar na economia de até R$ 8,3 milhões por ano para os municípios e empresas de saneamento de Campinas e região, ao mesmo tempo em que melhora a qualidade da água oferecida à população. Isso sem falar em outros benefícios como aumento da prestação de serviços ecossistêmicos e ambientais.
Conectando iniciativas
Essa restauração pode começar imediatamente. Para isso, é preciso trabalho em conjunto. As áreas prioritárias para a restauração, que juntas atingem esse benefício de economia no abastecimento de água, estão espalhadas em municípios da Região Metropolitana de Campinas e naqueles a montante das bacias do rio Atibaia e Capivari.
Para se chegar aos benefícios mais amplos da infraestrutura natural, é preciso coordenar esforços nos municípios, engajar os atores locais e conectar projetos, programas e iniciativas privadas e da sociedade civil que já estão em andamento na região. O estudo mostra que muitas das áreas prioritárias para a água estão fora do município e, dessa forma, ações devem ser pensadas para articulação de políticas públicas em nível regional.
Por exemplo, há cerca de 800 hectares que precisam ser restaurados na região por compensação ambiental de obras de infraestrutura tradicional, como reservatórios. Também há a identificação de 130 hectares que já estão priorizados no Plano de Ação para Implementação da Área de Conectividade na Região Metropolitana de Campinas, do Programa Reconecta RMC. O programa é uma iniciativa da prefeitura de Campinas, em parceria com outros municípios da região, para fortalecer a capacidade de geração de serviços ecossistêmicos e construir corredores de biodiversidade que conectam fragmentos florestais na região.
Outros planos e programas que preveem a conservação e restauração da vegetação nativa – como o Plano das Bacias PCJ (Bacias Hidrográficas dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí) e o Programa Nascentes da Secretaria Estadual de Infraestrutura e Meio Ambiente de São Paulo –, podem colaborar tecnicamente e acelerar a implementação de ações de infraestrutura natural.
Uma ferramenta crucial para os centros urbanos do Sudeste
O estudo focado na Região Metropolitana de Campinas é inovador por trazer para aquela paisagem a inteligência espacial e uma metodologia consolidada na avaliação da infraestrutura natural. Porém, Campinas não está sozinha: este foi o quarto relatório já produzido sobre infraestrutura natural para água em diferentes paisagens. Em todos eles, os resultados mostram que a restauração de paisagens e florestas é uma solução baseada na natureza economicamente viável e que resulta em benefícios para toda a sociedade.
Em São Paulo, o WRI Brasil e parceiros avaliaram a restauração em áreas prioritárias para o Sistema Cantareira, com economia de mais de R$ 338 milhões em vinte anos. No Rio de Janeiro, a infraestrutura natural tem o potencial de evitar o uso de 4 milhões de toneladas de produtos químicos na maior estação de tratamento de água do mundo. No Espírito Santo, a filtragem das florestas evitaria o equivalente a despejar 40 caminhões-caçamba de sujeira nos rios todos os anos.
Esses trabalhos mostram que a infraestrutura natural para a água é uma estratégia inteligente no planejamento do tratamento e abastecimento de água dos grandes centros urbanos. Empresas de saneamento do país todo podem se beneficiar dela.
Benefícios da restauração para além do abastecimento
O estudo Infraestrutura Natural para Água em Campinas (SP) e região apresenta um caso econômico para se investir em uma solução baseada na natureza com ganhos claros para as empresas de saneamento e, consequentemente, para a sociedade. Só que práticas expandidas de infraestrutura natural podem trazer grandes benefícios para a paisagem rural da região de Campinas que vão além da economia.
A infraestrutura natural pode assumir formas de boas práticas agrícolas – como o manejo sustentável de pastagem ou a implementação de Sistemas Agroflorestais – permitindo aos produtores rurais a possibilidade de restaurar e obter ganhos produtivos ao mesmo tempo. Investimentos em infraestrutura natural podem ser pensados para aumentar a produtividade de pastagens e o lucro do produtor rural. Incluir os produtores é peça-chave para restaurar paisagens e garantir o uso sustentável dos recursos naturais.
Além disso, a restauração de áreas verdes pode ser pensada como espaços de acesso à população do entorno como parques, áreas voltadas ao ecoturismo, aprendizado e prática de esportes.
Via WRI Brasil.