A arquitetura e o urbanismo na América Latina enfrentam desafios complexos e variados, resultantes de questões sociais, ambientais e econômicas profundamente enraizadas. A região, marcada por desigualdades históricas, crescimento populacional acelerado e urbanização desordenada, exige soluções inovadoras que conciliem as demandas habitacionais com a preservação ambiental e o respeito às identidades locais. Nesse cenário, algumas arquitetas têm se destacado ao trazer um olhar aguçado para enfrentar esses desafios.
Camilla Ghisleni
Camilla Ghisleni é Arquiteta e Urbanista, formada pela Universidade Federal de Santa Catarina e Mestre em Urbanismo, Cultura e História da Cidade pela mesma universidade. É sócia-fundadora do escritório Bloco B Arquitetura e colabora com o ArchDaily Brasil desde 2014.
Como as arquitetas latino-americanas estão enfrentando os desafios de seus países? Quatro entrevistas inspiradoras que mostram criatividade e resiliência
Nová Scéna: a história por trás do icônico anexo brutalista do Teatro Nacional de Praga
Entre 1977 e 1983, o Teatro Nacional de Praga passou por uma significativa transformação com a inauguração do Nová Scéna, um "irmão moderno" do tradicional teatro neorrenascentista. Durante muitos anos, o Nová Scéna foi a sede do famoso Laterna Magika, considerado o primeiro teatro multimídia do mundo. Essa experiência inovadora misturava performances clássicas com efeitos visuais gerados por computador, proporcionando uma ação dramática que se destacava no imponente edifício de vidro, um ícone da era comunista e um símbolo do poder político da época.
Pré-fabricação e ousadia formal do modernismo belga: a história dos Edifícios CBR e LH 187 em Bruxelas
Entre 1960 e 1976, a capital da Bélgica tornou-se um cenário de experimentos arquitetônicos que combinavam os ideais modernistas com a pré-fabricação, culminando na construção de dois edifícios icônicos. O CBR Office Building (1967-1970) e o LH 187 (1976), projetados por Constantin Brodzki e Marcel Lambrichs, são vizinhos e compartilham uma linguagem arquitetônica audaciosa. Ambos se destacam por suas fachadas formadas por grandes módulos de concreto pré-fabricado, que não só evidenciam a estética brutalista, mas também revelam o empenho em usar materiais industriais e técnicas construtivas inovadoras para a época.
Refúgios de esperança: 10 centros de acolhimento para crianças em situação de vulnerabilidade ao redor do mundo
O papel da arquitetura em um centro de acolhimento para crianças ultrapassa a simples construção de um espaço físico; trata-se de conceber refúgios que promovam cura, proteção e oportunidades de desenvolvimento. Em meio a vulnerabilidade de seus pequenos usuários, o ambiente arquitetônico torna-se um elemento crucial para sua recuperação emocional. Cada detalhe do espaço – desde a iluminação natural até a disposição dos ambientes – contribui para criar uma atmosfera de segurança e acolhimento, favorecendo não apenas o bem-estar físico, mas também o fortalecimento psicológico e social das crianças.
Claraboias na arquitetura tropical: 20 casas que reinventam a iluminação natural
De discretos feixes de luz a grandes vãos, as claraboias transformam a luz natural em uma poderosa ferramenta arquitetônica, criando um jogo dinâmico de luz e sombra que confere movimento e vitalidade às edificações. Nesta coreografia complexa, o observador é cativado não apenas pelos desenhos que a luz traça nas superfícies, mas também pelos benefícios fisiológicos que a iluminação zenital proporciona, como o conforto térmico e a sensação de bem-estar.
Casas mimetizadas: 15 projetos latino-americanos inseridos na paisagem
A paisagem natural da América Latina é excepcionalmente diversificada, abarcando desde montanhas imponentes até vastas planícies desérticas. Nesse mosaico geográfico, muitos projetos arquitetônicos se destacam por estabelecer um diálogo harmonioso com o entorno, inserindo-se de forma sutil na paisagem. Esse cuidado é evidente no uso de materiais, cores e formas que mimetizam o construído no natural.
Terapia verde: qual o papel da natureza na cura dos pacientes hospitalizados?
O contato com a natureza tem ganhado cada vez mais protagonismo tanto na teoria quanto na prática arquitetônica dos últimos anos, especialmente após a pandemia de COVID-19, que evidenciou a relevância dos ambientes naturais como espaços de cura. Esse período trouxe à tona diversos estudos científicos que destacaram o impacto positivo dos espaços verdes no bem-estar humano, seja em locais de trabalho, residências ou áreas urbanas. Com tantos benefícios cientificamente comprovados torna-se evidente, portanto, a urgência de integrar elementos naturais em projetos hospitalares, criando ambientes que ofereçam apoio essencial para aqueles que enfrentam desafios físicos ou mentais.
Entre o sagrado e o profano: a história por trás da Igreja do Sagrado Coração de Jesus em Lisboa
Como marco da arquitetura religiosa contemporânea de Portugal, a Igreja do Sagrado Coração de Jesus opõe-se formalmente aos modelos tradicionais representando uma obra livre de estigmas historicistas. Fruto de um concurso de projeto organizado em 1960, ela se destaca por sua dimensão cívica, pelo papel urbano e pelo seu significado antimonumental e social. Ao integrar-se na malha regular do bairro das Avenidas Novas, este exemplar do Movimento de Renovação da Arte Sacra (MRAR) faz parte de um complexo paroquial maior que passa despercebido ao transeunte. Sua rua exterior cria um espaço público inesperado, convidando à entrada e à integração num adro onde arquitetura e cidade se fundem. Finamente trabalhada em termos de espacialidade, detalhes e luz, a Igreja reserva muitas surpresas a quem nela adentra.
Retrofit em edifícios brasileiros: sustentabilidade e inovação no centro de São Paulo
O termo retrofit, diferentemente da reabilitação ou do restauro, tem sido adotado pelo mercado para lidar com as obras de atualização tecnológica nos edifícios existentes. São projetos cujo foco reside na adequação das construções às normas técnicas locais, assim como nas adaptações para tornar os espaços mais funcionais e sustentáveis, respondendo às demandas atuais.
Reconhecido como uma prática essencial na arquitetura contemporânea, o retrofit vem ganhando destaque ao combinar os benefícios da revitalização de edifícios existentes — sem a necessidade de demolição — com diversas vantagens econômicas e sociais. Essa abordagem tem se consolidado no campo arquitetônico, tanto por meio de exemplos icônicos quanto por iniciativas públicas e privadas.
A nova Idade da Pedra: 12 casas contemporâneas da América Latina e a diversidade de suas pedras naturais
A arquitetura da América Latina é rica e diversificada, e isso também se reflete nos tipos de pedra utilizados ao longo dos séculos em suas diferentes regiões. Esses materiais não apenas refletem a geologia variada da América Latina, mas também mostram como as culturas locais adaptaram seus métodos de construção às condições naturais, criando uma arquitetura única e significativa. Na arquitetura contemporânea, o uso da pedra está alinhado com os preceitos da sustentabilidade por ser um material durável, com baixa pegada de carbono e disponível localmente. Seu apelo também pode ser enaltecido do ponto de vista estético, criando espaços atemporais e que fortalecem a relação com a natureza e a paisagem ao redor.
Desenhando a escola do futuro: espaços multifuncionais para uma educação dinâmica
O século XXI trouxe mudanças significativas na arquitetura dos edifícios escolares, refletindo novas filosofias educacionais, avanços tecnológicos e valores sociais que priorizam sustentabilidade e inclusão. Essa evolução não é apenas estética, mas representa uma profunda reformulação do papel dos ambientes físicos na educação. Os corredores apertados e as inúmeras carteiras enfileiradas há tempos deram lugar a espaços dinâmicos, conectados com o entorno e com a comunidade, sendo a flexibilidade e a multifuncionalidade suas características fundamentais.
Além do esporte: 10 vilas olímpicas reversíveis e multifuncionais
A primeira vila olímpica da história foi construída para os Jogos Olímpicos de Verão de 1924 em Paris. Antes disso, os atletas se hospedavam em hotéis, albergues, escolas, quartéis e até mesmo nos barcos em que viajavam para as cidades-sede. Pierre de Coubertin, co-fundador do Comitê Olímpico Internacional (COI), foi o idealizador da vila inaugural ao perceber que seria economicamente mais viável abrigar atletas em estruturas novas e temporárias do que em hotéis, enquanto as vilas poderiam incutir também um senso de comunidade entre os competidores internacionais.
Centro Internacional de Convenções Kenyatta: ícone modernista da arquitetura africana pós-colonial
A arquitetura moderna e futurista da África Subsaariana reflete as aspirações e o espírito progressista que dominavam o início da independência de muitos países dessa região entre o final da década 1950 e o início da década de 1960. Uma produção que, por coincidir com o crescimento econômico, utilizou métodos de construção complexos em uma arquitetura que mesclava o interior e o exterior (graças ao clima tropical) focando na forma e expressão da materialidade. Nessa fusão de condicionantes específicas surgiram peças arquitetônicas de valor único que precisam ser "redescobertas", entre elas, o Centro Internacional de Convenções Kenyatta (KICC) construído em Nairóbi, Quênia.
Transformando água em terra: grandes projetos de aterros ao redor do mundo
A ideia de transformar água em terra tem fascinado a humanidade há séculos. Os Países Baixos, por exemplo, como um dos pioneiros no assunto, possuem cerca de 20% do território recuperado do mar ou de lagos utilizando os diques como métodos para estancar a água e secar as superfícies. O desenvolvimento tecnológico ao longo do tempo, no entanto, tem tornado essa prática cada vez mais popular. Hoje, a China é um dos países que lidera o ranking, assim como os centros urbanos no sul global, destacando cidades na África Ocidental, Leste Asiático e Oriente Médio.
Esses aterros megalomaníacos são criados principalmente em locais onde há uma costa bastante extensa, mas não há continente suficiente para satisfazer suas necessidades. Nesse sentido, os usos acomodados na nova área são os mais diversos, variando desde a criação de residenciais luxuosos até um arquipélago de entretenimento com hotéis, restaurantes, teatros e lojas.
Arquitetura para glamping: a tendência de apreciar a natureza com conforto
Permanecer temporariamente em um local ao ar livre, instalar-se de maneira provisória, assentar-se em um campo. As definições do verbo acampar presentes nos dicionários indicam duas características fundamentais para a prática: natureza e temporalidade. Na arquitetura, as tendas materializam essas qualidades configurando uma tipologia que atravessa séculos e culturas sendo, sobretudo, associada a precariedade e fragilidade.
Diante dessa constatação comum, no início dos anos 2000 surgiu a palavra glamping como uma junção entre camping e glamour, sugerindo aliar a prática do acampamento com comodidades luxuosas. No entanto, apesar da popularização, a ideia está longe de ser original. Nem sempre o ato de acampar foi entendido como o oposto do luxo.
Como tornar os edifícios modernistas mais eficientes energeticamente?
Na história da arquitetura, as questões de eficiência energética e emissões de CO2 eram consideradas marginais até o final do século XX. A pontuação ínfima de alguns icônicos edifícios modernistas no programa de certificação energética Energy Star ilustra essa situação. O edifício MetLife/PanAm de 1963 (Walter Gropius e Pietro Belluschi), obteve uma pontuação sombria de 39 (em uma escala de 0 a 100), a Lever House (Skidmore, Owings e Merrill, 1952), obteve 20. O pior desempenho de todos foi do icônico edifício Seagram de Mies Van der Rohe, construído em 1958, com apenas 3 pontos. Por outro lado, dois venerados edifícios da década de 1930 considerados Art Déco, o Chrysler Building e o Empire State Building, alcançaram 84 e 80 pontos como resultado de amplas atualizações de seus sistemas mecânicos e de isolamento.
Vencendo barreiras: 4 projetos residenciais com estratégias para acessibilidade na América Latina
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), mais de 1 bilhão de pessoas no mundo vivem com algum tipo de deficiência, seja física ou intelectual, e 80% delas estão em países do Sul Global. Embora tenha havido avanços na garantia dos direitos dessas pessoas, elas continuam enfrentando diversas barreiras e estão entre os grupos mais excluídos dos serviços essenciais da sociedade, como saúde, educação e emprego. Nesse contexto, a arquitetura desempenha um papel crucial ao garantir a segurança e a autonomia espacial de todas as pessoas, assegurando sua participação plena e efetiva na sociedade.
Disneylândia Distópica: a história por trás da cidade fantasma de castelos na Turquia
Muito provavelmente, a maioria de nós já se imaginou vivendo em um castelo em algum momento da vida, seja na infância embalada pelos contos de fadas, seja na fase adulta estudando sobre a monarquia europeia. Levando em conta esse fascínio, o que você acharia se tivesse a possibilidade de comprar o seu próprio castelo? Por 370 mil dólares, isso era possível na Turquia em meados de 2014. Seriam 325 metros quadrados de puro luxo, com torres azuladas e escadas em caracol. A única questão é que ao lado do seu castelo haveria outros 731 idênticos. Mas quem se importa com exclusividade diante da possibilidade de viver um conto de fadas da Disney?