Camilla Ghisleni é Arquiteta e Urbanista, formada pela Universidade Federal de Santa Catarina e Mestre em Urbanismo, Cultura e História da Cidade pela mesma universidade. É sócia-fundadora do escritório Bloco B Arquitetura e colabora com o ArchDaily Brasil desde 2014.
No entanto, embora seu caráter hermético possa parecer um obstáculo para a adaptação a novas funções, o que se tem observado nas últimas décadas são iniciativas as quais valorizam essas estruturas, integrando-as à dinâmica urbana e destacando sua importância como parte da memória coletiva local.
Em 1853, na Feira Mundial de Nova York, um senhor de terno e cartola subiu a uma plataforma suspensa e ordenou que a corda a qual a sustentava fosse cortada. Ele caiu alguns centímetros, mas o sistema de segurança entrou em ação e a plataforma se manteve estável para delírio da multidão que estava assistindo. Nesse momento, talvez nem Elisha Graves Otis tivesse dimensão de como sua invenção iria mudar definitivamente o rumo da arquitetura.
Nesse âmbito, muito se fala sobre as diferentes técnicas vernaculares empregadas na arquitetura, seja a produção dos tijolos em adobe, os telhados de palha, as paredes trançadas de bambu, entre muitas outras. No entanto, enquanto a técnica vernacular concentra-se em ações ou habilidades específicas, seu significado difere das tecnologias vernaculares.
Organizar, enquadrar, empilhar. Transformar a matéria-prima bruta que surge do solo em arquitetura. Esse é um desafio que muitos arquitetos latino-americanos se propõem a enfrentar, mostrando que a escassez é desafiadora, mas também um prato cheio para liberar a criatividade.
O uso de materiais extraídos do próprio solo tem um objetivo duplo. Do ponto de vista econômico, nos países ou regiões onde a industrialização ocorreu com intensidade reduzida, essa prática faz sentido por conta dos altos custos de materiais industrializados - como concreto e aço - que geralmente precisam vir de longe. Já no âmbito ecológico, a preocupação ambiental em um projeto começa na escolha dos materiais, e priorizar os encontrados localmente diminui deslocamentos e emissões de gás carbônico.
O mundo mudou e aceitar este fato não é mais uma questão de escolha, e sim, de sobrevivência. Nossos regimes de chuvas, períodos de seca, temperaturas médias, nível do mar, tudo está em constante mudança e o posicionamento negacionista de muitos países, incluindo o Brasil, tem gerado situações calamitosas como esta que estamos enfrentando agora.
As enchentes que devastaram o sul do país nos últimos dias não podem ser consideradas fatos isolados. Por conta do aquecimento global, eventos climáticos como esse serão cada vez mais recorrentes. Ou seja, infelizmente, não poderemos impedir que eles aconteçam, mas podemos – e devemos - tornar nossas cidades mais resilientes a essas situações.
O mundo está de olho na Amazônia. Dados geográficos desse território, de 6,74 milhões de km2, espalhado por oito países da América Latina, são constantemente estampados nas mídias nacionais e internacionais. Os números preferidos das matérias estão sempre vinculados a sua magnitude como a maior floresta tropical do mundo, o lar de 10% da biodiversidade mundial, a responsável por 15% da água doce do planeta. No entanto, pouco se fala sobre o que acontece debaixo de suas árvores, no chão onde as pessoas vivem.
As cenas iniciais do premiado filme brasileiro “Cidade de Deus” (2002) mostram um conjunto habitacional na periferia do Rio de Janeiro o qual, posteriormente, se transforma em um reduto de pobreza e violência. Apesar do filme se passar na década de 60, o conjunto habitacional escolhido como cenário era um complexo recém construído.
Essa escolha, de fato, não fez diferença alguma pois, apesar dos 40 anos que separam a época retratada no filme e as filmagens, as soluções arquitetônicas utilizadas pelos programas habitacionais no país continuaram as mesmas, replicando modelos datados e evidenciando a estagnação o setor.
Quando se fala a palavra “trópico”, a imagem que comumente vem à mente é a de um lugar exótico, sempre quente e úmido, sujeito a chuvas pesadas e constantes que lavam o solo e fazem com que a vegetação cresça descontroladamente. Alimentado por uma idealização, no decorrer da história, esse clima tropical já foi sinônimo de paraíso ao mesmo tempo em que era acusado de formar povos débeis por ser clemente demais.
Felizmente, esses julgamentos e associações foram deixados no passado, dando lugar a projetos teóricos e práticos que listam os ônus e bônus de se viver em uma região de clima tropical, reconhecendo as diferentes estratégias aplicadas para favorecer a adaptabilidade humana em meio a essas características climáticas tão peculiares.
Dois quilômetros. Essa é a altura esperada para a futura torre saudita que Foster + Partners está projetando. Com o dobro da altura do atual recordista - Burj Khalifa de Dubai -, o edifício multibilionário coroará o céu da cidade de Riad abrigando escritórios, residências e espaços de entretenimento. O projeto faz parte de um programa de desenvolvimento pelo qual a Arábia Saudita está passando, liderado pela visão do príncipe herdeiro Mohammad bin Salman de marcar o país com escala e ambição por meio de uma série de empreendimentos gigantes. Dentro desse plano de ação, as torres super altas destacam-se como símbolos de visibilidade e fama global, mas também como alvos de críticas pelos seus excessos, tais quais os custos de construção astronômicos e a falta de preocupação ambiental.
No imaginário de grande parte da população, a favela assume representações muitas vezes paradoxais e proporcionalmente opostas. Sob o olhar de quem não a vive, ela é constantemente associada ao crime, a sujeira ou a doenças, ao mesmo tempo em que é considerada a expressão estética de um país, sendo o berço de elementos culturais reconhecidos mundialmente, como o samba no caso do Brasil.
O conceito de “olhos da rua” talvez seja o mais famoso dentro da literatura arquitetônica e urbanística quando o assunto é segurança urbana. Jane Jacobs utiliza essa expressão para se referir às pessoas que – de forma consciente ou inconsciente – utilizam os espaços públicos ou os contemplam desde suas casas, gerando uma vigilância natural. Um movimento que, no âmbito da nossa disciplina, é fomentando tanto por meio de espaços públicos de qualidade quanto pela potente relação entre o público e o privado criada através das fachadas das edificações. Defendendo esse controle cotidiano, Jacobs acredita em um modo de fazer arquitetura e cidades que condena a verticalização em excesso, reforçada por edifícios isolados e de uso único os quais negam o contato com rua.
Hãhãwpuá é o nome usado pelo povo indígena brasileiro Pataxó para se referir à terra, ao solo ou, mais precisamente, ao território que depois da colonização ficou conhecido como Brasil, mas que já teve e ainda tem muitos outros nomes. Dentro de todos esses “brasis”, o Brasil como terra indígena é o foco do pavilhão do país na Bienal de Artes de Veneza 2024, sendo renomeado, portanto, como PavilhãoHãhãwpuá.
Quando os primeiros raios de sol atingem a superfície da cidade sueca de Jukkasjärvi, no momento em que o inverno dá lugar a primavera, este hotel de gelo começa a derreter. São quinhentas toneladas de água que escorrem rumo ao Rio Torne. O que antes eram paredes, pisos e tetos, agora são gotas de água em busca do seu curso natural. Nessa cena que acontece todos os anos desde 1989, tudo é contradição. A solidez e a longevidade da construção, a efemeridade e a transitoriedade da escultura de gelo.
A intersecção entre inteligência artificial (IA) e planeamento urbano representa um grande potencial para a criação de cidades mais inteligentes, eficientes e sustentáveis. Trata-se da incorporação de tecnologias inovadoras que podem direcionar a tomada de decisões, otimizar a alocação de recursos, antecipar tendências, envolver os cidadãos, entre muitas outras. Nesse contexto em que se entende a IA como uma ferramenta para o desenvolvimento de diferentes aspectos urbanos, tem surgido uma proliferação de aplicativos, softwares e demais sistemas tecnológicos desenhados para auxiliar no planejamento urbano. Da morfologia ao envolvimento da comunidade, a seguir selecionamos alguns estudos e tecnologias que estão sendo aplicados ao redor do mundo.
Recentemente, o renomado escritório dinamarquês BIG anunciou o lançamento do seu projeto para a cidade de Gelephu, no Butão. Um masterplan inspirado na cultura do país e nos seus princípios de felicidade. A "Mindfulness City" apresentará inúmeras possibilidades de apropriação ao público, trazendo investimentos em infraestrutura, educação e tecnologias sustentáveis, tudo sob os preceitos da Felicidade Interna Bruta (FIB).
A relação entre a arquitetura e o meio ambiente é multifacetada e envolve uma interação dinâmica entre os espaços construídos e o contexto natural circundante, moldando a forma como os edifícios e as cidades funcionam, impactam os ecossistemas e influenciam no bem-estar dos habitantes.
São muitos os aspectos que relacionam a arquitetura e o meio ambiente, desde os mais práticos como a utilização de materiais naturais e fontes de energia renováveis, até os mais abrangentes como a incorporação e valorização da cultura local. Dentro dessa ampla gama de possibilidades, selecionamos a seguir cinco entrevistas que apresentam diferentes abordagens sobre este tema e fomentam reflexões fundamentais para o contexto arquitetônico contemporâneo.