Quando nos lameiros do Tâmega o gado ruminava nos prados, não se imaginaria que aí se pudesse erguer esta poesia branca, uma rigorosa geometria em betão pousada sobre uma sequência de finas paredes-lâmina que a levantam do chão e a defendem das águas se a enchente do rio galgar as margens. À volta, os muros toscos e as ruínas de casas de gados e gente ecoam o mundo que houve e que aí fica como memória de tempos e de outros trabalhos e dias; as nogueiras, as macieiras ou as figueiras completam essa atmosfera-paisagem a que um certo artista dizia estar preso por hereditariedade transmontana.
Alvaro Domingues: O mais recente de arquitetura e notícia
Do Siza para Nadir: a arquitectura é uma arte / Álvaro Domingues
O rural era verde; veio uma cabra e o comeu
O texto a seguir faz parte da segunda edição do jornal Homeland: News from Portugal, publicação que representa Portugal na 14ª Bienal de Veneza de 2014.
“ Queremos o mesmo tipo de liberdade que tem o homem da cidade; salva-nos da fuligem da velha lareira, sinal da nossa condição primitiva: as nossas faces grelhadas pelo fogo, as costas geladas pela humidade da casa; queremos radiadores e mataremos quem nos vier com aquela conversa do amor ao campo pitoresco e com tagarelices poéticas acerca “das nossas vetustas lareiras e tardes pacatas em frente ao fogo”, sem saber nada sobre isso! Queremos casas sobre pilotis. Sim! Porque já estivemos demasiado tempo com os pés metidos em esterco e lama, demasiado tempo em chão de terra batida que nos aleijou com reumático. Dá-nos janelas, janelas largas, para termos sol na nossa casa. Leva o esterco da frente da nossa mesa. Dá-nos os meios para sermos limpos e saudáveis como as pessoas da cidade…”