Na teoria, a sensação de bem-estar pode ser definida como um estado de satisfação plena das exigências do corpo e do espírito, evocando sentimentos de segurança, conforto e tranquilidade. Na prática, a sensação de bem-estar pode ser fomentada por diferentes estratégias, desde hábitos individuais até a forma como o ambiente é construído.
Muitos estudos confirmam que um espaço com características adequadas e saudáveis contribui para o bem-estar, conforto, aumento de produtividade, melhora da satisfação e até a felicidade dos seus usuários. Essas constatações vão ao encontro da teoria que afirma que os seres humanos são 30% genética e 70% estilo de vida e interação com meio ambiente. Nesse sentido, lidar constantemente com ruídos, temperaturas ou iluminação inadequados pode causar estresse para os ocupantes do local, mesmo sem que eles percebam.
Essa relação íntima entre o homem e o ambiente construído tem sido um assunto constantemente abordado, principalmente após o contexto da pandemia, nos mostrando que a sustentabilidade ambiental caminha lado a lado com a saúde e o bem-estar dos usuários. Sendo assim, ao entender as pessoas como foco central das tomadas de decisão, o “movimento wellness” traz estratégias de projeto capazes de impactar positivamente em aspectos como alimentação, condição física, humor, padrões de sono e desempenho de quem habita os espaços. Uma abordagem a qual compreende que um edifício sustentável deve ir muito além do uso de materiais e sistemas construtivos sustentáveis, comprovando também que proporciona qualidade de vida aos seus usuários.
Em vista disso, muitas são as métricas que monitoram o desempenho energético, a redução das pegadas de carbono, prevenção de poluição e práticas sustentáveis de gestão de água em um edifício, como a conhecida certificação LEED que classifica os edifícios de acordo com os parâmetros básicos de sustentabilidade. Entretanto, além delas, têm surgido sistemas de certificações que monitoram exclusivamente os impactos dos empreendimentos na saúde e bem-estar dos seus ocupantes.
Lançada em 2014, a certificação WELL, por exemplo, é considerada a mais completa em termos de abordagem e categorias sendo a primeira no mundo a se concentrar exclusivamente na saúde e bem-estar dos usuários. Por meio de uma abordagem holística, a certificação WELL analisa sete conceitos: ar (qualidade do ar); água (qualidade da água consumida); nutrição (incentivo do hábito alimentar por meio do cultivo de alimentos); iluminação (controle de iluminação como auxílio no ritmo circadiano); atividade física (incorporação de atividades físicas no dia a dia dos usuários); conforto (térmico, acústico, ergonômico, olfativo) e mente (promoção de relaxamento e satisfação).
O processo de verificação de performance, diferentemente das outras certificações como o LEED, exige uma visita técnica ao projeto. Nessa visita são realizadas inspeções visuais e testes de desempenho para avaliar a qualidade do ar e da água, níveis de ruído, iluminância, temperatura entre outros parâmetros. Ademais, a cada três anos, o projeto deverá ser “re-certificado”, a fim de garantir a manutenção dos níveis projetuais e operacionais ao longo do tempo.
Além da WELL, vale comentar também sobre a certificação Fitwell, um guia de boas práticas de projetos para saúde e bem-estar que conta com mais 60 estratégias diferentes e 12 categorias como o nível de impacto positivo na saúde da comunidade, a equidade social, a segurança dos usuários, entre outros.
Na aplicação prática, esses preceitos são materializados em estratégias de projeto como espaços para hortas, pontos para higienização das mãos e bebedouros, dimensionamento de aberturas e controle de iluminação, inclusão de elementos que estimulam atividades físicas como escadas ergonômicas e convidativas, entre outros. Um dos exemplos mais reconhecidos do gênero é a sede da Symantec na Califórnia. Entre outras estratégias, nela foram aplicados aspectos tecnológicos — como a iluminação alinhada aos ritmos circadianos humanos, sistemas mecânicos para minimizar as vibrações e diminuir o estresse — e aspectos naturais, como a biofilia, capitalizando a conexão com a natureza e reduzindo a pressão arterial.
Com uma abordagem multidisciplinar, a arquitetura “wellness” carrega um grande potencial em fomentar mudanças comportamentais alinhadas com o desenvolvimento saudável e sustentável do ambiente construído, mas também, e principalmente, do seu usuário. Resgatar a responsabilidade da arquitetura para com o ocupante por meio de iniciativas como certificações e categorizações é fundamental. Entretanto, conforme elas são incorporadas ao mercado imobiliário acabam se tornando aspectos que agregam valor monetário aos empreendimentos. Por isso, é importante sempre analisar criticamente a efetividade das propostas e não permitir que se tornem apenas estratégias de “wellwashing”, ou seja, pensadas mais como uma jogada de marketing do que como uma melhoria genuína no bem-estar do usuário.