À medida que percorremos a partitura de pilares de madeira, paredes verdejantes e a cobertura plissada, seguindo os veios do piso e as vigas do teto que convergem numa entrada de luz, parece que o espaço sempre pertenceu a este local. Parte do parque, o pavilhão complementa a natureza ao seu redor, refletindo seus padrões, e propõe um espaço central composto por um conjunto concêntrico de mesas e bancos que inspiram as pessoas a se sentarem, dialogarem e se conectarem umas com as outras. Essa é a narrativa do Pavilhão Serpentine deste ano, projetado pela arquiteta franco-libanesa Lina Ghotmeh.
Intitulado “À table”, ele se inspira na conexão da arquiteta com a natureza e lembra do apelo francês para que todos sentem juntos à mesa, compartilhando uma refeição e conversando. Ele destaca a mesa como um laboratório de ideias, preocupações, alegrias, conexões e, essencialmente, reúne pessoas. Reflete ainda sobre os ideais arquitetônicos que podem provocar e acolher momentos de conversas coletivas.
Em contraste com o pavilhão de Theaster Gates do ano passado, Black Chapel; um espaço que inspirava contemplação e meditação, a estrutura de madeira de Lina Ghotmeh abre espaço com paredes de tela e aberturas para o seu entorno. Isso cria uma atmosfera amigável e lúdica, mantendo um senso de aspiração, já que seus elementos se projetam em direção a claraboia central. O teto baixo reduz as características deste pavilhão, apresentando ao usuário um relacionamento íntimo com a arquitetura e criando a configuração perfeita para uma mesa que dá vida a várias formas de conversa. “Em um mundo que está se tornando mais isolado, é quase radical projetar espaços democráticos para conversas urgentes”, diz a arquiteta franco-libanesa. Ela espera que, por meio da comida, arte, música e literatura, a mesa como um laboratório hospede diferentes vozes nas próximas semanas, receba múltiplas conversas, permita interações divertidas e crie memórias duradouras. A estrutura é um excelente exemplo de como o desenho de espaços pode incentivar conversas significativas e o poder que a arquitetura tem em moldar o comportamento humano. Seu uso de luz natural, escolha de materiais e posicionamento de móveis criam uma atmosfera de abertura e engajamento.
A estrutura nos lembra alguns pavilhões anteriores que exploraram temas semelhantes, como o 12º pavilhão desenvolvido pelo artista chinês Ai Weiwei e pelo escritório de arquitetura suíço Herzog e de Meuron em 2012. Esse pavilhão trabalhou com o solo em uma variedade aleatória de padrões de móveis de cortiça como uma ode às fundações de pavilhões passados e cobriu-o com uma cobertura reflexiva. Seu assento aberto, concêntrico e em forma de anfiteatro atraiu pessoas para interagir e se envolver em conversas. Outro pavilhão que explora esse tema com profundidade é o 6º pavilhão, projetado por Rem Koolhaas e Cecil Balmond com Arup em 2006. O pavilhão apresentava um formato oval, iluminado, com uma cobertura inflável flutuando acima de um espaço circular servindo como proteção durante o mau tempo. Sua iluminação constante dentro do parque atuou como um catalisador para ativar o espaço e reunir as pessoas. O pavilhão também sediou uma maratona de entrevistas de 24 horas com políticos, arquitetos, filósofos, escritores, artistas, cineastas e economistas discutindo as camadas ocultas de Londres.
Essas estruturas, juntamente com o pavilhão deste ano, contribuem para a escola de pensamento a qual argumenta que a arquitetura e os ambientes físicos não existem como espaços inertes, mas sim se tornam espaços por meio da ocupação e interação das pessoas. Dessa forma, a arquitetura existe como um relacionamento íntimo e contínuo com a conexão humana.
Gordon Pask, um polímata, descreve esse relacionamento íntimo com a arquitetura como o design de conversas. Ele considera a arquitetura um sistema conversacional na cultura humana que serve como um palco para as pessoas construírem sua própria visão do mundo interagindo com ele por meio de conversas. A arquitetura pode ser passiva ou ativa, aberta e amigável, permitindo que os usuários se sintam confortáveis, ou pode provocar a comunicação por meio de elementos de construção, móveis ou acessórios. Desde o tijolo unitário até um elemento estrutural, sistema de construção, forma geral ou interrupção do espaço físico por meio da tecnologia, os arquitetos podem usar diferentes caminhos que evocam conversas e permitem que as pessoas se conectem umas com as outras. Um exemplo radical que usa a tecnologia para explorar o espaço como interface de conversa é a Memory Cloud de Minimaforms. Instalada na Trafalgar Square em 2008, ela combinou sinais de fumaça, uma das formas mais antigas de comunicação, com mensagens contemporâneas (SMS) para criar uma atmosfera espacial de expressão coletiva. A instalação convidou as pessoas a interagirem com ela tendo conversas, à medida que mensagens individuais eram projetadas na atmosfera. Os visitantes se expressaram para entes queridos perdidos, pessoas falecidas, relacionamentos amorosos e entre si, e em resposta ao que estava sendo escrito. A Memory Cloud tinha uma maneira de construir o espaço orientada para o evento.
Ao explorar o design de conversas, o Serpentine deste ano contribui para esse discurso arquitetônico de várias maneiras. Ele apresenta a mesa como um laboratório de ideias e interação, questionando como os móveis cotidianos podem ser ferramentas radicais para criar espaços. Por meio de um ambiente aberto que complementa a natureza, ele mostra como o desenho de espaços amigáveis pode inspirar brincadeiras e interação. Elementos adicionais, incluindo comida, arte e literatura, permitirão que o espaço hospede uma infinidade de conversas nas próximas semanas. Por fim, como a estrutura é um catálogo de elementos padronizados de madeira, ela coloca a ecologia no centro do palco das conversas, lembrando os arquitetos da ética ao construir ambientes ecológicos e sustentáveis.