Se você acompanha o gigante do mundo arquitetônico BIG — com o perdão da redundância — provavelmente já deve ter visto Bjarke Ingles falar sobre sustentabilidade hedonista e como esse conceito permeia os projetos mais ousados do escritório dinamarquês.
Hedonismo (do grego hedonê, "prazer", "vontade") se refere a um grupo de teorias nas quais o prazer desempenha papel central. O hedonismo psicológico ou motivacional afirma que o comportamento humano é determinado por desejos de aumentar o prazer e diminuir a dor. Ou seja, nele o prazer é entendido como um estilo de vida, como o bem supremo, finalidade e fundamento da vida moral.
Na filosofia do BIG, entretanto, o conceito surge aliado ao termo sustentabilidade formando uma das bases do propósito da empresa “Think Big”, abrangendo projetos que possuem uma preocupação social, mas são voltados a diversão. Seguindo esse raciocínio, o escritório desenvolve a infraestrutura tendo como objetivo principal a felicidade e o bem-estar dos seus usuários. Já em conjunto com os preceitos da sustentabilidade, o hedonismo se materializa em projetos que não penitenciam o planeta, afinal, segundo próprio Bjarke Angles, não há nada de bom em poluir os oceanos a ponto de você não pode nadar neles. O hedonismo, portanto, é isso: aproveitar a vida, passear pela cidade de bicicleta, em vez de ficar preso em um congestionamento dentro de um automóvel.
Na prática, o conceito foi desenvolvido pela primeira vez enquanto o escritório trabalhava no Copenhagen Harbor Bath, quando a demanda por um porto limpo, seguro e pelo acesso à água provou ser não apenas uma necessidade ambiental, mas também uma vantagem para a qualidade de vida geral dos moradores de Copenhague. Este, entretanto, foi apenas o primeiro projeto de muitos que viriam a surgir sob a mesma égide. Entre eles, vale destacar o House 8, edifício de uso misto de 61.000 m² em forma de gravata borboleta que oferece um percurso público contínuo, estendendo-se do nível da rua até a cobertura, por meio do qual é possível pedalar serpenteando as moradias e seus jardins do térreo ao topo. E também a CopenHill, usina de energia com pista de esqui na cobertura que, segundo Ingles, é um projeto que se transforma no alicerce da vida social da cidade — sua fachada é escalável, sua cobertura é caminhável e suas pistas são esquiáveis. Um exemplo claro de sustentabilidade hedonista — quando uma cidade sustentável não oferece apenas o melhor para o meio ambiente, mas também é mais agradável para a vida de seus cidadãos.
Ainda sobre esse último projeto, o fundador do BIG o reconhece um exemplo do poder que a arquitetura tem em mudar o mundo, de dar forma ao futuro no qual queremos viver. O projeto dita outras regras, por meio das quais as novas gerações não se lembrarão de que houve um tempo no qual não era possível esquiar na cobertura de uma usina ou escalar suas fachadas.
Sendo assim, o conceito de sustentabilidade hedonista instiga os arquitetos a irem mais além das normativas mostrando que, em vez de transformar qualquer projeto em um dilema político ou moral, eles deveriam se concentrar no estilo de vida que os usuários terão na obra construída, materializando uma forma onde serão capazes de encontrar o que desejam, seja por meio de experiências prazerosas, qualidade de vida ou pela valorização dos aspectos sociais.
Ingles, inclusive, já chegou a afirmar em entrevista que considera o modernismo brasileiro hedonista pois, ao contrário da tradição anglo-saxã, que – segundo o arquiteto – reduziu as construções a caixas monótonas, no Brasil é possível encontrar um modernismo expressivo, imaginativo e provocativo, citando como exemplo as arquiteturas que conheceu em Ipanema e Copacabana. Trata-se, segundo a sua visão, de uma infraestrutura criada para a felicidade, como as lajes nas coberturas que, apesar de terem sido construídas para satisfazer soluções mecânicas, foram apropriadas como terraços voltados ao lazer dos moradores.