Quando Kisho Kurokawa projetou a icônica Nakagin Capsule Tower em 1972, a estrutura pretendia concretizar os ideais do metabolismo, experimentando ideias de crescimento e adaptação inspiradas em processos biológicos. Este estilo arquitetônico surgiu no Japão pós-guerra com o objetivo de criar edifícios e megaestruturas que se assemelhassem a organismos vivos, capazes de evoluir, expandir, contrair e se adaptar às mudanças do ambiente. Seguindo essa filosofia, a Nakagin Tower era composta por 140 unidades de cápsulas idênticas, cada uma fixada individualmente em dois eixos centrais. As cápsulas deveriam ser substituídas e atualizadas a cada 25 anos, permitindo flexibilidade e mudança. No entanto, essa inovação se revelou impraticável. Quase 50 anos após a sua construção, a torre foi parcialmente demolida. No total, 23 cápsulas foram preservadas para serem reutilizadas. Atualmente, essas cápsulas estão espalhadas pelo mundo e continuam representando os ideais metabólicos.
Em 2014, o Projeto de Preservação e Restauração da Nakagin Capsule Tower foi iniciado com a colaboração dos proprietários, moradores, associações de administração e arquitetos da Kisho Kurokawa Architects. O objetivo inicial era realizar os princípios do metabolismo, que incluíam a substituição das cápsulas. No entanto, em 2021, ficou evidente que a torre seria demolida devido a preocupações com a integridade estrutural e a presença de amianto. Nesse ponto, o foco do projeto foi alterado para tentar salvar o maior número possível de cápsulas. Tatsuyuki Maeda, um ex-morador, liderou uma organização sem fins lucrativos que conseguiu remover 23 cápsulas da torre antes da demolição, em 2022.
Inicialmente, as unidades eram comercializadas para empresários que vinham regularmente a Tóquio. Elas apresentavam um espaço habitacional mínimo de apenas 10 metros quadrados. Além do banheiro individual, cama e mesa dobrável, as unidades incorporavam tecnologias de ponta da década de 1970, incluindo um toca-fitas, uma TV e um telefone de disco.
Após um processo desafiador de remoção supervisionado pela equipe da Kisho Kurokawa Architects and Associates, as cápsulas foram armazenadas em um depósito na província de Chiba, próxima a Tóquio. Das 23 cápsulas, 14 serão restauradas à sua condição original, incluindo todos os aparelhos eletrônicos com os quais foram equipadas. As demais unidades recuperadas foram despojadas, permitindo que seus novos proprietários redesenhassem os espaços interiores, conforme relatado pelo The Guardian.
De acordo com o Los Angeles Times, algumas cápsulas foram inicialmente exibidas do lado de fora do Museu de Arte Moderna de Saitama, que é outro edifício projetado por Kisho Kurokawa. No início deste ano, a Cápsula A1302, que anteriormente pertencia ao arquiteto da torre, foi adquirida pelo Museu de Arte Moderna de São Francisco (SFMOMA) nos Estados Unidos. Esta estrutura agora faz parte da coleção de exposições de arquitetura japonesa do museu, que inclui também obras de Fumihiko Maki, um colega de Kurokawa no movimento metabolista, e uma série de fotografias de Noritaka Minami, que documentou a vida na torre durante a década que antecedeu sua demolição.
É tão raro poder colecionar uma peça de arquitetura em escala 1:1. Ela pode ficar do lado de dentro ou do lado de fora, e isso é fenomenal para nós. Os metabolistas combinam bem com Lebbeus Woods e Archigram, que também estão na coleção. Geralmente é difícil encontrar material relacionado ao metabolismo em oferta. - Jennifer Dunlop Fletcher, curadora de arquitetura e design do SFMOMA
Uma das cápsulas foi adquirida pela empresa siderúrgica Yodogawa Steel Works, com sede em Osaka, conforme relatado pelo Japan Times. A cápsula passou por uma redução de peso e rodas foram adicionadas, transformando-se na "Moving Nakagin capsule". Esta cápsula modificada foi exibida em diversos locais no Japão, como a Sala de Ciência Shin na Universidade de Tecnologia do Campus de Niigata e a sala de exposições da fábrica em Ichikawa, e agora representa a YODOKO+, marca de design da empresa.
Outras duas cápsulas serão instaladas pela empresa de entretenimento Shochiku em um centro de promoção cultural que será inaugurado em Ginza, Japão. Conforme informado no instagram do Projeto de Preservação e Restauração da Nakagin Capsule Tower, essas estruturas farão parte do projeto "SHUTL" e serão transformadas em espaços criativos para a exposição de obras de arte de artistas contemporâneos. De acordo com o site do projeto, a inauguração está marcada para 12 de outubro, com uma exposição intitulada "Metabolismo Tradicional - Palavras e Letras", que apresentará obras de Tahi Saika, Shun Sasaki, Masahide Matsuda e Ryu Mieno.
O Museu de Arte Moderna de Wakayama anunciou que irá expor a cápsula número A908, que chegou à instituição em 24 de agosto de 2023. O próprio museu foi projetado por Kisho Kurakawa e concluído em 1994. De acordo com o comunicado, os visitantes só terão acesso à parte externa da cápsula, mas existem planos para abrir o interior em uma data posterior.
Queremos adotar uma abordagem inclusiva, já que o edifício foi apreciado por uma ampla gama de pessoas. Desejamos continuar a empreender esforços inovadores para preservar as cápsulas como parte da história." - Tatsuyuki Maeda para The Japan Times
Embora algumas das cápsulas ainda não tenham destino, Maeda espera que elas se tornem acessíveis ao público por meio de museus, centros culturais, hotéis e outras instituições ao redor do mundo, mantendo assim os ideais do Movimento Metabólico e estimulando a imaginação de pessoas em todo o mundo. Para os entusiastas da arquitetura de Kurokawa, há também a oportunidade de reservar uma noite na "Capsule House K" por meio do AirBnB. Este edifício anterior do arquiteto, considerado como "o irmão mais novo" da Nakagin Capsule Tower, está situado nas montanhas próximas a Karuizawa e apresenta cápsulas semelhantes com janelas circulares, demonstrando os princípios e experimentos de Kurokawa relacionados às ideias do Movimento Metabólico.
Em uma abordagem diferente de preservação, a consultoria digital japonesa Gluon utilizou tecnologias avançadas de digitalização 3D para documentar minuciosamente e registrar o edifício antes de sua demolição. Esses esforços possibilitaram a recriação virtual do prédio, permitindo que as pessoas o experimentassem digitalmente, o que cria oportunidades para pesquisa acadêmica e novas atividades criativas. A equipe também desenvolveu um sistema de Realidade Aumentada (AR) que permite que smartphones exibam o prédio em 3D e oferece a chance para os interessados explorarem as cápsulas como se estivessem em um videogame. Os direitos de reconstruir a torre, tanto no metaverso quanto no mundo real, estão sendo leiloados em sites de NFT, o que levanta discussões interessantes sobre a identidade de réplicas arquitetônicas.