O conforto ambiental é um dos quesitos que contribui para o bom desempenho da arquitetura. Nos memoriais descritivos de projeto, frequentemente a incidência de iluminação e ventilação naturais são pontuadas como características vantajosas que agregam à estética e ao funcionamento do programa. De certa maneira, o conforto ambiental é parte da função do edifício, não está necessariamente ligada à atividade que ocorre no interior da construção, mas definitivamente tem parte no desenrolar dela.
Para garantir o pleno funcionamento do programa, aproveitando-se da melhor orientação em relação à luz e ventilação locais, as aberturas no volume arquitetônico se fazem necessárias. O jogo de massa e vazio também é parte do que faz o ato de projetar tão fascinante. Contudo, alguns projetos – por motivos diversos – pedem volumes mais fechados, ou algum tipo de barreira visual em determinada fachada. Como conciliar a tectônica com a entrada de iluminação e ventilação naturais?
A fachada com elementos vazados – como cobogó ou muxarabi – são uma ótima solução. Filtram a quantidade de luz que incide sobre a construção, barram visualmente seu interior, protegem de intempéries como a chuva, mas não impedem a circulação de ar. Dependendo do tamanho das aberturas, a visão de dentro para fora (e vice-versa) pode ser mais nítida ou mais opaca, mas um dos efeitos mais marcantes é a textura visual da interpolação entre cheio e vazio.
Além disso, o aspecto interessante é que, mesmo como elemento vazado, e com a textura – que oferece possibilidades múltiplas de desenhos –, a noção tectônica não se perde. O volume ganha um aspecto de leveza, é verdade, mas continua sendo compreendido como uma forma íntegra. Essa noção permite também que os arquitetos se aproveitem da forma – que lhes é cara – sem que percam pelo lado bioclimático. Exemplos não faltam, confira.
Casa dos Tijolos Brancos / BLOCO Arquitetos
“O nível de visibilidade através dos tijolos reflete os diferentes níveis de privacidade que são desejados para cada ambiente interno. O assentamento vazado entre os tijolos também permite a ventilação natural cruzada. Trata-se, portanto, de uma 'segunda fachada’ que tem a função de controlar a insolação direta e a privacidade desejadas. Os tijolos possuem tamanhos alongados, fora do padrão do mercado, encomendados especificamente para essa obra.”
Casa Senses / UP3 Arquitetura
“[…] todo o piso da casa foi revestido com réguas de madeira, as paredes e pórticos com placas de mármore travertino e as esquadrias de alumínio da fachada principal (que funcionam como brises pivotantes) receberam pintura especial com aparência de madeira e fechamento em trama de palhinha, no lugar do vidro tradicional.”
Edifício comercial da rua Bruce / Carr
“Os pilares são posicionados e utilizados para fornecer proteção solar passiva contra o sol poente, enquanto a alvenaria de tijolos permite a entrada de luz natural filtrada e uma camada de articulação na fachada, enquanto as varandas profundas protegem os vidros e oferecem amplas comodidades ao ar livre para os inquilinos desfrutarem.”
Casa e Pousada Griya Kos Nawastika / Saturasi Architects
“A fachada é a primeira impressão, consistindo em uma disposição de concreto e tijolos vazados para absorver a luz natural do leste. Os materiais são dispostos aleatoriamente e possuem profundidades variadas para conferir a este volume uma aparência chamativa.”
Doca Grid / Matt Fajkus Architecture
“A estrutura de aço e as telas são deliberadamente acentuadas e refinadas para fornecer luz difusa e sombra, ao mesmo tempo, em que refletem a luz ambiente e os tons quentes da madeira, pedra, água e vegetação natural ao redor.”
Casa Esten / Estudio Tecla
“Assim, a imagem é composta por uma sucessão de módulos com diferentes níveis de opacidade de acordo com sua função: alguns cegos materializados em chapa fornecem privacidade, outros semitransparentes materializados em policarbonato deixam passar a luz mas protegem da chuva; e outros completamente permeáveis, desmaterializados, permitem ser atravessados.”
Salão Boudoir / Macaw Studio
“No térreo uma contínua parede de cobogó em linha orgânica envolve o prédio, trazendo personalidade e suavidade para a fachada. […] No segundo piso a estrutura com malha metálica serve de suporte para o crescimento da vegetação, que com o tempo criará uma nova textura para as fachadas. Assim como o cobogó, permitirá a entrada de iluminação e ventilação natural enquanto garante privacidade aos ambientes superiores.”
Casa Amarelinho / Perelopes Arquitetura
“[…] os elementos vazados trazem a privacidade para todo o térreo, sem bloquear ventilação. […] O cobogó está presente em vários elementos na fachada, assim evitamos muros escondidos e sem ventilação e permitimos a entrada de luz, visibilidade, parte dessa protegida por vegetação e ventilação.”
Casa Muxarabi / Studio Heloisa Fogaça
“Sua fachada posterior garante que a vista em seu pavimento térreo seja ininterrupta, com a solução de painéis em vidro em toda sua extensão. Já no pavimento superior, foi instalado um sistema de portas camarão com muxarabi em alumínio texturizado para controle solar, formando efetivamente uma fachada auto sombreada.”
Casa Kenz / Srijit Srinivas - ARCHITECTS
“Os tijolos à vista foram cuidadosamente colocados uns sobre os outros, com perfurações semelhantes a treliças em intervalos para ventilar e iluminar os espaços internos criando um belo jogo de luz e sombra. O telhado inclinado enfatiza ainda mais a arquitetura amigável ao clima, reduzindo o calor e drenando a água rapidamente durante os meses de monções intensas.”
Espaço Musical / Reinach Mendonça Arquitetos Associados
“O partido arquitetônico foi criar uma grande fachada em cobogós protegendo a estreita varanda que existia entre sala e frente do lote, e ainda eliminar gradil e muro lateral, no sentido de conectar toda a frente com os espaços públicos. O novo cobogó daria identidade e visibilidade ao conjunto - que com a ausência de barreiras ficaria todo mais integrado às áreas comuns da cidade.”
Mesquita Muxarabi / NUDES – Nuru Karim
“O projeto explora padrões geométricos islâmicos tradicionais com diferentes tamanhos de aberturas para criar chamativos padrões de luzes e sombras. […] O volume opaco da sala de oração está envolvido por um outro de muxarabis, criando uma circulação ao redor do primeiro. Esta pele também protege o edifício do intenso calor do verão. O muxarabi está fundido no concreto e explora uma variedade de perfurações.”
Este artigo é parte dos Temas do ArchDaily: A pele do edifício. Mensalmente, exploramos um tema em profundidade através de artigos, entrevistas, notícias e projetos de arquitetura. Convidamos você a conhecer mais sobre sobre os temas do ArchDaily. E, como sempre, o ArchDaily está aberto a contribuições de nossas leitoras e leitores; se você quiser enviar um artigo ou projeto, entre em contato.