Explorando as cabanas vernaculares africanas: tecelagem como arquitetura social e bioclimática

Tecer não é apenas uma habilidade técnica, mas também uma forma de projetar experiências materiais. O envolvimento no processo da tecelagem nos permite estruturar, comunicar, refletir e conectar nossos desenhos. Ao experimentar diferentes estruturas de tecido, temos insights sobre como os materiais se comportam sob tensão e compressão. Esse entendimento nos ajuda a ultrapassar os limites dos materiais, resultando em estruturas que ampliam e testam as propriedades dos elementos.

Na arquitetura, o tecer como mecanismo de construção centraliza o abrigo no processo construtivo. Nesse sentido, ele se torna uma manifestação direta da produção material. Além disso, a tecelagem oferece inúmeros benefícios ambientais e sociais ao criar abrigos que interagem ativamente com materiais, ferramentas, tecnologias e potenciais criativos, apoiando assim o placemaking.

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A cabana redonda é uma característica marcante em muitas culturas africanas, conhecida por vários nomes entre diferentes tribos. Em Angola é chamada de Mbukushu, na Botsuana é Dumela, na Etiópia é Dorze, e assim por diante. Como uma forma arquitetônica simples, ela reflete o ritmo circular natural das culturas indígenas, onde reuniões sociais e conselhos eram realizados em círculos ao redor de um ponto focal. Várias técnicas de construção utilizando pedra, tijolo ou barro são usadas na região, mas o tecer se destaca, pois cria uma superfície contínua para a cabana, esfumaçando a distinção entre paredes e telhados. O uso intricado do tecer também serve como uma infraestrutura social, reunindo técnicas comunitárias no processo de construção e adaptando a cabana ao clima local. Estudos aprofundados de cabanas africanas selecionadas, como cabanas Zulu, cabanas Dorze e cabanas Nama, revelam sua natureza como arquitetura sócio-climática.


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Cabanas Zulu

As cabanas Zulu são estruturas em forma de cúpula que serviram como moradias vernaculares primárias do povo Zulu. Essas tradicionais cabanas em formato de colmeia são conhecidas como iQukwane. Para construí-las, uma estrutura é criada primeiro ao redor de um perfil circular, com pilares de madeira curvados para dentro, em direção ao centro. A estrutura é, então, coberta por uma palha trançada, resultando em uma cúpula. Uma grade de cordas é adicionada do ponto mais alto até a superfície da cabana, dando suporte ao trançado e contribuindo para o caráter arquitetônico único que define a identidade dessas casas vernaculares.

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Cabana Zulu, África do Sul. Imagem © Graham Rye/Flickr

A construção de cabanas nas comunidades Zulu seguia um processo estruturado que incentivava a interação social. Os homens eram responsáveis por coletar os galhos e organizá-los em um padrão circular no chão. Eles, então, teciam um padrão estrutural em direção ao ponto mais alto, levando em consideração o tamanho da cabana. Por outro lado, as mulheres eram responsáveis por amarrar e cobrir a estrutura usando junco trançado e capim. Além disso, um tronco de árvore central fornecia suporte para a cabana. A porta é intencionalmente baixa para regular o clima interno e controlar a entrada de pessoas no espaço.

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Estrutura da cabana Zulu. Imagem © Graham Rye/Flickr
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Interior das cabanas Zulu. Imagem

Ao tecer madeira e junco de forma intrincada, foram criadas respostas vernaculares ao clima. Essas cabanas são altamente estáveis e oferecem calor no inverno e frescor no verão. Além disso, os padrões das cabanas permitem que os usuários aqueçam o ambiente interno, pois a fumaça do fogo sai pela porta ou pela palha, e tem o efeito de fumigar constantemente a cabana.

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Cabanas Zulu. Imagem © Hassan Jassim

Cabanas Dorze

Nas montanhas do Vale do Rift, no sul da Etiópia, o povo Dorze é conhecido por sua habilidade em dividir e trançar o bambu. Eles utilizam essa técnica em vários aspectos de suas vidas, como a construção de cercas, cestos e potes de armazenamento revestidos com argila. No entanto, sua aplicação mais notável é na criação de casas inteiras, como visto na cabana tradicional Dorze.

A construção de uma cabana Dorze requer uma extensa preparação. O bambu não é usado em sua forma original redonda; em vez disso, ele é dividido, achatado e seu miolo é removido. Esse processo torna as peças de bambu flexíveis o suficiente para serem trançadas entre os pilares, que são fixados no chão. À medida que a altura da cabana aumenta, as peças são gradualmente adicionadas. Eventualmente, o construtor puxa as peças para dentro e tece anéis de tamanho decrescente até que sejam fechados e finalizados com uma coroa separada no chão. As cabanas mais simples são normalmente cobertas com palha de trigo ou cevada, enquanto as melhores são cobertas com folhas de bambu, e podem durar cerca de 10 a 20 anos.

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Processo de tecelagem de cabanas Dorze, Etiópia. Imagem © Nomad Architecture
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Processo de tecelagem de cabanas Dorze, Etiópia. Imagem © Nomad Architecture

O trançado dessas cabanas é explorado para criar formas mais altas dentro do perfil circular desejado. As casas são construídas com mais de sete metros de altura, permitindo um encolhimento gradual na medida em que a base é corroída por fungos e cupins. Normalmente, a casa perde cerca de 2 a 5 centímetros por ano. A porta principal, entre o alpendre e a casa, também é muito alta pelo mesmo motivo, sendo uma estrutura que foi feita para interagir gradualmente com a natureza e o tempo. Nesse sentido, a porta e o alpendre das cabanas são trançados novamente a cada poucos anos, trazendo constantemente construtores e artesãos para interagir com as técnicas do material.

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Processo de tecelagem de cabanas Dorze, Etiópia. Imagem © Nomad Architecture

Cabanas Nama 

Nos vales do deserto Richtersveld, na Namíbia, ainda é possível encontrar assentamentos tradicionais Nama, onde suas casas vernaculares podem ser vistas. São cabanas em forma de cúpula, construídas com galhos e esteiras trançadas de junco. Originalmente projetadas para o estilo de vida nômade do povo Nama, essas casas são leves e fáceis de serem desmontadas e reconstruídas em um novo local quando os recursos de uma região se tornam escassos. O aspecto de montagem é evidente nas esteiras trançadas, que são feitas em painéis de vários tamanhos para transporte e acoplamento conveniente.

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Cabanas Nama “matjieshuis”. Imagem

Para construir essas cabanas, galhos estruturais são inseridos em orifícios perfurados no chão, criando uma base circular. Em seguida, os galhos são montados em forma de favo de mel. Cuidadosamente, eles são posicionados e amarrados usando entre 20 e 40 esteiras por cabana. Essas cabanas são perfeitas para o clima quente e a terra seca tipicamente habitados pelo povo Nama. As esteiras trançadas permitem a entrada de luz e a ventilação, e em caso de dias chuvosos raros, os caules das esteiras porosas absorvem água e incham, mantendo o interior da cabana seco. Durante o inverno, as paredes internas são cobertas com peles de animais para isolamento adicional.

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Tecelagem de cabanas Nama “matjieshuis”. Imagem© Sachi Graber

Como forma de arquitetura social, tanto mulheres quanto homens participam da construção dessas cabanas. O processo de construção das esteiras e montagem das cabanas é cuidadoso e meticuloso, reconhecido como uma verdadeira arte dos Nama. As mulheres preparam as esteiras usando juncos de rio, coletando-os e secando-os ao sol. Em seguida, elas os cortam no comprimento desejado e os tecem em esteiras usando cordas feitas à mão. Os homens coletam os galhos, removem os espinhos e os passam pelo fogo para dobrá-los e curvá-los na forma desejada. Depois disso, os galhos são devolvidos ao chão por alguns dias para alcançar a estrutura e curvatura adequadas.

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Cabanas Nama “matjieshuis”. Imagem © Henn Lab
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Tecelagem de cabanas Nama “matjieshuis”. Imagem © Henn Lab

Em conclusão, essas cabanas revelam a natureza intrincada do tecer como uma infraestrutura social e bioclimática. Outros estudos de caso, como as cabanas Tukul e Mursi, cabanas Hadzabe e cabanas Maasai, demonstram a importância cultural das técnicas de tecelagem na criação de formas arquitetônicas únicas que envolvem materiais, clima e comunidade. A tecelagem não só contribui para a estabilidade estrutural e a adaptabilidade ambiental destas cabanas, mas também reflete a rica herança cultural e as tradições das sociedades africanas. Por meio da arte da tecelagem, estas habitações vernculares incorporam uma mistura harmoniosa de artesanato, funcionalidade e beleza estética.

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Sobre este autor
Cita: Yakubu, Paul. "Explorando as cabanas vernaculares africanas: tecelagem como arquitetura social e bioclimática" [Exploring African Vernacular Huts: Weaving as a Climatic and Social Architecture] 01 Fev 2024. ArchDaily Brasil. (Trad. Ghisleni, Camilla) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/1012691/explorando-as-cabanas-vernaculares-africanas-tecelagem-como-arquitetura-social-e-bioclimatica> ISSN 0719-8906

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