Que forma tem o uso?
O arquiteto pensa em ambos, porém só a forma se concretiza.
E por isso põe sobre ela mais atenção e dedicação.
Que forma tem o comer?
Que forma tem o dormir?
Que forma tem o caminhar?
Diretamente: nenhuma.
As ações são absolutamente efêmeras.
Não decantam ou não podem se congelar numa forma.
E ainda que pudessem, essa forma congelada teria pouco a ver com a forma da ação que lhe deu origem.
Talvez a melhor forma do comer seja a colher.
Talvez a melhor forma do dormir seja a cama.
Talvez a melhor forma do caminhar seja a rua.
Mas que relação existe entre a colher e o ato de comer?
Formalmente: nenhuma.
A colher responde à boca e à mão, porém não objetivamente ao comer.
Não obstante, a forma da colher possibilita o comer (coisa que um prato parece não fazer).
Portanto, penso que a forma de uma ação é aquela que detém a possibilidade de produzi-la.
Assim, a forma do beber será sempre as duas mãos juntas, com os dedos inclinados produzindo uma concavidade.
Tal forma não é uma tradução direta da urgência do beber, mas a forma mais essencial que o possibilita.
A forma de uma ação surge da necessidade dessa ação, e ao mesmo tempo possibilita essa ação, agora na realidade física compartilhada.
Logo, o importante e necessário é a forma que possibilita a ação, e não a ação que pede por uma forma.
Embora a urgência de uma necessidade seja o primordial, só a forma que possibilita tal ação é capaz de revelá-la e enaltecê-la.
Há ainda a revelação e enaltecimento outorgado pelo teatro, cujo centro está na forma das ações. Mas assim como estas, ele também é efêmero.
Somente as formas são permanentes.
É através delas que as ações, as necessidades e usos, podem ser entrevistos e recobrar existência, ainda quando já não exista motivo para tanto.
As formas conservam as ações, os anseios e as necessidades do homem.
É preciso saber vê-las (as ações) e por que caminho buscá-las.
Porém,
Talvez a melhor forma do comer seja a mesa: onde se reúnem muitos para uma ação compartilhada do comer.
Talvez seja o prato, que abriga a comida, sustenta a colher, e dá razão à mesa.
Talvez seja a cadeira, que une o homem à mesa, ao prato e à colher.
Talvez o comer tenha múltiplas formas complementárias.
Talvez seja apenas uma delas a forma essencial.
Talvez só tenha sentido a totalidade de ações em conjunto.
Talvez o comer peça por distintas formas.
O arquiteto deve criar cada uma delas.
Qual é a forma do habitar?
Essa é a pergunta fundamental da arquitetura.