Em nossas cidades, certos processos tendenciais tornam-se estruturais. As políticas públicas consagram, através do tempo, essas lógicas de consolidação. Tal é o caso da qualificação crescente das áreas centrais em detrimento das áreas periféricas. Em geral, conformam-se centralidades em torno da área de fundação da cidade, o que conflui logo a um encadeamento radial de subcentralidades urbanas de diferentes hierarquias.
A dependência a um centro urbano hegemônico condiciona o desenvolvimento da cidade. As transformações propostas vêem-se restritas por essa estrutura condicionante e a ausência de centros cívicos que construam centralidades de bairros condicionam o sistema de centralidades urbanas. A partir do cenário planejado, estabeleceram-se alguns critérios para construir centralidades cívicas nos bairros a partir de uma série de estratégias de articulação espacial e funcional na trama aberta local.
Diretrizes emergentes
Um dos objetivos de toda política deveria ser o incremento da diversidade social no espaço para abordar problemas de desintegração social. O fortalecimento das identidades territoriais e do sentido de pertencimento a um bairro é uma maneira efetiva de intervenção para assegurar um maior acesso à cidade. A ação direta com centralidades cívicas sobre as áreas guetificadas, superpovoadas, de favela e degradadas, irá gerar uma cidade mais inclusiva.
Dado que a qualificação diferencial do território acentua assimetrias, o desenvolvimento de centros cívicos constitui uma ferramenta indispensável para a rearticulação social e construção de cidadania e a aplicação de estratégias de construção de centralidades cívicas em áreas degradadas contribuirá para melhorar a qualidade da vizinhança. A partir da situação examinada, considera-se que o caráter monofuncional de uma centralidade urbana desativa as qualidades de um centro cívico.
Qualidades a recuperar
Torna-se necessário recuperar as subcentralidades pré-existentes com critérios de inclusão de usos culturais e de lazer, capitalizando a rede de transporte público para prover de acessibilidade e promovendo peças urbanas polifuncionais com arquitetura singular nos diferentes bairros. Assim mesmo, é indispensável que a construção de toda centralidade cívica seja produzida mediante uma rede de nós articulados sobre o território e que se constitua, por sua vez, em instrumento dirigido a redensificar determinada área. Em função das diretrizes planejadas, definem-se, a seguir, qualidades a recuperar um centro cívico de bairro:
- Governo Comunitário sede de autoridades comunitárias espaço consultivo.
- Gestão Administrativa: trâmites, casamentos, documentos, aluguéis, etc.
- Escola de Vizinhos: espaço de deliberação para propostas de vizinhança.
- Segurança Cidadã: espaço vicinal de gestão de corredores seguros.
- Contenção familiar: assistência a mães solteiras, vícios, psicologia.
- Assistência Sanitária: atenção primária, medicina preventiva, vícios.
- Integração Social: espaços para a terceira idade, mulheres, crianças, adolescentes.
- Centro Cultural: exposições, mostras, oficinas, cursos, etc.
- Museu Itinerante: cinema, teatro, rádio, galerias de arte, livrarias, café cultural.
- Assistência Escolar: jardim de infância, reforço escolar, cursos de formação, etc.
- Reinserção Laboral: carpintaria, serralheria, mecânica, pintura, alvenaria.
- Oficinas de artesanato: artesanato, culinária, costura, pintura, desenho, etc..
- Feiras e Mercados: espaços de venda de artesanatos e produtos orgânicos.
- Hortas Comunitárias: hortas pessoais e/ou comunitárias, botânica, viveiros.
- Centro para Cooperativas: apoio e fomento para o desenvolvimento de cooperativas.
- Centro do Imigrante: espaço de fomento e inclusão da diversidade étnica.
Em consequência, a conformação de centralidades cívicas é concebida como ferramenta de recuperação do tecido social e urbano de um bairro onde, mais que concepções nodais, constroem-se redes articuladas além das funções administrativas, incorporando vistas mais amplas relacionadas com a assistência escolar, a reinserção laboral, o desenvolvimento cultural e a segurança. O desafio é construir a cidade com equidade e, desde tal perspectiva, esses protótipos apontam a consolidação de uma trama aberta local.
O presente artigo sintetiza resultados preliminares do projeto denominado: “Projeto de protótipos de centralidades cívicas para a Cidade de Buenos Aires. Estratégias de articulação espacial e funcional na trama aberta local”.
Orientação: Guilhemo Tella
Co-orientação: Andrés Borthagaray
Equipe: Carolina Huffmann, Belén Agostini, Marina Garro e Érika Hassan. Facultade de Arquitetura da Universidad de Palermo.