Jaime Sanz Haro, do coletivo ARKRIT, nos convida a refletir no artigo originalmente entitulado "Normativa, el nuevo tratado arquitectónico: Vitrubio, Alberti, Paladio, y el Plan General" sobre o papel e as consequências dos marcos regulatórios no urbanismo.
Se a legislação urbana foi, algum dia, um método efetivo de controle de nossos excessos, há tempos ela se transformou em um excesso por si mesma.
Corresponsável por alguns dos fenômenos urbanos mais recentes e pelos erros experimentados na Espanha, parece necessário começar a assumir que é ela, e não nossa própria vontade, a autêntica ideóloga subjacente na maior parte das propostas arquitetônicas contemporâneas.
Neste sentido, parece possível afirmar que esse marco regulatório, que esqueceu há muito tempo de seu objetivo de ser um método de controle racional e de orientação de nossos impulsos mais estridentes, se transformou no contexto atual em uma linguagem em si mesmo e em uma forma de fazer as coisas com vida própria o que, inevitavelmente, conseguiu deslocar uma grande parte de nosso ideário arquitetônico e urbanístico a posições estritamente teóricas ou acadêmicas.
Caberia pensar de forma otimista que a legislação é, no entanto, um simples entendimento inculto da cidade, ou então, a incapacidade daqueles que projetam e projetaram. Longe disso, a cidade legislada, isto é, que segue regras definidas, é, em sua aparente neutralidade, um projeto absolutamente ideológico.
Através de processos de progressiva redução de densidade de tecidos urbanos, da aplicação de geometrias urbanas orientadas pelo tão conhecido conceito da rotunda, ou da setorização excessiva dos usos da cidade, a cidade legislada é em sua essência uma serva do sistema econômico que demanda o uso constante do transporte privado ou da situação do pequeno comércio pela grande superfície. A cidade, que por meio desses métodos de controle se faz tão previsível, passa a ser entendida como um organismo de controle de comportamentos.
Por fim, nos concentremos nosso olhar e imaginação em algumas das milhares de imagens que essa cidade legislada nos proporciona. Comprovaremos que a ideia que nos vem à cabeça é a de uma cidade constantemente igual, constantemente idêntica. Sua razão de ser, sua estética, o essa coleção de grandes construções maciças empilhadas umas sobre as outras, não são produto de nenhuma reflexão ou nenhuma vontade.
Sua razão de ser nasce do conjunto de decisões tomadas como resposta de uma legislação irracional, assim como da coleção de artifícios que utilizamos para tirar partido disso. Nesse jogo de excessiva identidade, de estética imposta e de controle programado, a arquitetura e a cidade perdem a oportunidade de se mostrarem sensíveis a todos aqueles estímulos que conseguiram, desde sempre, torna-las melhores e mais cultas, isto é, a tradição, a reflexão sobre o programa, a beleza e, por fim, a sociedade. Se, de alguma forma, não conseguirmos controlar aos que nos controlam, será necessário assumir que qualquer Plano Geral tem mais importância do que Vitruvio jamais teve.