Arquitetos da era moderna são personagens que ainda hoje despertam as mais diversas fantasias através de seus projetos e (controversas) histórias de vida. Tomemos como exemplo a paixão que Le Corbusier nutria pela arquiteta Eileen Gray e a sua relação com o projeto da Casa E.1027, a qual ela havia projetado para seu amante, Jean Badovici, então amigo pessoal de Corbu. Sabe-se que o famoso arquiteto franco-suíço, procurando desesperadamente chamar a atenção de Gray, decidiu entrar na casa sem sem convidado, e começou a pintar grandes murais coloridos em uma das paredes brancas da sala. Além disso, sabemos que Corbusier foi um dos piores críticos da obra de Gray, desdenhando publicamente das suas qualidades como projetista, ao mesmo tempo que, contraditoriamente, à elogiava em em suas cartas de amor nunca respondidas. Algo parecido aconteceu na vida de Adolf Loos. Depois de um encontro casual em Paris com a estrela em acensão de apenas 19 anos, Josephine Baker, ele decidiu simplesmente projetar uma casa para ela. Obviamente, o projeto nunca saiu do papel.
O fascínio destes dois personagens por mulheres alheias são um resumo da história de um das mais famigeradas publicações periódicas do mundo, a revista Playboy. Entretanto, para além do seu conteúdo explicito, desde seus primórdios os editores da revista se esforçaram para promover um estilo de vida pontuado pelo design moderno, celebrando algumas das mais importantes figuras (masculinas) no mundo do design americano. Em um esforço para promover a revista como uma publicação moderna e de vanguarda, os editores entrevistavam com frequência alguns dos mitos da arquitetura americana, como Mies van der Rohe, Buckminster Fuller e Eero Saarinen, aproximando tais figuras de um público, que apesar de devoto a harmonia das formas, era totalmente iletrado em arquitetura.
A Playboy foi uma das primeiras revistas de “life-style” do mundo a tirar proveito do potencial da arquitetura e do design para disseminar a sua mensagem e promover o seu produto. Hugh Hefner e sua equipe de editores, que pouco entendiam de arquitetura e design, sabiam muito bem como construir imagens e cenários. A revista foi responsável pela criação de uma nova persona, ou novo homem, ditando a maneira como as pessoas deveriam se vestir, quais drinks elas precisavam beber, como deveriam agir, e que tipo de móveis deveriam comprar para a sua casa. Todo o conteúdo promovido pela Playboy no contexto do design e da arquitetura, muito além do próprio teor manifesto da revista, é um sinal de que os espaços projetados para a seduzir chegaram a ser tão importantes quanto a nudez das belas mulheres que estampavam as suas páginas. Apenas nas suas duas primeiras décadas, a Playboy já havia publicado em detalhe a Casa de Charles Moore em New Haven, a Casa Elrod e Ant Farm’s House of the Century de John Lautner. A revista também celebrou a figura de Frank Lloyd Wright de maneira ousada, afirmando que a sua vida amorosa era tão excitante quanto seus edifícios.
Uma das mais famosas fotos da história da Playboy, foi tirada sobre uma Cadeira Borboleta BFK branca, criando uma harmonia perfeita entre sujeito e objeto – um efeito que, sem qualquer esforço, cativa o leitor instigando a sua curiosidade não apenas para o sujeito em questão, mas sobre o objeto no qual a ação acontece. A maneira como a Playboy se apropriou do design e da arquitetura para se auto-promover, e vice-versa, dificilmente fugiu ao olhar dos críticos de arquitetura, como Reyner Banham, quem celebrou certa vez a influência da revista na promoção do design moderno em um artigo publicado no The Architect's Journal em 1960 intitulado “I'd Crawl a Mile for a Playboy”.
Até mesmo alguns museus de arte dos Estados Unidos se renderam a contribuição da revista para o design e a arquitetura moderna no país, incluindo uma exposição intitulada Playboy Architecture: 1953-1979, celebrada no Elhmhurst Art Museum poucos anos atrás. A mostra exibia modelos digitais especulativos de uma série de espaços e edifícios, playmates, obviamente, e móveis modernos que passaram a ser objetos de desejo na época. Outra seção apresentava alguns projetos reais onde foram realizados alguns dos ensaios da Playboy, incluindo casas com enormes cúpulas transparentes e uma residência em forma de espaço nave que parecia poder sair voando depois que a festa acabasse.
Ao longo de sua história, a Playboy se afirmou como um espaço de divulgação e promoção das principais tendências no campo da arquitetura e do design. Embora tal contribuição possa ser vista com certo ceticismo, muitas vezes encarada como uma revista pornográfica e pobre em conteúdo, é fato que a revista representa algo muito maior do que apenas a nudez feminina utilizada para promover um determinado tipo de masculinidade. É impossível falar de Playboy sem certa nostalgia, algo que nos faz lembrar da Guerra Fria e da Guerra do Vietnã, momentos em que todos nós estávamos procurando enterrar a nossa cabeça na areia, buscando uma forma de aliviar toda aquela tensão na qual o mundo estava envolto. Neste contexto a revista oferecia aos homens de plantão um estilo de vida que parecia muito além do seu alcance, mas objetos de design que eram, até certo ponto, bastante acessíveis para boa parte da população. De certa forma, a Playboy não foi apenas uma revista pornográfica, mais um showroom de móveis da Knoll. Se foi Le Corbusier quem disse que a casa deveria ser uma máquina de morar, a Playboy foi quem apresentou ao mundo a casa como uma ferramenta de sedução, e a sua influência em relação ao design e a arquitetura está se tornando – mais de sete décadas depois – cada dia mais evidente.