Em um uso revelador de big data, Raj Chetty e seus colegas no Projeto de Igualdade de Oportunidades usaram registros fiscais anônimos para rastrear, a partir da infância, a renda de pessoas que cresceram nos Estados Unidos. Os resultados mostram que os bairros e áreas metropolitanas onde essas pessoas foram criadas têm um grande impacto nas suas perspectivas econômicas durante a vida.
Surpreendentemente, crianças de famílias de baixa renda que crescem em alguns bairros, especialmente aquelas com rendas mistas e níveis mais baixos de segregação racial, se saem melhor economicamente.
A pesquisa do Projeto Igualdade de Oportunidades lança dúvidas sobre algumas panacéias tradicionais de desenvolvimento econômico (como maior oferta de empregos nas proximidades de áreas residências ou o crescimento acelerado da oferta de empregos não parecer estar associado à mobilidade social intergeracional), e dá ênfase aos efeitos que uma vizinhança exerce nas perspectivas de crescimento de uma criança.
Assim, a mobilidade intergeracional está positivamente correlacionada com o número de adultos empregados em um bairro e com as medidas de capital social que acontecem ali, sugerindo, dessa forma, que bairros de renda mista bem-sucedidos desempenham um papel fundamental para ajudar as crianças a escapar da pobreza.
Trazendo outra aspecto para a análise, eu e outros acadêmicos usamos o Walk Score — uma forma fácil de interpretar o índice de caminhabilidade — para mostrar que a mobilidade é, na verdade, um prêmio para os mercados imobiliários.
Para efeito de comparação, se todos os outros fatores de uma região forem mantidos constantes, é possível afirmar que casas em áreas caminháveis tendem a ser muito mais valiosas do que casas que dependem mais do carro.
Um crescente número de pesquisas de saúde pública também confirmam que áreas com bons índices de caminhabilidade trazem benefícios significativos à saúde: as pessoas que vivem em áreas onde é possível caminhar com qualidade andam mais e, por isso, são mais saudáveis.
Agora, vamos analisar combinando esses dois fios: a geografia da mobilidade social intergeracional e a da caminhabilidade. Um novo artigo do psicólogo Shigehero Oishi, Minkyung Koo e Nicholas Buttrick fez exatamente isso, examinou a correlação entre o Walk Score e a mobilidade social intergeracional.
Oishi, Koo e Buttrick agregaram dados das estimativas do Projeto de Igualdade de Oportunidades de mobilidade integral para zonas de deslocamento e os compararam com o nível geral de caminhabilidade da área.
As “zonas de deslocamento” são uma unidade geográfica que geralmente abrange uma área metropolitana inteira e áreas rurais circundantes. Os EUA estão divididos em 377 zonas.
Ao controlar os “cinco grandes” fatores da pesquisa Chetty et al que influenciam a mobilidade social intergeracional — porcentagem de afro-americanos, grau de desigualdade de renda, qualidade da educação K-12, capital social e porcentagem de crianças com mães solteiras —, o estudo descobriu que o índice de caminhabilidade de uma área de deslocamento acrescenta um efeito estatisticamente significativo e positivo na mobilidade social intergeracional.
A inclusão da caminhabilidade em um modelo de mobilidade social intergeracional justificou um adicional de 10% da variação nas taxas de mobilidade entre as zonas de deslocamento. Como os autores concluem:
Usando dados de impostos de quase nove milhões de americanos nascidos entre 1980 e 1982, o Estudo 1 demonstra que a mobilidade social ascendente é substancialmente maior em áreas onde se pode caminhar (r 0,390). Quanto mais fácil é percorrer uma área (conforme indexado por Walkscore.com), mais provável é que os americanos com pais de renda mais baixa atinjam a categoria de renda mais alta por volta dos 30 anos. Essa relação se mantém acima e além dos fatores anteriormente usados para explicar a mobilidade social crescente, fatores como a desigualdade de renda e capital social. E é robusta o suficiente a vários controles políticos, econômicos e demográficos, assim como, especificações alternativas de crescimento de mobilidade social e, mesmo, a terceiras variáveis potencialmente não especificadas.
Esta é uma evidência encorajadora, pois sugere que as regiões que são mais fáceis de percorrer a pé tendem a ter melhores oportunidades para crianças de famílias de baixa renda. Também pode ser que a mobilidade seja correlacionada a outros fatores, como capital social, que maximizam oportunidades.
Oishi, Koo e Buttrick exploram essas possíveis explicações observando outros dados sobre transporte e propriedade de carro, caminhabilidade e um senso de pertencimento com a área. Os dados mostram que em áreas mais transitáveis, o sucesso econômico está menos correlacionado com a propriedade de um carro, sugerindo que a mobilidade social pode ser aumentada quando há maior caminhabilidade. As descobertas sobre um sentimento de pertencimento e mobilidade intergeracional são menos claras; o relacionamento, se houver, é algo indireto:
Embora a associação direta entre caminhabilidade e mobilidade social ascendente não tenha sido significativa, aqueles que vivem em um bairro onde se pode caminhar e aqueles que caminham mais em suas vidas cotidianas sentiram um maior sentimento de pertencimento, que por sua vez foi associado à mobilidade social ascendente.
Os dados apóiam a noção de que a mobilidade está correlacionada com a mobilidade social intergeracional. Uma limitação da análise do título dos dados de Chetty et al é que eles são agregados no nível das zonas de deslocamento.
Sabemos que tanto a capacidade de caminhar quanto a mobilidade social intergeracional variam substancialmente nas áreas metropolitanas; diferentes bairros dentro de uma área metropolitana podem ser dependentes do carro ou muito fáceis de percorrer. Parece que o próximo passo lógico nesta pesquisa é verificar se essa mesma correlação é válida para áreas menores.