Os jardins sempre estiveram presentes nas composições arquitetônicas como testemunhas do momento cultural, do status e da religiosidade dos povos. Entretanto, há algumas décadas, é possível perceber um fortalecimento dessa relação entre arquitetura e espaços verdes. Uma situação que culminou em 2020, com grande aumento do protagonismo dos ambientes verdes, muito relacionado a pandemia do Covid-19 e o isolamento social que ela tem provocado. Nesse sentido, relação da casa com jardim se consolidou, de pequenos vasos em apartamentos no centro das cidades a exuberantes projetos paisagísticos dentro e ao redor de residências, representando – em diversas escalas – a busca pela reconexão com a natureza.
Estes jardins acabam por assumir diferentes funções no projeto arquitetônico, para além da estética. Dependendo do modo como são concebidos e implantados eles garantem não apenas salubridade aos ambientes, mas também segurança, funcionalidade e privacidade, melhorando a qualidade de vida dos seus habitantes.
A seguir, selecionamos alguns projetos nos quais os limites que separam arquitetura e paisagismo desaparecem, gerando composições únicas que favorecem o conjunto final, principalmente, na integração entre jardins internos e externos.
Em meio ao clima tropical da cidade de Ho Chi Minh, no Vietnã, a Okkio Duy Tan Caffe utiliza a configuração dos jardins para melhorar o conforto térmico assim como uma área de amortecimento entre os volumes antigos e novos. Um caminho separa o jardim em dois pátios, divididos por estruturas de vidro, que podem se abrir ou fechar conforme a necessidade.
Como um exemplo mais próximo da nossa realidade, a Casa Villa Lobos, possui jardins internos e externos que enfatizam e trabalham com a declividade suave do terreno. Sala de jantar e cozinha formam um espaço contínuo e estão numa cota levemente elevada em relação à calçada, meio nível abaixo está o ambiente de estar. Nesse sentido, três jardins envolvem esses programas. O jardim de entrada é marcado por uma cerejeira já existente no terreno, o jardim central intercala garagem e varanda, e, finalmente, o jardim posterior que ganha a largura total do lote e inclui uma piscina. Além disso, vale ressaltar que os pilares metálicos possuem geometrias distintas e pontuam esses espaços no nível dos jardins, representando um exemplo interessante no qual arquitetura e paisagismo se integram e se complementam.
Assim como a Casa Villa Lobos, a residência FL também surgiu por meio do estudo do terreno onde foram identificadas duas vistas marcantes: os fundos, com a bela paisagem da mata, e a frente do lote, que proporciona ampla visão do pôr do sol com o campo de laranjeiras. Como base nisso, surge um volume longilíneo com amplos e esbeltos beirais formando varandas generosas.
Seus jardins, exuberantes nas áreas externas, surgem no interior da residência de uma forma pontual, servindo para marcar o caminho principal e enfatizar a monumentalidade da longa escadaria. Além da vegetação, vale destacar que a materialidade do jardim externo também é trazida para dentro da casa, com a utilização do mesmo piso de pedra.
Em mais um exemplo brasileiro do Jacobsen Arquitetura, na Casa MLA, os jardins internos e externos se relacionam entre si através das composições paisagísticas nas bordas do terreno, como estratégia para mitigar o pequeno afastamento entre o volume e o muro limítrofe. Os jardins perimetrais margeiam tanto a área de estar ao ar livre, com piscina, quanto a sala de estar e jantar interna.
A residência RL é mais um exemplo em que o projeto surge diretamente das condicionantes naturais do terreno, materializando a exuberância natural externa também nos jardins internos. A implantação térrea do conjunto possibilita a integração do paisagismo e do jardim com a casa vizinha, sem prejudicar a privacidade de cada uma. A piscina quadrada intensifica a sensação de pátio central formado pelos três volumes, dando unidade a implantação assimétrica.
A busca pela reconexão com a natureza pode ser vista como estratégia em diversos projetos ao redor de todo o mundo. Este é o caso da residência Flick para a qual os clientes queriam um projeto que parecesse simples e aconchegante na província de Java Central, Indonésia, local de origem do proprietário e do qual ele possui boas lembranças. Para atingir esse requerimento, foram criados quatro jardins: um principal, um privado, um flutuante e um pátio interno. O jardim principal está diretamente adjacente à sala de estar familiar e limitado por uma grande porta de correr que pode ser aberta ou fechada facilmente. A presença dessa grande porta facilita a entrada e fluxo de ar em todos os cômodos no primeiro pavimento, especialmente a sala de jantar.
A existência dos jardins, além de trazer a sensação de aconchego para casa, provoca uma diminuição da temperatura, já que a circulação de ar através da vegetação refresca os espaços de forma ideal.
Entretanto, quando se fala em jardins internos e externos, não necessariamente se remete à exuberantes composições paisagísticas. Na Casa das Sibipirunas, por exemplo, os elementos verdes são trazidos para dentro dos ambientes de forma muito pontual por meio das grandes árvores que fazem parte do projeto de interiores. Logo na entrada, o visitante é guiado por uma passarela em madeira e um jardim rico em verde, proporcionando uma recepção tropical. O paisagismo, assinado por Daniel Nunes, é perpetuado pelos interiores, também graças à arquitetura transparente desenhada pelos arquitetos.
Como um outro exemplo asiático, a Casa CH, em Hanói no Vietnã, também apresenta uma composição paisagística interna pontual. A natureza tem um efeito positivos na saúde mental das pessoas, entretanto, o rápido desenvolvimento de Hanói fez com que as áreas verdes da cidade fossem praticamente extintas. Pensando nisso, os jardins interiores da casa foram pensados como momentos de descontração e relaxamento, espaços onde os moradores podem aliviar e liberar o estresse da intensa vida moderna da capital. Segundo seus arquitetos, a Casa CH não é apenas um abrigo para a família, mas principalmente um espaço de conexão entre as pessoas e entre os seres humanos e a natureza.
Assim como o projeto anterior, o jardim da Casa Tropical, também no Vietnã, é tecido por toda a casa, por meio do qual as plantas têm liberdade para escalar entre todos os pavimentos, adornando as formas cúbicas fundamentais da estrutura. Uma caminhada sinuosa entre a porta fortificada leva o usuário à sala de estar ao ar livre, através de um jardim revelador situado acima do nível da rua e protegido do exterior.
Já na proposta para a Casa Terra, de volta aos exemplos brasileiros, cria-se um espaço amplo, com muita luz natural, integrado a um atraente jardim, seguido por um confortável estar sob um pergolado. O ambiente foi projeto para servir de inspiração para um anexo de uma casa principal, um espaço de convivência e lazer para se reunir com a família e amigos, onde são recebidos por uma incrível vista do verde, remetendo ao acolhimento e tranquilidade do campo. O paisagismo assinado pelo renomado Alex Hanazaki está presente com suas criações que aliam harmonia e bom gosto incontestável.
Por fim, quando se fala em arquitetura e paisagismo, a Casa MeMo é um exemplo interessante, principalmente, por sua relação entre os jardins internos e externos e os ambientes ao seu redor. Implantada em um terreno em San Isidro, zona norte da província de Buenos Aires, Argentina, a casa surge com a premissa de uma cliente apaixonada por paisagismo com forte convicção sobre sustentabilidade e cuidado com o meio ambiente em realizar um projeto em um terreno entre empenas reduzindo ao máximo a perda de espaços verdes na construção da moradia. Diante desse requerimento, propõem-se a construção da arquitetura e do paisagismo de forma simultânea. Os metros quadrados da projeção da edificação se tornam jardins em três dimensões, vinculando através do mesmo todos os pavimentos. Cria-se um jogo topográfico por meio de um sistema de rampas verdes que conectam o nível zero como primeiro pavimento e a cobertura, gerando um contínuo terraço jardim.