Em um mundo ideal, arquitetos teriam total liberdade para projetar tudo aquilo que fossem capaz de imaginar. Mas na realidade, não é bem assim que as coisas funcionam. Fato é que desenhar em uma folha em branco nem sempre significa ter todas as possibilidades do mundo à nossa disposição, a arquitetura, como uma profissão regulamentada, é regida por uma série de códigos e leis, quando não pelos desejos dos clientes, por limites orçamentários ou outros fatores ainda mais complexos. Em se tratando de códigos de obras, muitas vezes eles “engessam” a arquitetura, forjando novas tipologias, programas e formas—da famosa “torre-plataforma” ao onipresente “dois mais cinco”. O resultado disso, muitas vezes, culmina em edifícios repetitivos e uma estética urbana monótona e sem graça.
O surgimento da tipologia base-torre não foi o único momento em que os códigos de construção exerceram uma influencia decisiva no mundo da arquitetura. Códigos de obras e zoneamentos urbanos motivaram transformações históricas em cidades do mundo todo—da arquitetura escalonada nos edifícios Art Déco da cidade de Nova Iorque, passando pelos telhados com mansarda na cidade de Paris e a obrigação histórica de simular fachadas históricas ou até, mais recentemente, a arquitetura de arranha-céus extremamente altos e esbeltos.
Então, quais são os motivos por trás destas decisões e limitações? Pelo menos no que se refere aos Estados Unidos, o código de obras de uma cidade geralmente é uma adaptação do Código Internacional de Construção, ou IBC, um sistema de regras e medidas que busca sempre uma maior eficiência da construção e consequentemente, da arquitetura—ou seja, custos mais baixos e lucros mais altos. Foi assim que se popularizou o conceito de “pódium” na arquitetura, especialmente em edifícios corporativos, onde os usos comerciais ou estacionamentos encontravam-se isolados—porém conectados—da torre em um volume autônomo de um ou dois pavimentos. No caso do modelo “dois mais cinco”, uma laje técnica divide as duas partes da torre, o embasamento—de uso comercial ou estacionamentos—e os demais dos pavimentos, neste caso cinco, de uso residencial. De acordo com as regras definidas pelo IBC, edifícios deste tipo podem ser facilmente construídos em um par de meses, algo que os fazem extremamente atrativos aos investidores—e não necessariamente aos moradores.
Além da evidente influência das limitações impostas pelo Código IBC no padrão das estruturas construídas na maioria das cidades pequenas e de médio porte nos Estados Unidos, o zoneamento é um outro fator determinante na maneira como ocupamos o território e consequentemente, nas formas que assumem os nossos edifícios. Como uma consequência da escassez de terrenos disponíveis em áreas densamente urbanizadas e a pressão imposta pela indústria mercantilista da construção civil, as cidades americanas têm historicamente avançado em direção aos subúrbios, espalhando edifícios unifamiliares em um padrão de ocupação do território bastante rarefeito e pouco denso, ao mesmo tempo que verticalizam cada vez mais seus bairros mais centrais. Em uma situação hipotética, arquitetos e planejadores poderiam trabalhar juntos, buscando sempre melhores soluções, mais eficientes em termos econômicos e de infra-estrutura púbica porém, que também sejam adequadas do ponto de vista humano. Entretanto, na maioria dos casos, o que se percebe é uma tendência de privilegiar soluções que no passado se provaram apropriadas para um determinado contexto—o que no fim passa a ser uma mera reprodução manifesta das mesmas formas construídas e uma repetição categórica dos antigos problemas que elas provocam.
Obviamente, a arquitetura não é apenas o resultado de um dado escrito ou de uma fórmula matemática. A arquitetura é o desafio de promover a diversidade dentro da unidade. Não cabe aos arquitetos transformar os códigos e as regras que lhes são impostas, mas sim transgredi-las, encontrar novas formas de se projetar edifícios tão singulares quanto eficientes, e ao contrário do que muitos acreditam, isso significa menos foco em “reinventar a roda” e mais esforço em “apertar os parafusos”.
Traduzido por Vinicius Libardoni.