Desde uso da teoria linguística como metodologia de análise arquitetônica à compreensão do edifício enquanto meio de comunicação, os cruzamentos entre o campo da linguagem e da arquitetura são mais estreitos do que, a princípio, podem aparentar ser.
O entendimento do edifício como meio de comunicação pode se dar, dentre outras formas, por meio do uso de pinturas, gravuras e esculturas e ornamentações de forma integrada à arquitetura, mas também pela incorporação literal de letras e símbolos como elementos arquitetônicos.
As discussões em torno do simbólico na arquitetura se alargaram a partir da publicação, em 1972, de Learning from Las Vegas (Aprendendo com Las Vegas) por Robert Venturi, Denise Scott Brown e Steven Izenour. A partir das análises do livro, sobretudo no que diz respeito à comunicação por meio dos billboards e da arquitetura comercial norte-americana de forma geral, foram lançadas novas questões para o debate pós-moderno que continuam a reverberar na produção arquitetônica atual.
Nesse sentido, a publicação e seu estudo do método (e não conteúdo, como frisam os autores) adotado por essa arquitetura comercial, avalia a retomada de uma tradição abandonada em parte pelos arquitetos modernos: a integração da iconografia nos projetos arquitetônicos.
Ao analisar a placa do Motel Monticello (Las Vegas), visível a partir da estrada antes mesmo ser ser possível ver o edifício, Venturi, Scott Brown e Izenour observam que a comunicação domina o espaço como um elemento não apenas na arquitetura, mas também na paisagem. O entendimento do signo enquanto parte constituinte da paisagem também poderia ser observado no projeto de MMX architecten e Jord den Hollander para cinco dormitórios na cobertura do Botel, um barco-hotel em Amsterdã.
O desafio de melhorar o aspecto do hotel levando em conta a criatividade e dinâmica da doca em que está estacionado foi o que direcionou a proposta, que incorpora as cinco unidades com 6,5 metros de altura na forma das letras de “Botel”, como uma referência às chaminés laranjas dos navios que costumavam frequentar a região.
Do mesmo modo, poderia-se dizer que as expressões adotadas pelos escritórios MVRDV e N-V-O Architekten nas fachadas do WERK12, também representam um marco na paisagem em que o edifício se insere, tanto durante o dia, como à noite. O graffiti e o uso amplo de sinalização no local, aliás, foram algumas das inspirações para a adoção de uma comunicação textual na arquitetura. A partir de uma parceria com os artistas locais Christian Engelmann e Beate Engl, foram instaladas letras em negrito de 5 metros de altura com expressões retiradas de revistas em quadrinho.
Mas nem sempre a comunicação textual em projetos de arquitetura pretende ser legível a grandes distâncias ou ser um marco na paisagem. Mais próximos à escala do pedestre, os projetos para o Museu ICA Miami, de Aranguren&Gallegos Arquitectos, e para o The Hive Apartment, do ITN Architects, localizam os elementos de comunicação textual justamente nas suas bases, ao nível da rua. O primeiro, um edifício de uso público, aproveita para criar uma faixa horizontal que demarca o acesso com as letras do ICA MIAMI, “grandes e profundas, como as colunas que sustentam o edifício”.
No segundo, a palavra “HIVE” (colméia) é incorporada como um graffiti em relevo que se projeta para o exterior, mas também interfere nos espaços internos. O que os arquitetos chamam de “tensões inerentes" criadas a partir da construção do edifício e apropriação da linguagem do graffiti são dissolvidas ao longo do tempo à medida que o respeito pela obra “se espalha dentro da comunidade do graffiti e os residentes locais começam a reclamar a propriedade da sua nova arte de rua”.
Ainda na escala do pedestre, mas dessa vez adentrando no espaço interno do edifício, o projeto para o Alcázar de San Juan Tourist Office, do escritório PKMN Architectures, toma partido da extrusão das letras que compõem a frase "T-U-R-I-S-M-O A-L-C-Á-Z-A-R" para delimitar as estações de trabalho internamente enquanto permanece como uma sinalização externa, substituindo imagens-símbolo mais recorrentes em pontos de turismo locais.
Enquanto alguns projetos exploram a tridimensionalidade da comunicação textual, outros tomam proveito da bidimensionalidade desses símbolos, como é o caso do Templo de Ágape, instalação temporária projetada por Morag Myerscough e Luke Morgan. O Templo deveria ser, segundo a equipe responsável pelo projeto, “um lugar de alegria e de ruído, bem como de contemplação silenciosa”, o que direcionou a incorporação de centenas de palavras em placas coloridas na estrutura de andaime.
Há ainda aqueles projetos que exploram as possibilidades da incorporação de signos na arquitetura de forma a extrapolar a comunicação textual. No projeto concebido por por Abin Design Studio para a Escola Newtown, por exemplo, o uso de representações gráficas de símbolos, letras e números na fachada tem uma dupla função: criar uma identidade própria para o edifício, distinguindo-o do seu entorno, e sombrear as salas de aula. Além disso, os arquitetos apontam que a partir da incorporação destes signos, as crianças mais jovens começam a criar uma relação com aqueles mais simples e, à medida que crescem, começam a reconhecer aqueles mais complexos.
A partir da análise de um recorte da produção arquitetônica dos últimos anos, o uso de letreiros e demais modos de incorporar os signos na arquitetura mostram-se possíveis em usos irrestritos à arquitetura comercial, à qual costumam ser automaticamente associados.
Além disso, a incorporação dos signos enquanto elementos arquitetônicos de forma a criar uma identidade própria para o edifício, proteger a edificação da incidência solar direta ou até mesmo abrigar espaços habitáveis pode expandir a comunicação transmitida pela arquitetura para além da mensagem que os vocábulos adotados veiculam.
As citações no texto foram retiradas dos memoriais enviados pelos autores de cada projeto.
Referência bibliográfica
VENTURI, Robert; SCOTT BROWN, Denise; IZENOUR, Steven. Learning from Las Vegas: the forgotten symbolism of architectural form. 2. ed. Cambridge; Londres: MIT Press, 1977.