A experiência do usuário facilmente pode se contrapor aos ideais de um projeto, principalmente quando espaços devem ser pensados para comunidades. Sendo assim, recorrer a uma arquitetura na qual os futuros usuários possuem poder de decisão representa um movimento no qual distintos pontos de vistas podem se aliar ao olhar do arquiteto para gerar um partido inovador.
Quando um edifício é o resultado da soma de conhecimentos individuais, ele se torna uma obra mais eficiente e de soluções que se fundem melhor com o contexto no qual está inserida. Trabalhar com comunidade, além disso, é uma oportunidade de troca entre saberes técnicos e vernaculares, uma chance de gerar oportunidades e novos caminhos para aqueles que participam de sua construção e passam a viver o projeto construído desde o primeiro esboço.
A construção física de um edifício ou um espaço público é uma desculpa. O que de fato queremos é criar cidadãos. A comunidade não somente é protagonista porque constrói o edifício com os brigadistas, os jovens mal vistos ou os que não tinham possibilidade de resgatar-se, (mas porque) vinculam-se em processos construtivos e arquitetônicos. Começam a debater, a pensar como visualizar estes espaços, a escala e a cor. Se inicia uma dinâmica que é fundamental: entender que são responsáveis pela mudança da sua própria realidade.
Diversas são as lições sobre ganhar confiança da comunidade no desenho participativo, mas o arquiteto venezuelano José Naza Rodríguez, do escritório PGRC, resume muito bem nesta fala como uma arquitetura com participação coletiva pode demonstrar a possibilidade de transformação do cotidiano das pessoas envolvidas - além de agregar lições fundamentais para a carreira de profissionais da arquitetura. Por esse motivo, reunimos dez projetos ao redor do mundo que apresentam edifícios que foram construídos tendo como principais colaboradores seus futuros usuários.
Baseada em conceitos de acupuntura urbana e autogestão, a Nave Multiprograma - uma iniciativa de desenvolvimento urbano participativo inserida no contexto de uma série de intervenções autogeridas nos espaços públicos da capital venezuelana - é um dispositivo urbano que opera como um elo entre os principais sistemas de mobilidade urbana do bairro, um edifício capaz de criar novas relações com o espaço público através de suas distintas plataformas verticais.
No Zimbábue, a comunidade de permacultura PORET segue a filosofia de uma sustentabilidade holística desde 1996. Ao abordar seus conhecimentos e técnicas, foi construído o jardim de infância PORET, um projeto piloto que mistura as técnicas de artesanato e sabedorias construtivas locais.
No Centro de Capacitação Indígena Käpäcläjui, na Costa Rica, a visão do projeto surgiu a partir de uma série de oficinas de projeto participativo e posterior validação das propostas. Tais atividades foram fundamentais para promover um sentimento de apropriação na comunidade na hora de visualizar e tomar decisões. Foi a oportunidade de entender e co-criar espaços coerentes com o entorno e centrados nas necessidades do usuário.
No Brasil, a comunidade quilombola - presente há mais de três séculos em Camburi - também participou e influenciou o projeto de seu centro comunitário através das técnicas ancestrais, trazidas por africanos escravizados, que utiliza árvores, galhos e bambu para realizar a obra.
No Equador, para a base do desenho do Centro Comunitário Renascer de Chamanga foram desenvolvidas oficinas comunitárias para entender e priorizar as necessidades das pessoas. Elas trouxeram um entendimento dos recursos locais e mão-de-obra existente. Uma etapa vital para que a comunidade pratique as aprendizagens e complemente seu espaço comunitário em momentos posteriores.
Em Fiji, o projeto do Centro Comunitário da Vila de Naidi é o resultado de um processo colaborativo desenvolvido ao longo de seis meses, o qual contou com a participação da comunidade local em todas as etapas. Grande parte do detalhamento foi sendo realizado simultaneamente à construção do edifício, enquanto todos os trabalhadores estrangeiros estiveram morando e compartilhando seu conhecimento com toda a comunidade de Naidi.
Essa mistura entre profissionais estrangeiros e da própria comunidade aconteceu também na escola Bang Nong Saeng, na Tailândia. Aqui, através de técnicas locais, foi possível redefinir as necessidades educativas e recreativas a partir dos requisitos espaciais, tornando o projeto socialmente gratificante.
O conjunto de casas da Habitação Social Pinotepa Nacional, no México, é um exemplo claro de arquitetura participativa e comunitária, onde os moradores foram entrevistados com o intuito de representarem sua casa ideal em um desenho, coletando diferentes pontos de vista sobre seu estilo de vida e tradições. A partir do exposto, foi definido o ponto de partida do projeto, onde cada casa responde às necessidades de cada família, o clima de sua região e a topografia do terreno.
Por fim, destacamos duas Unidades de Vida Articulada (UVA), a Sol de Oriente e El Paraíso, realizadas na Colômbia. Tratam-se de transformações urbanas nos bairros destinadas ao encontro entre cidadãos, ao fomento ao esporte, à recreação, à cultura e à participação comunitária.
Este artigo é parte do Tópico do ArchDaily: Arquitetura Multidisciplinar. Mensalmente, exploramos um tema específico através de artigos, entrevistas, notícias e projetos. Saiba mais sobre os tópicos mensais. Como sempre, o ArchDaily está aberto a contribuições de nossos leitores; se você quiser enviar um artigo ou projeto, entre em contato.