O conceito de sustentabilidade aplicado à cidade está a em vias de se tornar obsoleto. Nós usamos este termo para quase tudo o que queremos fazer, e assim dar-lhe um ar aparente de respeito pelo que chamamos de natureza, mas, o impacto real é alcançado quando transcendemos esta ideia e aproveitamos todas as oportunidades de intervenção urbana para implementar iniciativas de re-naturalização e, portanto, dotar a cidade de atributos que a levem a ser mais resiliente.
O homem frequentemente transforma o território, principalmente como resultado da atividade construtiva do habitat. Estas intervenções acumuladas e, consequentemente, a frequente reorganização das relações ecológicas que estabelecemos, nos afastam ainda mais do objetivo da "sustentabilidade". Se fizermos uma varredura histórica dos territórios que nossas cidades ocupam hoje, poderemos ver que, além das mudanças físicas evidentes na paisagem, as relações dos seres que as habitam são bem diferentes daquelas que tínhamos há anos atrás. Não se trata de manter uma visão romântica do passado, mas de compreender e assumir esse passado como parte do ecossistema que modificamos, e frente a isso, tomarmos medidas para permitir sua regeneração.
Os efeitos cada vez mais evidentes das mudanças climáticas nos meios urbanos e as mudanças na consciência coletiva nos últimos anos, desencadearam importantes avanços na preocupação com a conservação da natureza e do espaço que habitamos. As cidades começaram a apontar seus discursos para "cidades mais verdes", e pelo menos o conceito de "verde na cidade" começou a ser entendido como um elemento chave em algumas operações urbanas. Em algumas cidades espanholas, por exemplo, nos últimos anos o conceito de renaturalização começou a ganhar força: os projetos do anel verde em Victoria Gasteiz ou a margem do rio Manzanares em Madri são alguns exemplos bem conhecidos.
Mais recentemente, nos meses de confinamento devido à pandemia de Covid-19, o fechamento dos parques nos deixou algumas conclusões interessantes. A primeira: a natureza começou a crescer de forma silvestre e a recuperar de forma "selvagem" seu espaço em lugares que os cidadãos deixaram de frequentar.
A segunda: alguns indicadores de biodiversidade dispararam, em Barcelona, para citar um exemplo, de acordo com fontes do governo local as borboletas em alguns espaços verdes da cidade como Monjuïc se multiplicaram. Assim, a chave pode estar na resposta às perguntas: que tipo de vegetação urbana ou infra-estrutura verde vamos implementar na cidade? Que tipo de ações devemos tomar para obter um impacto real?
O verdadeiro impacto positivo virá quando a "infraestrutura verde" for colocada no centro das intervenções urbanas, não como parques ou redes de espaços verdes de gramado e árvores, concebidos de um ponto de vista puramente estético, mas enquanto intervenções urbanas que se tornem "peças de reajuste, restauração e regeneração de ecossistemas". Transcender o conceito de sustentabilidade implica em: tirar proveito da memória, repensar as relações ecológicas e formular ações que permitam re-naturalizar a cidade e, assim, dotar os espaços urbanos de atributos voltados para a resiliência.
Citymakers está trabalhando com ArchDaily para publicar uma série de artigos, conversas e entrevistas com diferentes agentes do Citymakers Barcelona Lab 2021, um programa que terá nova edição entre 8 e 12 de novembro. Aqui, Víctor Torres, diretor e co-fundador da CityMakers, apresentou seu artigo "Re-naturalizar la Ciudad".
Sobre o autor
Victor Torres é Arquiteto e mestre em Planejamento Territorial e Gestão Ambiental pela Universidade de Barcelona. É diretor e co-fundador da CityMakers, e especialista em processos de renaturalização urbana, desenvolvimento territorial e co-produção de cidades. Tem atuado como consultor de governos locais sobre questões de desenvolvimento urbano, além de trabalhar enquanto diretor e professor associado por mais de 10 anos na Escola de Arquitetura da Universidade Pontifícia Bolivariana na Colômbia, assim como professor convidado e professor em diferentes universidades na Espanha, Itália, Argentina, Chile e Uruguai.
