A estratégia de elevar as casas do solo ganhou popularidade na década de 1920 quando Le Corbusier anunciou as estruturas sobre pilotis como um dos cinco pontos da arquitetura moderna. Uma grande contribuição, principalmente na questão urbana, pois possibilita a criação de um espaço livre com maior conexão entre âmbito público da rua e o privado da edificação. A sua icônica Villa Savoye é um exemplo paradigmático do emprego de pilotis que preserva o terreno natural e, como o próprio Le Corbusier afirma, assenta a casa sobre a grama como um objeto, sem molestar nada. Além disso, os pilotis também serviram como estratégia para o fluxo de veículos, o que pode ser visto na – igualmente emblemática – Casa de Vidro da Lina Bo Bardi e seus esbeltos tubos de aço. Dispostos em uma modulação de quatro módulos de largura por cinco de profundidade, eles mantêm a casa como uma caixa transparente flutuante em meio a natureza respeitando o terreno e auxiliando no conforto térmico da edificação ao permitir a circulação de ar.
Com o tempo e o consequente avanço da tecnologia foram exploradas também diferentes formatos e arrojos estruturais nos pilotis surgindo formas inclinadas, assimétricas, arredondadas e com disposição variada. Nesse caso, seria impossível não citar a Villa dall'Ava do escritório liderado por Rem Koolhas, OMA, com seus pilares delgados de aço pintados em tons de preto e cinza que apoiam o maior dos dois volumes, dominando a fachada da rua. Com essa estratégia, além de liberar o terreno e respeitar a sua inclinação natural, foi possível elevar a casa de modo que os espaços de estar e a piscina na cobertura tenham vistas para o skyline de Paris.
Nos exemplos acima mencionados, a edificação é elevada consideravelmente do solo, possibilitando a criação de um andar inteiro tendo como principais vantagens liberar as plantas, amenizar a transição entre o natural, diminuir o impacto no terreno e trazer leveza à composição formal. Em termos de projeto, as possibilidades são inúmeras, como pode ser visto nesse artigo, no qual apresentamos uma seleção de projetos residenciais brasileiros construídos sobre pilotis.
Entretanto, nem sempre é possível ou necessário criar um nível inteiro para se beneficiar de algumas vantagens de se elevar a obra, visto que, afastá-la apenas alguns centímetros do solo já seria suficiente. Um exemplo histórico dessa estratégia projetual é a Casa Farnsworth de Mies van der Rohe com seus pilares metálicos tocando suavemente o solo e causando um efeito estético muito interessante, porém, vale ressaltar que a sua função primordial era proteger a casa das inundações, visto que, o terreno onde ela foi construída está às margens de um rio.
Hoje em dia, mais de sete décadas após o projeto da Farnsworth, a estratégia de elevação do solo pode ser vista em diferentes contextos e definida por diversos motivos. Quando se trata de terrenos irregulares, por exemplo, a decisão de elevar a casa é pautada pela redução da necessidade da movimentação de terra o que, por sua vez, diminui tempo de obra e gastos financeiros, protegendo também o meio ambiente, já que, a área de drenagem é inalterada. Além disso, alguns terrenos localizados em regiões de difícil acesso, como matas e costas selvagens, exigirão grande esforço caso seja necessário deslocar maquinário pesado. Nesse contexto, a Residência Jatobás é um exemplo interessante pois trabalha inclinação do terreno elevando uma das extremidades da casa, assim como a Residência GN e seus pilares encabeçados por mãos francesas que recebem as cargas pontuais distribuindo-as em apenas quatro “árvores”.
Em um clima quente e úmido como no Brasil, eleva-se as casas do solo, mesmo que em uma altura pequena, pois dessa forma é possível proteger a edificação da umidade advinda do solo e permitir que o ar circule sob a laje, auxiliando no desempenho térmico da edificação, como pode ser visto na Casa Redux do Studio MK27 + Samanta Cafardo e sua laje elevada 50 cm do solo.
A elevação das casas também pode ter como motivo a prevenção da entrada de pequenos insetos, principalmente quando se trata de implantações em entornos naturais, como o caso da Casa Vila Rica do Bloco Arquitetos. Além disso, geralmente, a impermeabilização das vigas de baldrame nas casas térreas é uma etapa que costuma requerer um alto investimento, contudo, quando se eleva a obra do solo essa etapa pode ser diminuída ou até mesmo eliminada impactando no orçamento global da construção.
Outra vantagem que pode ser analisada ao se decidir elevar a edificação do solo é a relação com a instalação e manutenção das tubulações hidráulicas e elétricas pois, nesses casos, elas podem ficar expostas sob a laje do piso facilitando o acesso. A Casa Pipa do Bernardes Arquitetura é um exemplo interessante, já que, segundo os próprios arquitetos a casa foi elevada do solo pois essa estratégia "garante estanqueidade e ventilação para a laje de piso, assim como visitação às instalações que passam pelo piso".
Em suma, elevar a casa do solo oferece inúmeras vantagens, mas essa decisão está sempre atrelada ao estudo detalhado das condições do terreno, do entorno natural ou urbano, do clima no qual a edificação está inserida, além das preferencias estéticas do arquiteto e cliente e do orçamento disponível.
Para mais exemplos de projetos residenciais elevados do solo confira esse artigo com 11 casas brasileiras elevadas do solo que abordam diferentes materiais, implantações e composições formais.
Publicado originalmente em 20 de janeiro de 2022, atualizado em 6 de dezembro de 2022.