“Não sou arquiteto”, diz com brilho nos olhos, “sou apenas uma pessoa em busca de seu destino”. Para o falecido pioneiro do modernismo indiano, Balkrishna Vithaldas Doshi, a arquitetura é uma prática de autodescoberta. As obras brilhantes de funcionalidade poética do veterano resultaram de uma filosofia humanista com influência dos princípios modernistas, de Mahatma Gandhi e textos espirituais indianos. Doshi acreditava que arquitetura era sinônimo de vida — um veículo para celebração constante; um meio para experiências intensificadas. Sua maior contribuição para a comunidade arquitetônica foram suas poderosas palavras que ecoam a atemporalidade de suas estruturas.
B.V. Doshi teve uma carreira ilustre, tendo concluído mais de 100 projetos abrangendo programas de planejamento urbano, centros culturais, campi institucionais, residências e habitação social. Sua jornada profissional começou como pupilo de Le Corbusier, que estabeleceu as bases de Doshi em espaço, forma, luz e ventilação. O arquiteto indiano logo ganhou uma compreensão da fragilidade e efemeridade da arquitetura trabalhando com Louis Khan no Indian Institute of Management, Ahmedabad.
As obras notáveis de Doshi, como Aranya Low-Cost Housing, Amdavad ni Gufa, Institute of Indology e seu próprio estúdio Sangath, renderam-lhe elogios como o Prêmio Aga Khan de Arquitetura, a Medalha de Ouro RIBA e o prestigioso Prêmio Pritzker. Juntamente com suas maravilhas construídas, a filosofia de Doshi em relação ao projeto conquistou os corações de arquitetos e entusiastas em todo o mundo.
Com um legado de sete décadas, o trabalho de Doshi foi significativamente moldado por sua criação em uma casa compartilhada com várias gerações da sua família que o expôs ao “fluxo constante da vida”. Doshi começou sua carreira em um momento crucial da história da Índia. Em meio ao contexto em rápida mudança de um país recém-independente, ele ampliou suas experiências inestimáveis com Le Corbusier e Louis Kahn em uma linguagem de projeto sensível para a condição indiana.
A natureza comunal e ritualística do estilo de vida indiano levou Doshi a concluir que a arquitetura é um organismo vivo, e não uma forma construída. A cultura de projeto “esquerdista” de Corbusier fala através das contribuições de Doshi para a construção da nação, refletindo as esperanças e necessidades das realidades indianas compartilhadas. Um profundo respeito pela história e tradições foi visto em seu trabalho, abrindo caminho para a evolução da arquitetura indiana contemporânea.
Na prancheta, nasce uma visão de vida. As ideias formam imagens rabiscadas e as imagens se misturam para formar narrativas. Logo surgem paredes, portas, escadas e aberturas que contam uma história maior do que a soma de suas partes. O processo de projeto de Doshi é guiado pela imaginação para momentos fáceis e agradáveis. Seus edifícios protegiam com muito tato ações e interações.
Sua obra mais celebrada - Aranya Low-Cost Housing em Indore - foi construída como um projeto modelo que atualmente abriga mais de 80.000 pessoas. As residências para a classe economicamente mais vulnerável foram estruturadas sobre um sistema modular que permitiu que o edifício crescesse e se adaptasse às necessidades futuras. Doshi acreditava fortemente no projeto para a aspiração e na arquitetura a qual “permitia que as pessoas se tornassem o que elas têm potencial para ser”. Cada projeto era uma oportunidade de trazer alegria para a vida cotidiana, criado em torno de sua observação cuidadosa da condição humana.
A inspiração para o Indian Institute of Management, Bangalore (IIMB) emana dos grandes pátios, escalas lúdicas e caminhos labirínticos dos templos de Madurai. O projeto articula claramente um contraste entre arquitetura e qualidades espaciais que influenciam as emoções. As formas construídas de Doshi eram recipientes para ações, memórias e forças naturais como luz, vento e silêncio que interagiam com os habitantes. Refletindo a ideologia indiana da dualidade, sua arquitetura era um casamento entre constância e mudança; entre o mensurável e o imensurável; entre a forma e o amorfo.
A arquitetura de Doshi é um equilíbrio entre formas modernas e tradicionais. Profundamente enraizado nas sensibilidades do contexto indiano, ele lutou para que seus edifícios fossem instrumentos críticos para celebrar a vida. “A arquitetura é uma manifestação da vida e do mundo que acontece por meio de nossas ações como se fosse um pano de fundo”, compartilha em The Promise, curta-metragem sobre sua obra. Sua prática se concentra na sustentabilidade social, cultural, econômica e ambiental, com uma arquitetura que permanece significativa para a comunidade.
Na segunda metade de sua carreira, e na fase dos projetos institucionais, Doshi projetou e fundou a CEPT University, uma escola de arquitetura e disciplinas afins. Nascida das suas crenças e identidade, a CEPT foi um espaço de diálogos colaborativos e de aprendizagem multidisciplinar. A forma construída imitou o espírito de abertura como um campus sem portas e limites. Hoje, a universidade está entre os institutos de design de maior prestígio da Índia e do mundo.
Um educador benevolente, a contribuição mais impactante de Doshi são os aprendizados que ele deixou para alunos e profissionais. Com seu corpo de trabalho, sua universidade, uma autobiografia e inúmeras oportunidades para interações face a face, Doshi nunca deixou de inspirar a próxima geração de arquitetos com seus pensamentos. Ele era admirado por sua curiosidade infantil e vontade constante de aprender. Buscar o desconhecido era seu lema.
B.V. Doshi faleceu em 24 de janeiro de 2023. Levando uma vida de celebração, seu trabalho mantém a energia da esperança que ele carregou com ousadia. Doshi acreditava que a arquitetura é fluida, do passado ao futuro. Assim, suas filosofias viverão ao longo da história, moldando incessantemente a arquitetura.