A simples atividade de dar uma caminhada à noite pode facilmente se transformar de um passatempo relaxante em uma empreitada perigosa se retirarmos apenas um elemento da paisagem urbana: a iluminação pública. Embora nem sempre reconhecida como um aspecto fundamental dos ambientes urbanos, a iluminação artificial tem desempenhado um papel essencial nas cidades modernas. O controle do crime, o apelo da vida noturna, o surgimento da vitrine, movimentos revolucionários, utopias e ideais de equidade social são todos conceitos cujo desenvolvimento está estreitamente ligado à história da iluminação pública. Avanços tecnológicos ao longo dos últimos séculos vem moldando a aparência e o simbolismo dos postes de luz. Ainda assim, esse elemento permaneceu ao longo da história.
Iluminação privada para espaços públicos
A maioria das civilizações compreende a noite como um reino de mistério, sonhos, ocultismo, algo escondido. Durante a Europa medieval, as cidades se preparavam para a chegada da noite como se preparavam para uma batalha ou uma tempestade no mar: os portões da cidade eram trancados e todos os moradores deviam se recolher em suas casas. Decretos de toda cidade, como o de 1380 em Paris, estipulavam que todas as casas deveriam ser trancadas à noite e suas chaves entregues ao magistrado para garantir segurança extra. Enquanto isso, a vigília noturna, armada com tochas e armas, patrulhava as ruas. Regras similares estiveram em vigor em Berlim e Viena até o século 19, de acordo com Wolfgang Schivelbusch.
No século 15 vieram as primeiras tentativas de instalar iluminação pública em grande escala na Europa. Um decreto em Londres exigia que os habitantes pendurassem lanternas do lado de fora de suas casas como meio de identificação. Da mesma forma, no século 16, os moradores de Paris eram obrigados a pendurar lanternas sob as janelas que davam para as ruas, como extensão de uma lei mais antiga que obrigava todos os pedestres a carregar tochas para se tornarem visíveis. Este conceito inverte o papel normal das janelas, usando-as para trazer a luz da casa para a rua.
Mesmo que a ideia fosse nova, a tecnologia de iluminação baseada em tochas e velas usada na época não era. As civilizações grega e romana documentam o uso de lâmpadas à base de velas desde a antiguidade. Além disso, pesquisadores descobriram registros chineses de 1700 anos atrás, indicando o uso de gás vulcânico natural transportado por tubos de bambu para iluminar e aquecer casas particulares.
Iluminação controlada pela polícia
Durante o final do século XVII em Paris, lanternas presas a cabos estendidos pelas ruas gradualmente substituíram as lâmpadas fixadas nas paredes de casas privadas. O estado absolutista francês implementou essa versão mais pública de iluminação, encarregando a polícia local de cuidar das luzes públicas. Vista como uma medida de controle, a polícia utilizava 15% de seu orçamento na iluminação pública. Isso foi apenas parte de um novo conjunto de regulamentações urbanas destinadas à higienização do ambiente urbano. Outras leis ordenavam a remoção de grandes e intrusivas placas medievais de lojas e a instalação de pavimentação uniforme. No final do século XVII, outras grandes cidades europeias seguiram o exemplo.
As pessoas se submeteram a isso porque prometia garantir estabilidade e segurança. Mas, embora a iluminação pública tenha sido bem recebida por prometer segurança, ela também foi uma instituição policial e, como tal, atraiu toda a hostilidade tradicionalmente direcionada à polícia. - Wolfgang Schivelbusch no livro Noite Desencantada: A Industrialização da Luz no Século XIX, página 97
O novo sistema de iluminação, possibilitado pela inovação das caixas de vidro, encontrou certa oposição. A quebra de lanternas tornou-se uma atividade popular, apesar das severas punições ditadas pela lei. O início da Revolução Francesa intensificou esses atos de vandalismo em Paris. Escritores como Victor Hugo descrevem áreas da cidade completamente ocultas na escuridão como lugares seguros para revolucionários. Em uma escalada do conflito em 1789, dois representantes do antigo regime foram capturados e enforcados em uma lanterna em forma de forca fixada na frente do Hotel de Ville, mais uma vez mudando o simbolismo associado aos postes de luz das ruas.
Iluminação a gás e vida noturna
A Grã-Bretanha foi pioneira na iluminação a gás, sendo que o Mall em Londres se tornou a primeira área urbana a ser iluminada por gás em 1807. A inovação, resultado da Revolução Industrial, foi primeiramente utilizada em fábricas para prolongar as horas de trabalho e aumentar a eficiência. Uma vez adotada nas ruas, o novo sistema de iluminação, mais intenso em comparação com as lâmpadas anteriores, encorajou o desenvolvimento de uma economia noturna. De acordo com Wolfgang Schivelbusch, a cultura barroca da noite deu origem à vida noturna atual.
A elite aproveitou a nova tecnologia para estender as atividades sociais pela noite como um símbolo de posição social: quanto mais tarde se começava o dia, mais alta a posição. A luz pública também cedeu lugar à luz comercial. As vitrines ficaram maiores e as salas de venda se transformaram lentamente em salas de recepção. As luzes de gás, ainda requerendo uma chama aberta, foram colocadas do lado de fora das lojas em Londres, com refletores instalados para jogar uma forte luz sobre as mercadorias em exposição. Antes da introdução da luz elétrica, a luz de gás era um símbolo de progresso humano e industrial.
Ainda assim, em comparação com o nível de iluminação ao qual estamos acostumados hoje, as luzes de gás forneciam uma pequena quantidade de luz, fato comprovado pela continua utilização de portadores de tochas, chamados de linkmen, em Londres e Paris até o início do século XIX. As pessoas que caminhavam pelas ruas durante a noite podiam contratar um linkman para ajudar a iluminar o caminho para casa. Como uma perversão desse costume, em Nova York, leis do século XVIII exigiam que pessoas negras, mestiças e indígenas carregassem lanternas consigo à noite, caso caminhassem desacompanhadas de uma pessoa branca.
Nesse período, as luzes também não eram utilizadas durante toda a noite. Assim como nos sistemas de iluminação a óleo, a iluminação a gás seguia de perto os ritmos naturais. Durante os meses de verão, poucas horas da noite, se é que alguma, se beneficiavam da iluminação artificial nas ruas. Os horários de iluminação, utilizados até o final do século XIX, levavam em consideração a época do ano e as fases da lua para determinar a quantidade necessária de luz artificial em determinadas áreas.
Das luzes da rua às luzes da cidade
O século XIX trouxe a revolução das luzes elétricas para as ruas das principais cidades da Europa. Os primeiros experimentos com essa tecnologia para iluminação pública ocorreram após 1850. Jornais da época relataram a grande diferença entre o novo sistema e as velhas lâmpadas de gás, anteriormente saudadas por transformar a noite em dia: "A luz das lâmpadas de gás parecia vermelha e suja, enquanto a luz elétrica era deslumbrantemente branca". Entre as décadas de 1870 e 1880, diversas capitais europeias instalaram lâmpadas de arco, o primeiro tipo de luz elétrica prático, ao longo de algumas das principais ruas comerciais. A tecnologia permaneceria em uso até o início do século XX, quando foi gradualmente substituída por luzes incandescentes. O alto custo das luzes elétricas significava que apenas algumas ruas significativas se beneficiavam dessa inovação, com ruas adjacentes ainda usando luzes de gás, o que enfatizava ainda mais a diferença entre os dois sistemas.
Além do custo, as lâmpadas de arco foram criticadas por deslumbrarem pedestres, criando mais luz do que a rua poderia absorver. Portanto, substituir as antigas luminárias de rua pelas lâmpadas de arco não era uma opção. Suspender as luzes fora dos campos de visão padrão significava que os novos postes mais altos precisavam ser instalados. O brilho dessa nova tecnologia deu origem a novas ideias utópicas: e se toda a cidade pudesse ser iluminada, sem mais ruas mal iluminadas, apenas algumas luzes da cidade acima do tecido urbano, iluminando tudo uniformemente? Ideias de torres de luz são documentadas no início dos anos 1800 na França, mas o conceito encontrou uma audiência mais receptiva nos Estados Unidos.
Muitas cidades americanas, especialmente no meio-oeste, instalaram torres ou mastros de 50 a 150 metros (cerca de 150 a 450 pés), dos quais luzes de arco poderosas inundaram toda a cidade. Pouco depois, Detroit se tornou a única grande cidade do mundo toda iluminada pelo sistema de torres. Instaladas a cada 350 a 400 metros no centro da cidade, ou 1000 metros na periferia, essas torres criavam cinturões de luz cobrindo distritos inteiros, uma "utopia de igualdade". Apenas trinta anos após a sua instalação, o sistema de iluminação de torres de Detroit foi substituído por "luzes de rua" regulares, conforme descrito por um comentarista, que disse que as torres eram "mais espetaculares do que eficientes".
A iluminação como instrumento de placemaking
Nas cidades contemporâneas, a iluminação pública ainda desempenha um papel crucial na definição e descrição dos ambientes urbanos, refletindo nossas ideias de segurança, vigilância, codificação estética urbana e igualdade social. As luzes fornecem uma sensação de segurança, tornando as ruas mais convidativas à noite e contribuem para a criação de identidade dos espaços urbanos. As luzes também podem revelar práticas discriminatórias, com comunidades desfavorecidas tendo acesso restrito a recursos de iluminação adequados ou sendo expostas a iluminação que impõe vigilância e ordem pública.
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