O horizonte de Cluj-Napoca, cidade localizada na região da Transilvânia na Romênia, é definido por um mosaico de prédios históricos e modernos, dando à cidade uma aparência única e diversa. Entre os principais marcos visíveis, destaca-se a Torre dos Bombeiros, ou "Turnul Pompierilor" em romeno, por sua mistura de estilos, desde trabalhos medievais feitos em pedra até detalhes barrocos e intervenções contemporâneas. Mesmo sendo um monumento relativamente pequeno, com uma área no térreo de pouco menos de 50 metros quadrados, a torre contém camadas de história que narram a evolução de seu bairro e da cidade, desde seus primórdios durante a Idade Média até os dias atuais. Abandonada nos últimos anos, uma nova intervenção de Vlad Sebastian Rusu e Octav Silviu Olănescu tem como objetivo restaurar a posição da torre como um marco da história local e um espaço atraente para moradores e visitantes. Este artigo explora a história por trás da Torre dos Bombeiros, tanto narrativa quanto visualmente, através da lente de Cosmin Dragomir.
O desenvolvimento da torre é simultâneo ao de seu bairro. Foi construída no final do século XV como parte do segundo cercamento de fortificação em torno da nova expansão da cidade. A estrutura, sob a governança do guilda de tecelões, era um dos menores pontos de acesso exclusivos para pedestres na cidade. A área ao redor era conhecida como "Szappanyváros", ou a cidade dos fabricantes de sabão, um distrito relativamente subdesenvolvido definido pela produção de sabonetes à base de banha e outras artes nocivas. Num bairro empobrecido, a torre representa o único monumento herdado dos tempos medievais na área.
Registros históricos mostram que, em 1585, a torre também era usada para monitorar incêndios, função que teve por 430 anos e a salvou da demolição. Grandes incêndios, como os de 1655 e 1697, foram alertados a partir dessa torre, já que guardas estavam permanentemente vigiando. Em 1789, a cidade passou por um dos incêndios mais devastadores do século, que destruiu grande parte da estrutura medieval e levou a iniciativas de renovação urbana em grande escala.
À medida que a cidade começou a se modernizar, a necessidade de fortificações defensivas diminuiu. Durante os primeiros anos da década de 1870, a cidade começou a desmontar suas paredes de cercamento. O conselho da cidade considerou demolir a torre, mas decidiu contra a demolição, já que a estrutura poderia servir como posto de comando para a organização voluntária de bombeiros recém-estabelecida. Essa escolha de estabelecer uma torre de vigia anti-incêndio se alinha com uma tendência maior presente em cidades europeias do século XIX. Apenas alguns anos depois, em 1876, outro incêndio consumiu a própria estrutura destinada a proteger contra ele, causando danos graves. Em resposta, a torre foi restaurada, com dois andares adicionais, com um deck aberto no topo e um sistema de alarme de sino. A nova adição, ainda visível hoje, apresenta um modesto detalhamento barroco que cria uma imagem distinta em comparação com a estrutura medieval.
A Torre dos Bombeiros foi reconhecida como Patrimônio Histórico Nacional em 1957. Após essa classificação, foram iniciadas obras de restauração com o objetivo de transformar a estrutura em um museu dedicado aos bombeiros. Nos anos 1960, uma monumental escadaria de concreto armado foi adicionada, preenchendo o espaço interior da torre. Pelos padrões atuais de restauração patrimonial, essa intervenção é agressiva e difícil de reverter. De forma mais positiva, outras obras se concentraram em restaurar os elementos medievais originais do edifício. Em 1985, uma pirâmide de vidro projetada pelo arquiteto Gheorghe Vais foi adicionada, substituindo o deck aberto e o sistema de alarme de incêndio. A pirâmide foi criada para abrigar um observatório astronômico, mas tanto este quanto o museu não conseguiram atrair visitantes, levando a torre a fechar suas portas em 2001.
Em uma ação para revitalizar a torre e introduzi-la no circuito turístico da cidade, a Prefeitura de Cluj-Napoca organizou um concurso internacional em 2017, em parceria com a Ordem dos Arquitetos da Romênia. Apesar de ser uma prática incomum na área nessa época, o concurso foi um sucesso, com 25 projetos da Romênia e do exterior apresentados. Para a administração local, isso levou a uma maior abertura para concursos arquitetônicos como procedimento oficial, garanrtindo a qualidade dos investimentos públicos em edifícios ou espaços públicos. A proposta vencedora foi apresentada pelos escritórios de Vlad Sebastian Rusu e Octav Silviu Olănescu, com uma equipe composta pelos arquitetos Vlad Sebastian Rusu, Andra Vlădoiu, Anda Gheorghe, Octav Silviu Olănescu, Anamaria Olănescu e Petrică Maier Drăgan, além de consultores de outras áreas.
A proposta transforma a torre em um observatório urbano, continuando assim sua longa tradição de observar a cidade. A intervenção é entendida como a "terceira idade da torre", visando reativá-la e destacar seu papel em constante evolução na vida da comunidade. Em março de 2023, após seis anos de reforma, a torre recebeu seus primeiros visitantes em décadas. A extensa reabilitação substituiu os elementos intrusivos de concreto dos anos 1960, 1970 e 1980 por intervenções sutis e reversíveis em conformidade com os princípios contemporâneos de restauração patrimonial.
Além da cuidadosa restauração das paredes medievais e barrocas, a proposta de design introduz um núcleo translúcido separado da estrutura original. Isso facilita a acessibilidade do marco, pois um elevador recém-introduzido chega a todos os andares, exceto ao deck de observação mais alto. As escadas envoltas em torno dele revelam a história progressiva da torre por meio de áreas de descanso cuidadosamente planejadas que destacam várias características arquitetônicas, juntamente com dioramas espaciais e instalações de realidade aumentada. Como a maioria desses novos elementos é renderizada em acabamento metálico, a materialidade da intervenção enfatiza ainda mais a identidade distintiva da "terceira idade da torre".
O mirante representa uma das mais atraentes características do monumento reabilitado. Aqui, um modelo em escala da cidade permite aos visitantes contrastar e comparar com o panorama de 360 graus. Um teto espelhado expande ainda mais as camadas de percepção. Além disso, uma seção da muralha de fortificação original do século XV, conectada à torre, foi restaurada e a passagem da muralha ficou acessível. A torre será um espaço de encontro para a comunidade local e visitantes, além de cenário para eventos e pequenas instalações culturais e artísticas.
Apesar de ser considerado um monumento menor por seus padrões, a história contínua da Turnul Pompierilor contém várias narrativas entrelaçadas com o desenvolvimento da cidade. Recentemente aberto ao público, o local atraiu cerca de 2000 visitantes em seus primeiros dias: moradores locais e turistas ansiosos por descobrir sua história. A estrutura representa mais do que os estilos históricos sobrepostos que retrata. Oferece uma nova chance para a comunidade local se reacostumar com sua própria história, além de compreender e apreciar melhor as lutas, conquistas e tradições culturais daqueles que vieram antes.
Esse artigo é parte de uma série do ArchDaily intitulada AD narratives, onde compartilhamos a história por trás de um projeto selecionado, mergulhando em suas particularidades. A cada mês, exploramos novas construções de todo o mundo, destacando suas histórias e como elas aconteceram. Nós também conversamos com arquitetos, construtores e com a comunidade que busca ressaltar sua experiência pessoal. Como sempre, no ArchDaily, nós apreciamos muito as sugestões de nossos leitores. Se você acha que deveríamos apresentar algum projeto, por favor, mande sua sugestão.