Ao longo da história, reformadores religiosos e arquitetos-estrelas visionários tentaram imaginar o futuro de nossas cidades: da cidade modelo veneziana de Palmanova ao complexo habitacional de vários andares para 5.000 pessoas desenhado pelo arquiteto italiano Paolo Soleri, da Broadacre City de Frank Lloyd Wright a Ville Radieuse de LeCorbusier, vários planos foram elaborados para ilustrar algumas das ambições sem precedentes.
Até hoje, as pessoas nunca pararam de investigar novas abordagens para o planejamento urbano que podem permitir uma transição suave para uma futura economia verde. Em 2018, os governos holandeses e instituições de conhecimento iniciaram o estudo da “2050 City of the Future”, com o objetivo de pesquisar como as cidades do futuro deveriam reagir a grandes desafios, como mudanças climáticas, perda de biodiversidade, esgotamento de recursos naturais e poluição. Durante esse tempo de colaboração, a VenhoevenCS, a empresa de arquitetura líder da equipe, conduziu uma pesquisa conceitual substancial compartilhando muita experiência em planejamento sustentável.
Este artigo analisará vários estudos de caso que foram realizados pela VenhoevenCS e os comparará com as visões delineadas por Le Corbusier na Ville Radieuse. Vamos revisitar os problemas do passado e ver se os resolvemos em ambientes contemporâneos. Enquanto isso, também discutiremos se os princípios de desenho de Le Corbusier ainda são aplicáveis ou não, já que chegamos ao futuro que ele uma vez imaginou.
1. URBANISMO SUSTENTÁVEL
Quando Le Corbusier publicou pela primeira vez seu plano urbano não realizado Ville Radieuse (The Radiant City) em 1933, ele imaginou que a futura cidade conteria arranha-céus pré-fabricados e idênticos de alta densidade, espalhados por uma vasta área verde e dispostos em uma grade cartesiana, permitindo que a cidade funcionasse como uma "máquina de viver". Le Corbusier propôs a ideia de jardins nas coberturas para recuperar o espaço verde iluminado pelo sol perdido sob os arranha-céus. Além disso, Le Corbusier sugeriu a construção de rodovias elevadas 5 metros para destinar todo o nível do solo aos pedestres.
É verdade que, por meio de simetria radical e extrema organização e padronização mecânica, Le Corbusier forneceu uma perspectiva pioneira sobre tipologias habitacionais de alta densidade e meios de transporte eficientes. No entanto, o arquiteto parecia negligenciar o fato de que, quando uma cidade fosse projetada como uma “máquina de viver”, e ocupada por automóveis, surgiria uma série de questões ambientais como a emissão de gases de efeito estufa e o aquecimento global.
No projeto de pesquisa da VenhoevenCS, Olympic Aquatics Centre Paris 2024, os arquitetos adotam uma abordagem totalmente nova e mais sustentável para resolver os problemas ambientais. Por exemplo, é proposto um sistema de reciclagem de águas pluviais e subterrâneas, possibilitado por superfícies reduzidas de pavimentos e ruas. Toda a água da chuva será coletada e infiltrada diretamente no solo para elevar o nível do lençol freático.
Os arquitetos e designers também sugerem aumentar a cobertura verde nas cidades para absorver CO2, criar espaços para a infiltração da água da chuva e reduzir o efeito de ilha de calor. As plantas e árvores melhoram a biodiversidade e os telhados e fachadas verdes ajudarão a criar ambientes mais saudáveis.
2. ZONEAMENTO
Na visão de Le Corbusier de cidades futuras, um distrito comercial seria colocado no centro, para conectar zonas residenciais e comerciais separadas por meio de trânsito subterrâneo. Torres de habitação pré-fabricadas serviriam como vilas verticais com suas próprias lavanderias, bem como jardins de infância e playgrounds no último andar. Os apartamentos padronizados teriam acesso a espaços públicos compartilhados. Os residentes desfrutariam da paz longe dos distritos industriais.
Embora tenha sido concebida como uma cidade utópica, as ideias de Le Corbusier têm atraído críticas por sua falta de espaços públicos e um desprezo geral pela habitabilidade. Os complexos de apartamentos do tipo Unité nas periferias urbanas estão agora sujeitos a altos níveis de pobreza e criminalidade.
A VenhoevenCS, em seu novo planejamento para a cidade de Wenzhou Ouhai South, leva em consideração os efeitos do zoneamento no ecossistema e na agricultura comunitária. Ecossistemas autossustentáveis nas cidades e no campo são promovidos para que, no campo, as pessoas possam se concentrar na regeneração de áreas úmidas e reflorestamento com árvores nativas. Enquanto isso, o zoneamento de uso misto substituirá o monofuncional para melhorar a proximidade e transformar a economia linear em uma economia circular e de base biológica. Os arquitetos também introduzem a agricultura interna em arranha-céus, como estratégia para levar o cultivo até cidades e bairros.
3. ESCALA DE TRANSPORTE
Na Ville Radieuse, Le Corbusier abraçou a ideia da supremacia do carro, sugerindo que cada quarteirão deve ser conectado por carros. Corbusier não viu necessidade de ter estabelecimentos de beira de estrada e / ou feiras no futuro. Ele queria demolir todos os mercados de agricultores em prol de criar uma vida extremamente limpa e organizada.
No entanto, sua ideia pode não ser mais aplicável no mundo de hoje, uma vez que os carros não são o único meio de mobilidade em nosso sistema de transporte, e nossos edifícios são feitos de múltiplas funções que exigem maior transparência e acesso público. A conectividade entre os bairros vizinhos e a facilidade de caminhar até as instalações públicas estão se tornando os principais critérios de projeto para a sociedade contemporânea.
No projeto Het Platform da VenhoevenCS, os arquitetos sugerem usar a proximidade entre morar, trabalhar e se divertir como o princípio para reduzir o tráfego urbano e criar bairros pedonais e cicláveis, sem carros. Centros e estações de mobilidade multimodal são desenvolvidos para conectar bairros com outras partes da metrópole. Os arquitetos também procuram combinar pólos de mobilidade com pólos logísticos e centros de economia circular e se propõem a transformá-los em centros urbanos atraentes.
Além disso, é aconselhável que apenas estradas principais estejam preparadas para veículos elétricos autônomos.
4. VIDA NO BAIRRO
Le Corbusier alertou que cada unidade residencial deveria ser equipada com vários serviços públicos diretamente relacionados à vida familiar: centros comunitários, creches, jardins de infância, locais de atividades ao ar livre no parque e escolas primárias. Na visão de Le Corbusier, também haveria um centro de serviços públicos no edifício residencial, que adotaria um modelo de negócio coletivo para as necessidades diárias de uma maneira unificada.
Curiosamente, a vida coletiva que Le Corbusier acreditava está acontecendo agora em todo o mundo, à medida que as pessoas estão começando a aceitar a vivência colaborativa como uma tendência de vida futura sob a crescente escassez de moradias. Os restaurantes, lojas e cabeleireiros que ele uma vez imaginou como instalações essenciais estão proporcionando atividades diárias meticulosas para os residentes da comunidade.
No Park More Project de VenhoevenCS, os arquitetos desenvolveram ainda mais a ideia de Le Corbusier de melhorar a vida comunitária, através do desenvolvimento de bairros socialmente inclusivos e sem carros como vilas urbanas. As distâncias a pé estão sendo tratadas como um índice de projeto significativo para garantir que os residentes vivam a uma distância razoável de todas as atividades diárias para reduzir o tráfego urbano. Os arquitetos pretendem tornar os bairros do futuro autossuficientes na produção de sua própria energia verde, captação de água da chuva, cultivo de alimentos e reciclagem de produtos e recursos, tudo baseado nos princípios de uma economia circular sustentável.
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